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Lei Geral de Proteção de Dados precisa entrar em vigor em agosto de 2020

Proposta de prorrogação do prazo para início da vigência da LGPD por mais um ano é temerária e pode colocar direitos dos consumidores em situação de ainda maior vulnerabilidade; uso de dados sem embasamento legal para combate ao Covid-19 traz mais riscos do que potenciais benefícios

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Atualizado: 

14/04/2020
Ilustração: Eduardo Nunes
Ilustração: Eduardo Nunes

 

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A proposta de adiamento, por mais um ano, para a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), inserida no art. 25 do Projeto de Lei 1.179/2020, é temerária e tende a produzir um cenário de ainda maior instabilidade. Não há justificativas razoáveis para tal prorrogação. Pelo contrário, a crise revela que a manutenção da lacuna legislativa tende a produzir efeitos indesejáveis para o consumidor e para toda a sociedade brasileira.

Antes mesmo da disseminação da Covid-19, já era notório que o atraso na implantação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) poderia produzir grandes prejuízos a consumidores, empresas e poder público, criando um cenário de insegurança jurídica em um contexto de rápida evolução dos serviços e aplicações digitais. Nesse cenário, era grande a expectativa da criação da ANPD e da entrada plena em vigor da LGPD, prevista para agosto de 2020.

Com a disseminação do novo coronavírus, é natural que surjam novas aplicações de internet e soluções tecnológicas com potencial de contribuir com o combate ao vírus. É legítima e potencialmente positiva a aplicação de alguns destes recursos em benefício de toda a sociedade. É importante destacar que a LGPD não proíbe nem dificulta o uso de dados pessoais para o combate ao vírus, prevendo a possibilidade de tratamento para a proteção à vida e a defesa nacional. A legislação apenas impõe que sejam adotadas medidas de segurança e de avaliação de risco, como a anonimização dos dados e a realização de exames de proporcionalidade das medidas adotadas.

A ausência de um ecossistema legal completo de proteção de dados pode criar um ambiente de radicalização das violações aos direitos fundamentais e dos consumidores, com forte  impacto na privacidade e na proteção de dados pessoais. Muitas destas aplicações que objetivam apoiar o combate à Covid-19, caso não observem critérios e princípios básicos, tendem a ser altamente invasivas, além de possuírem grande potencial discriminatório.

O aumento de compras no comércio eletrônico, bem como a utilização dos meios digitais para uso profissional e escolar, inclusive por conta da pandemia, demonstram que é imensa a gama de empresas e de órgãos do poder público com amplo acesso a dados diversos dos consumidores, incluindo dados sensíveis. A utilização desses dados, até mesmo para combate à pandemia, deve seguir parâmetros legais, como tem ocorrido em outros países. A coleta e tratamento de informações como as de geolocalização, por exemplo, devem ocorrer de forma equilibrada e em respeito aos princípios da finalidade e necessidade, sendo a LGPD o marco normativo capaz justamente de promover esse balanceamento entre direitos individuais e interesse social geral. Some-se ainda o fato de que o novo Cadastro Positivo já está em execução, ainda sem uma lei geral que garanta a proteção dos dados dos consumidores. Ou seja, a LGPD se faz ainda mais necessária no atual contexto.

Nota-se, nas discussões em curso, a criação de uma falsa polêmica em relação às dificuldades para adequação de empresas, custos para compliance e, especialmente, temor de sanções desproporcionais. A polêmica não se justifica, uma vez que a LGPD prevê a aplicação de sanções moduladas (que se iniciam apenas com advertência), bem como procedimentos de adequação especiais direcionados às micro e pequenas empresas, incluindo startups. Ou seja, as sanções econômicas não serão aplicadas imediatamente, e as mais severas somente em caso de reincidência. Ainda, embora o prejuízo da inexistência da Autoridade Nacional de Proteção de Dados seja evidente, seu pleno funcionamento não é condicionante para a entrada em vigor da LGPD, tanto porque os direitos dispostos na lei podem também ser exercidos no Judiciário e perante os organismos de defesa do consumidor, quanto porque tal lacuna poderá ser superada nos próximos meses, com a efetiva criação da ANPD.

Por tudo isso, é necessária a existência plena de legislação forte para proteger os direitos dos consumidores sobre seus dados e sua privacidade, e equilibrá-los com os interesses sociais gerais, como é o caso do combate à Covid-19. A postergação do prazo para a entrada em vigor da LGPD expõe ainda mais os consumidores nesse momento de crise e, assim, deve ser evitada, em benefício de toda a sociedade.

Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor

São Paulo, 2 de abril de 2020.

 

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