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Idec e parceiros promovem debate sobre sistemas alimentares para o G20 de 2024

Em webinar, especialistas falam sobre a monotonia dos sistemas alimentares e potenciais estratégias para superá-la

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Atualizado: 

17/06/2024

No último dia 12 de junho, o Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), a Cátedra Josué de Castro de Sistemas Alimentares, o Instituto Comida do Amanhã, a Embrapa, o Núcleo de Pesquisa e Análises sobre Meio Ambiente, Desenvolvimento e Sustentabilidade (CEBRAP Sustentabilidade), o INCT - Combate à fome e o Instituto Fome Zero, foram anfitriões de um debate sobre a monotonia imposta pelo sistema alimentar e possíveis soluções para o tema. A discussão ocorrida no evento servirá como subsídio para as recomendações brasileiras nas reuniões do G20 de 2024.  

O evento promovido pelo Idec e parceiros foi dividido em dois painéis: a centralidade dos sistemas alimentares e a monotonia imposta por esses sistemas alimentares e as possibilidades de rompê-lo. Ambas as etapas contaram com a participação de especialistas da nutrição, de economia, de agrossistemas e sustentabilidade. O webinar teve apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS) e da Global Alliance for the Future of Food.

A participação dos debates prévios ao G20 ocorre por meio do Civil 20 (C20), que é um grupo de engajamento que busca assegurar que os líderes mundiais se atentem às demandas da sociedade civil organizada.  

Por que a monotonia dos sistemas alimentares é ruim?

As duas forças-tarefa criadas pela presidência brasileira no G20 de 2024 foram: a Mobilização contra as Mudanças Climáticas e a Aliança contra a Fome e a Pobreza. Entende-se que os dois temas trazem a necessidade de uma profunda revisão do atual modelo de sistemas alimentares, caracterizados pela dependência de combustíveis fósseis (como fertilizantes e pesticidas derivados de combustíveis fósseis), uma produção focada em commodities (soja e trigo, por exemplo), produtos alimentícios ultraprocessados e pecuária intensiva, resultando em poluição ambiental, perda da biodiversidade e problemas sociais e de saúde.

Durante o webinar, a professora doutora do departamento de nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSPUSP), Ana Paula Bortoletto, abordou os impactos das dietas com participação crescente dos ultraprocessados para a saúde humana, um fruto dos atuais sistemas alimentares. De acordo com ela, o padrão de consumo de ultraprocessados traz perda da identidade alimentar e seus impactos negativos na saúde são evidenciados não por artigos isolados, mas por pesquisas robustas, que incluem ensaios clínicos randomizados e a revisão de inúmeros estudos.

“Os ultraprocessados têm como característica a perda da matriz alimentar e a sinergia de seus componentes, por serem desenvolvidos sob intenso processo tecnológico. Sua composição é formada majoritariamente por substância industriais, como proteínas hidrolisadas, proteínas de soro, aditivos alimentares e excesso de açúcar, gordura saturada e sódio - substâncias que viciam e estão diretamente ligadas ao desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis e câncer”, afirma a professora doutora.

Uma pesquisa encomendada pelo Idec e pela ACT - Promoção da Saúde, em 2023, mostrou que regras estaduais empurram ultraprocessados, como salsichas, margarinas e preparações de sucos em pó  para a cesta básica no Brasil, por meio de incentivos tributários estaduais.

Ainda no contexto dos impactos negativos da monotonia imposta pelos sistemas agroalimentares, a professora do Instituto Federal de Ciências, Educação e Tecnologia Catarinense (IFC) e doutora em Agrossistemas, Rita Albernaz, falou sobre o bem-estar animal, o uso de antibióticos e a saúde humana. 

Segundo ela, a monotonia nutricional criada pela agropecuária baseada principalmente em milho e farelo de soja, a homogeneidade na criação dos animais, a predominância racial (relacionadas à produtividade), os processos metabólicos necessários para que os animais produzam o que a indústria quer, custam sua saúde e, principalmente, sua imunidade. Assim, os antibióticos entram em ação e, com eles, a resistência antimicrobiana, tema que também preocupa o Idec.

Além disso, a criação confinada dos animais é outra problemática, segundo Rita. “A criação concentrada gera uma quantidade de dejetos muito grande, aumentando a quantidade de água utilizada nos espaços. Esse ambiente de estresse faz com que a agropecuária seja movida por medicamentos, prejudicando a saúde humana e o meio ambiente também”, alerta a professora do IFC. 

Potenciais estratégias para superar a monotonia dos sistemas alimentares

“A discussão política, hoje, é que oferecer calorias e proteínas não é suficiente para enfrentar a insegurança alimentar. E os produtos agroecológicos não podem ser apenas um nicho mercadológico, mas uma garantia para a população”, é o que afirmam Rita e Ricardo Abramovay, professor titular da Cátedra Josué de Castro da FSPUSP.

Para Namukolo Covic, pesquisadora da Etiópia para agricultura em nutrição e saúde, a monocultura predominante não é boa para a diversificação das dietas e nem para o solo. É necessário priorizar a biodiversidade, que é muito importante para conseguir lidar com as mudanças climáticas. No continente africano, a soja, o milho e o feijão são os pilares, mas é preciso ir além e utilizar da vasta diversidade alimentar do continente que, até então, está sendo ignorada. 

“Agora, lidamos com uma monotonia de monocultura, e podemos falar dos ganhos desse tipo de cultivo, claro, mas é possível e necessário integrar os tipos de cultura em nossa jornada”, afirma a pesquisadora.

No Brasil, de acordo com André Moreira, do Departamento de Inovação para a Agricultura Familiar e Transição Agroecológica no Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), o foco está na produção agroecológica e orgânica, manejada pela agricultura familiar, por meio de Programas Governamentais e no reconhecimento de que 70% da biodiversidade está nas localidades dos povos originários. 

Para Joachim Von Braun, professor ilustre de Mudança Econômica e Tecnológica do Centro de Pesquisa para o Desenvolvimento, da Universidade de Bonn, na Alemanha, são 3 os processos importantes para acabar com a fome e construir uma economia circular: alimentação saudável, que precisa ser acessível e de boa qualidade; sistemas de produção sustentáveis, os campos e a agricultura precisam superar a monotonia; e a preservação da biodiversidade também nas áreas de proteção.

Por fim, conclui-se que a monotonia dos sistemas alimentares se apoia em poderes políticos e econômicos, e em mecanismos que beneficiam certas atividades e prejudicam outras. “Tem que se apoiar na evidência de que 2 empresas dominam mais de 90% da genética de aves. 4 empresas dominam o comércio de grãos e tem imenso poder sobre as políticas públicas de crédito, de seguro e de instalação, que acabam por favorecer essa monotonia”, alerta Ricardo Abramovay.

Uma pesquisa de 2023, realizada pelo Idec com parceiros, mostrou que a política tributária do Brasil é altamente benéfica à cadeia produtiva da soja. A renúncia fiscal estimada para produção dessa commodity foi de R$57 bilhões em 2022, o dobro da desoneração prevista para os produtos da cesta básica.

É importante também citar os custos ocultos. O último relatório do Banco Mundial estimou em 3 trilhões de dólares anuais esse tipo de custo, valor muito superior ao valor da alimentação. “Isso significa que, se esses custos fossem incorporados ao sistema de preços, todo o sistema alimentar passaria por uma transformação. Não adianta fazer inovação se os custos do uso dos serviços ecossistêmicos ligados à inovação não tiverem aumentado”, conclui Ricardo.

Para assistir ao webinar completo, acesse: g20-overcomingfoodsystemsmonotony.colab208.com.br/assistir

 

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