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Consumidor não deve pagar toda a conta da pandemia no setor elétrico

Idec enviou contribuições à Consulta Pública da Aneel sobre a Resolução que regulamenta o Decreto 10.350/2020, com medidas para socorrer financeiramente o setor elétrico.

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Atualizado: 

17/03/2021

No dia 2 de junho o Idec enviou contribuições à Consulta Pública da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) sobre a Resolução Normativa que regulamenta o Decreto 10.350/2020, com medidas para socorrer financeiramente o setor elétrico dos impactos da pandemia da COVID-19. Mais uma o Instituto ressaltou que o consumidor não pode ser visto como a solução de todos os problemas do setor, pois é a parcela que mais tem sofrido com essa e outras crises.

As contribuições enfatizram a necessidade de transparências sobre todos os dados relacionados à Conta Covid que atinjam o bolso da população. Isso deve estar explícito, de forma didática, na conta de luz e sites das distribuidoras. Recomendou-se, ainda, que a Aneel se posicione o quanto antes sobre a questão de migração do mercado cativo paras as modalidades de micro e minigeração, para não sobrecarregar os que consumidores que permanecerem. Cobrou-se também que na resolução apareça de forma expressa quais seriam os mecanismos de compensação, cessão ou descontratação de montantes de energia elétrica.

Veja abaixo as contribuições completas:

Contribuição do Idec à Consulta Pública 035 de 2020, da ANEEL
 

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) é uma associação de consumidores, sem fins lucrativos, independente de empresas, partidos ou governos. Fundado em 1987 por um grupo de voluntários, nossa missão é orientar, conscientizar, defender a ética na relação de consumo e, sobretudo, lutar pelos direitos de consumidores-cidadãos.
 
Somos uma organização prestigiada dentro e fora do Brasil. Acumulamos lutas e conquistas importantes que só foram possíveis devido a ajuda de nossos associados e parceiros, que contribuem para autonomia de nosso trabalho.
 
O Idec possui grande capacidade de mobilização e comunicação por meio de sua revista, mídias sociais, por e-mail e telefone. O Idec possui mais de 4 milhões de acessos anuais, mais de 300 mil seguidores nas redes sociais e o boletim do Instituto é lido por mais de 200.000 pessoas.

Assim, vem o Idec apresentar contribuição no âmbito da presente Consulta Pública n. 35/2020, da ANEEL, que pretende obter subsídios para o aprimoramento da Resolução Normativa que regulamentará o Decreto nº 10.350/2020, quanto aos aspectos financeiros que o estado de calamidade pública e de emergência de saúde pública decorrente da pandemia de Covid – 19 têm causado nas concessões e permissões de distribuição de Energia Elétrica.

1. Antecedentes e limites da presente Consulta Pública
 
A Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, dispõe sobre as medidas excepcionais para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus. O Ministério de Minas e Energia, por meio da Portaria nº 117/GM, de 18 de março de 2020, instituiu o Comitê Setorial de Crise para organizar e coordenar a prestação de serviço de energia.
 
Já em 24 de março, a ANEEL através de decisão de sua diretoria, definiu entre outras coisas que o corte de energia elétrica aos consumidores residenciais será suspenso por 90 dias, incluindo casos de inadimplência, em todo o território nacional, por conta da pandemia do coronavírus. Nesta ocasião, o Idec pode fazer sua contribuição, e corroborar com a decisão da agência . Também no âmbito da agência foi criado o Gabinete de Monitoramento da Situação Elétrica (GMSE), que visa coordenar estudos de propostas para a preservação do equilíbrio nas relações entre agentes do setor.


Em 8 de abril de 2020, o Governo Federal publicou a Medida Provisória nº 950, alterando a Lei nº 12.783, de 2013, e a Lei nº 10.438, de 2012, para, dentre outras coisas, possibilitar a tomada de recursos financeiros pela CDE para enfrentamento dos impactos no setor elétrico decorrentes da pandemia de Covid-19, tendo publicado na mesma data a MP nº 949, para abrir crédito extraordinário em favor do Ministério de Minas e Energia, no valor de R$ 900.000.000,00, transferindo Recursos para a Conta de Desenvolvimento Energético.

De maneira a regulamentar a MP 950, em 18 de maio de 2020, foi editado o Decreto nº 10.350. Neste dispositivo há indicações de várias medidas que carecem de regulamentação da Aneel.
 
Dessa maneira, o Idec considera adequada e importante a abertura do processo de consulta pública para que os agentes e, principalmente, os consumidores possam contribuir com aprimoramentos.

Contudo, é necessário ponderar que ainda estão em tramitação no Congresso Nacional tanto a MP 949, quanto a MP 950, esta que recebeu o expressivo número de 180 Emendas dos Parlamentares. O prazo para votação dessas Medidas Provisórias ainda está aberto, não havendo dúvidas de que o Legislador ainda poderá modificar as disposições dessas MP’s, fato este que demandará a publicação de outro Decreto Presidencial. Assim, caso sejam modificadas as disposições legais que dão suporte ao texto regulatório que a presente consulta pública pretende regulamentar, é necessário ter a correta revisão da regulação, assim como deve-se permitir nova rodada de participação social.

Apesar dos limites impostos à atuação da ANEEL seja por meio das Medidas Provisórias, por conta de questões de limites de competência regulatória ou ainda por conta do disposto no referido Decreto regulamentador, é necessário que esta Agência Reguladora dê condições para que os consumidores consigam incidir junto às políticas públicas que estão sendo implementadas pelo Governo Federal e nas discussões perante o Congresso Nacional. Essa atuação da ANEEL é de fundamental importância para que o pagamento da Conta não fique somente no colo do consumidor brasileiro.

O Idec, em conjunto com ANACE, CBCS, ClimaInfo, Instituto Clima e Sociedade, IEI, Iema, Instituto Escolhas, Mitsidi Projetos e a WWF Brasil publicou nota pública recomendando que o setor elétrico atue com transparência, eficiência e justiça socioambiental contra a Covid-19 . As instituições ressaltam que o modo como o governo federal, o Congresso Nacional e a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) reagirão a esta crise poderá tanto sedimentar as bases para um setor elétrico resiliente e sustentável como, ao contrário, aprofundar ainda mais seus problemas estruturais.

Nesse contexto, e adotando os princípios de justiça social, eficiência energética e  inovação tecnológica, além da modicidade tarifária, diálogo e transparência elencados pela ANEEL, foram propostas as seguintes recomendações: (i) dar total transparência ao montante e às fontes de recursos a serem alocados no socorro às distribuidoras; (ii) reavaliar os subsídios e os encargos setoriais aplicados ao setor; (iii) priorizar a implementação de um palno de descomissionamento da capacidade excedente fossil; (iv) reestruturar os programas de Eficiência Energética (PEE), Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), e Procel, orientando-os em favor da recuperação socioeconômica por meio da otimização energética e produtiva; (v) dar agilidade à modernização do setor elétrico, tendo como primeiro passo o Projeto de Lei do Senado n. 232/2016; e (vi) alavancar o compromisso do setor elétrico com a economia de baixo carbono e a justiça social e ambiental.

Feitas estas considerações mais gerais acerca dos princípios que devem reger as respostas à pandemia de Covid-19, ressalta-se desde já que o princípio da modicidade tarifária deve reger a administração pública, nos termos do art. 37 c/c art. 175, da Constituição Federal, do art. 6º, §1º, da Lei das Concessões (Lei Federal n. 8.987/1995), e art. 22, do Código de Defesa do Consumidor.

2. Transparência e direito fundamental de acesso à informação do consumidor
 
Desde o princípio das discussões sobre as medidas de enfrentamento da Pandemia a serem desenvolvidas no âmbito do Sistema Elétrico, o Idec tem atuado junto aos diferentes instituições para que os reais efeitos, as informações, o processo decisório sejam comunicados de maneira transparente, acessível e de fácil acesso e interpretação aos consumidores do mercado cativo, sobretudo os consumidores residenciais . Afinal, são eles que historicamente vem arcando com os custos da crise e dos problemas estruturais do setor elétrico. Nesse contexto de Pandemia os maiores impactos econômicos e sociais decorrente da Pandemia do Covid-19 também recaem sobre eles.
 
Nesse sentido, a Aneel poderia, como primeira medida, avançar nessa resolução determinando que as distribuidoras especifiquem explicitamente na conta de luz dos consumidores os custos associados à operação financeira, Conta Covid, e que deverão ser posteriormente pagos pelos consumidores.
 
Adicionalmente, a ANEEL tem o papel de disponibilizar de modo claro e informativo os dados referentes à Conta Covid, para permitir a efetiva participação social, de modo que cada agente de distribuição disponibilize para os consumidores as informações necessárias para que a sociedade possa monitorar esses dispêndios. Até mesmo por conta do exíguo prazo para análise de toda a documentação e questões técnicas envolvidas na presente Consulta Pública, apesar dos grandes esforços desta Agência Reguladora em produzir conteúdo mais palatável ao consumidor, com vídeos, explicações e até mesmo a disponibilização de um formulário de perguntas e respostas, é necessário ampliar a transparência e informação ao consumidor antes, durante após a Conta-Covid, inclusive com uma Análise de Resultado Regulatório.

Recomenda-se que a TABELA A constante no Anexo I da referida resolução seja tornada pública em todos os sítios eletrônicos das distribuidoras. Além disso, recomenda-se que a Aneel solicite as distribuidoras que criem painéis que permitam aos consumidores acompanhar o desempenho de suas distribuidoras em relação aos níveis de faturamento e arrecadação. Tais informações permitiriam ao consumidor acompanhar os níveis de perda de arrecadação e entender a potencial elevação dos custos de energia elétrica.

Desse mesmo modo, a Aneel poderia consolidar as informações físicas enviadas por todas as distribuidoras e disponibilizá-las de maneira adequada, acessível e de fácil acesso aos consumidores.

Há sérias dúvidas sobre se dentro da Conta Covid deveriam constar os impactos sobre a inadimplência, uma vez que as distribuidoras no processo de revisão tarifária já podem recuperar essa inadimplência. Sugerimos, dessa forma, que sejam criados mecanismos de abertura dos dados e fiscalização mais próxima das perdas de arrecadação por concessionária e por classe de consumidores, a cada ciclo de faturamento.
 
Ainda nesse mesmo sentido, recomenda-se que no artigo 7o que regulamenta as responsabilidades da CCEE que se insira uma cláusula específica para que a CCEE disponibilize acesso facilitado às informações financeiras da conta, conforme a TABELA A constante do Anexo I. Tal medida permitiria a uma análise mais consolidada das solicitações de recursos e sua alocação em cada item da tabela.
 
Por fim, torna-se necessário retomar a necessidade de aprimorar a regulamentação do Decreto nº 9.022, de 31 de março de 2017, que dispõe sobre a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). É de fundamental importância que o acesso às informações dos beneficiários dos subsídios e também que os custos sejam estratificados por distribuidoras, bem como os saldos disponibilizados para que se facilite o acesso das informações. Nesse caso, a Aneel deve especificar a CCEE essas informações.

Ainda, é necessário prever sanções regulatórias no caso de as distribuidoras disponibilizarem informações incompletas ou inconsistentes, com prazos específicos para a abertura dos respectivos processos administrativos sancionadores para tanto.
 
Por fim, gostaríamos também de indicar que seria adequado a Aneel manter registro e disponibilizar as informações sobre os fundos setoriais que estão sendo utilizados para cobertura dos impactos da Pandemia.

3. Geração Distribuída – Micro e Minigeração

O Decreto 10.350 de 18 de maio de 2020, acertou ao incluir a necessidade de que os agentes que optarem pela migração para o ACL devem arcar com suas cotas, conforme parágrafo nono e décimo do artigo 3o:

§ 9º Os consumidores que deixarem o ambiente de contratação regulada e exercerem as opções previstas no § 5º do art. 26 da Lei nº 9.427, de 26 de dezembro de 1996, e nos art. 15 e art. 16 da Lei nº 9.074, de 7 de julho de 1995, permanecerão obrigados a pagar as quotas de que trata o caput, conforme regulação da Aneel.

§ 10. O disposto no § 9º se aplica às formalizações da opção por migração ocorridas a partir 8 de abril de 2020.
 
Nesse sentido, os consumidores do mercado cativo terão um ônus menor, pois os agentes deverão “carregar consigo os custos associados” e, nesse sentido, a medida também incentiva a decisão de migração para que seja respaldada em realidade econômica e menos fundamentada em artificialidade devido às distorções setoriais.
 
Entretanto, o presente decreto não adotou o mesmo critério para migração de consumidores paras as modalidades de micro e minigeração, conforme resolução Aneel 482 de 2012. Dessa maneira, reforçamos a necessidade para que a Aneel analise a questão e se posicione o quanto antes sobre a consulta pública em andamento (Nº. 025/2019). Na forma atual, o consumidor que optar por essa modalidade estaria isento do pagamento da Conta Covid-19. A decisão desta agência na matéria poderá também amenizar os efeitos futuros de elevação tarifária.
 
O Idec tem como meta incentivar o desenvolvimento da geração distribuída e de origem renovável e temos trabalhado para que esse processo beneficie o conjunto da sociedade. Nesse sentido, é fundamental que a agência se atente ao fato de que o consumidor de menor renda poderá arcar com custos significativos após a crise, devido a postergação de decisões que já poderiam ter sido efetuadas.

4. Disposições acerca da Sobrecontratação

As condições dispostas no Anexo I sobre a condições de adesão estão aderentes ao decreto. No entanto, ressalta-se que os dispositivos regulatórios ora disponíveis em nossos modelos devem ser utilizados, a saber:  Mecanismo de Compensação de Sobras e Déficits - MCSD; Mecanismo de Venda de Excedentes; e Acordos bilaterais entre signatários dos CCEARs.

Avalia-se que a Aneel deve promover esses mecanismos para que o problema da sobre-contratação seja em parte mitigado e os consumidores sejam menos sacrificados. Entretanto, deve-se também considerar a necessidade de uma comunicação clara a sociedade sobre a necessidade da continuidade de projetos estruturantes e também de novos leilões.

A Aneel poderia ter papel ativo junto ao Ministério, com objetivo de aportar equilíbrio ao mercado, discutir a possibilidade de Mecanismo de entrega de contratos por parte de geradores com alto CVU que possuam CCEARs e que tenham interesse finalizá-los ou reduzi-los sem ônus financeiros para as partes. Esse mecanismo poderia ocorrer por meio de tomada de subsídios coordenado pela ANEEL e operacionalizado pela CCEE. Ressalta-se que tal mecanismo não precisaria envolver transações financeiras.

Há referência na Subcláusula Terceira, da “Cláusula Segunda – Dos Contratos no ambiente regulado”, do Termo de Aceitação às disposições do Decreto n. (Anexo I), que possibilita a participação da Distribuidora em mecanismos instituídos pela ANEEL “para a compensação, a cessão ou a descontratação de montantes de energia elétrica, nos termos da legislação e regulação em vigência”. Entende-se que tais mecanismos são fundamentais para se reduzir o valor da Conta-Covid.

Em nossa avaliação, o Decreto 10.350 de 2020 foi benevolente com os geradores na medida em que eles não precisaram realizar esforços como os consumidores, até mesmo para garantir a modicidade tarifária.

Por isso, deve haver referência expressa na própria resolução de quais seriam esses mecanismos de compensação, cessão ou descontratação de montantes de energia elétrica, para não haver afronta ao Art. 2º, inc. II, do Decreto 10.350, de 2020, e se for o caso, menção a regulamentação posterior da ANEEL sobre eventual revisão desses mecanismos já existentes, com enfoque para lidar exclusivamente com os reflexos da pandemia no setor.

5. Conclusões e recomendações

Diante do exposto, o Idec tece as seguintes conclusões e recomendações acerca da presente consulta pública:

1. Deve ser incluída determinação para que as distribuidoras especifiquem explicitamente na conta de luz dos consumidores os custos associados à operação financeira, “Conta Covid”, que deverão ser posteriormente pagos pelos consumidores;

2. Devem ser incluídos dispositivos para ampliar a transparência e o direito fundamental de acesso à informação clara e adequada do consumidor antes, durante e após a Conta-Covid, inclusive com publicações constantes atualizadas dos dados e realização de Análise de Resultado Regulatório, além de previsão de outras de Consultas Públicas e audiências públicas, para permitir a ampla participação social;

3. Recomenda-se que a TABELA A constante no Anexo I da referida Resolução colocada em Consulta Pública seja tornada pública em todos os sítios eletrônicos das distribuidoras;

4. Recomenda-se que seja criado dispositivo na Resolução para que as distribuidoras criem painéis que permitam aos consumidores acompanhar o desempenho de sua distribuidora em relação aos níveis de faturamento e arrecadação;

5. Recomenda-se que a Aneel análise e se posicione o quanto antes sobre a questão de migração do mercado cativo paras as modalidades de micro e minigeração, principalmente para não sobrecarregar quem fica no mercado cativo, finalizando a consulta pública em andamento sobre o tema (Nº. 025/2019);

6. Recomenda-se fazer referência expressa na própria resolução de quais seriam os mecanismos de compensação, cessão ou descontratação de montantes de energia elétrica, descritos na Subcláusula Terceira, da “Cláusula Segunda – Dos Contratos no ambiente regulado”, do Termo de Aceitação às disposições do Decreto n. (Anexo I), para não haver afronta ao disposto no Art. 2º, inc. II, do Decreto 10.350, de 2020, e se for o caso, menção a regulamentação posterior da Aneel sobre eventual revisão desses mecanismos já existentes, com enfoque para lidar exclusivamente com os reflexos da pandemia no setor, permitindo-se a diminuição da Conta Covid;

Por fim, o Idec entende o papel do consumidor na recuperação da crise, no entanto ele não pode ser o único ou a panaceia de todos os problemas do setor, uma vez que somos a parcela que mais tem sofrido os impactos dessa e de todas as outras crises que passamos. Certos de sua atenção, esperamos que nossas contribuições possam ser consideradas no contexto desta Consulta Pública.