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Em função da disseminação da Covid-19 no Brasil e do risco iminente de crescimento exponencial do número de pessoas acometidas pela doença; e o consequente agravamento da crise econômica - cujo impacto será mais grave entre os consumidores mais pobres e vulneráveis - o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) solicita às grandes empresas e às autoridades nacionais medidas urgentes para impedir que parte substancial da população seja privada do acesso e fruição de serviços essenciais, indispensáveis para a garantia da dignidade humana.
Dentre as medidas mais importantes para garantir condições mínimas de vida para a toda a população neste difícil período está a compreensão de que as empresas concessionárias e autorizatárias destes serviços não devem desligá-los ou suspendê-los no período mais agudo da crise. Entre esses serviços essenciais estão o fornecimento de água, energia elétrica, gás, transportes e o acesso às telecomunicações, incluindo, neste último caso, os serviços de acesso à internet e à telefonia fixa e móvel.
O cenário atual no Brasil e em outros países mostra que o agravamento da crise terá impactos profundos na economia e que as restrições impostas podem fazer com que a demanda por tais serviços seja aumentada. Muitos micro e pequenos negócios terão suas atividades interrompidas, incluindo milhões de brasileiras e brasileiros que atualmente estão no mercado de trabalho informal. É de se esperar, assim, um cenário de enormes dificuldades econômicas, já que muitos consumidores não terão condições de arcar com contas de consumo continuado, como é o caso dos serviços públicos essenciais.
Assim sendo, e considerando a gravidade do momento, o Estado brasileiro deve tomar medidas para garantir que estes serviços não sejam, em qualquer hipótese, suspensos, inclusive por eventual inadimplência ou atraso no pagamento de contas - nos casos de serviços de gás, telecomunicações, energia e água - até o final efetivo da crise.
As concessionárias e agências reguladoras também precisam reforçar, de forma urgente, todas as medidas preventivas para evitar qualquer espécie de suspensão dos serviços, por falhas de manutenção nas redes de distribuição ou por qualquer outra situação. O momento exige foco exclusivamente nas necessidades dos consumidores.
Cumpre lembrar que a distribuição de água e esgoto é serviço público dos mais essenciais, considerando que o consumidor faz amplo uso da água para higiene pessoal e dos domicílios, para cozinhar e para consumo direto. Logo, o fornecimento desse serviço em hipótese alguma pode ser interrompido, já que pode contribuir ainda mais para a disseminação do vírus e, consequentemente, causar mais dificuldades à população brasileira.
O fornecimento de energia elétrica também é fundamental para inúmeras atividades, como a conservação de alimentos, higiene pessoal, segurança dentro das residências, aquecimento e refrigeração dos ambientes, além da utilização de equipamentos eletrônicos de lazer doméstico e comunicação, necessários para que os consumidores atravessem o período de crise com o mínimo de dignidade e tenham condições, inclusive, de manter atividades profissionais à distância. Ressalta-se ainda aqueles consumidores que utilizam equipamentos elétricos indispensáveis à vida, que podem ter a situação agravada nesse momento. Sem energia elétrica a situação dos consumidores tende a se tornar dramática em um cenário de grande contingência cuja orientação geral é de recolhimento domiciliar.
Os serviços de gás encanado e gás de botijão também são essenciais, sobretudo diante das recomendações de recolhimento domiciliar, trabalho remoto e suspensão das aulas. Desta forma, sua interrupção impacta diretamente na vida e saúde dos consumidores, pois haverá maiores chances de contaminação àqueles que não se alimentarem adequadamente e que, ainda, tiverem a possibilidade reduzida de realizar sua higiene pessoal e higiene dos domicílios, em especial, os consumidores dos grupos de risco.
Já as telecomunicações atestam, nesta crise, seu caráter indispensável para a comunicação humana, de forma muito mais aguda do que em momentos históricos anteriores, tanto sob a perspectiva individual quanto para a comunicação coletiva, incluído o exercício de inúmeros direitos fundamentais, como o direito à informação. Nesse contexto de crise extrema, está claro hoje que as possibilidades de efetivo trabalho à distância dependem de conexões à telefonia e à internet continuadas, o que também é necessário para que a economia do país não seja, nesse período, totalmente paralisada. Assim, além da não suspensão dos serviços por eventual falta de pagamento, também é importante, no caso específico do acesso à internet por meio de conexões móveis, que a conexão do consumidor não seja totalmente bloqueada após o consumo da franquia de dados contratados, mas tenham, nestes casos, somente velocidade de conexão reduzida a padrões que ainda permitam o uso mínimo da internet.
Por fim, nos transportes, em que pese a necessidade de evitar formas potenciais de contágio, é preocupante a restrição do deslocamento pela redução da oferta dos serviços. A medida não é eficiente, pois o transporte é uma atividade meio e há pessoas que ainda precisam deslocar para o trabalho ou mesmo às unidades de saúde. Uma redução drástica na oferta de transporte público só pode ser feita se houver uma redução drástica na demanda, do contrário a aglomeração de pessoas no transporte pode aumentar o risco de transmissão do vírus. Mesmo no caso de uma eventual necessidade de quarentena por conta de aumentos de doentes, deve-se prever a oferta de transportes suficientes para garantir que trabalhadores, principalmente os da área de saúde e de outros setores essenciais, possam de deslocar. Alertamos ainda para os cuidados e ponderações necessários em fechamentos de fronteiras repentinos e cortes de gratuidades. É importante adotar medidas para a extensão dos prazos de créditos da bilhetagem eletrônica (onde eles existem), fornecimento de equipamentos de higiene para motoristas e cobradores, bem como a limpeza constante dos veículos. Por fim, também é possível pensar em alternativas de deslocamento individual, como outras cidades no mundo fizeram com ciclovias temporárias.
Em suma, a não suspensão dos serviços essenciais é imprescindível para garantir que todos os cidadãos tenham condições de atravessar o período com segurança e dignidade.
O momento é grave e exige respostas objetivas. É isso que os consumidores e consumidoras esperam das empresas e do governo.
Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor
São Paulo, 18 de março 2020.