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Necessidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos planos de saúde pela ANS

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Atualizado: 

13/10/2017
Daniela Trettel

Na última semana, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula nº 469,  segundo a qual “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde”. Esta súmula consolida o entendimento já pacificado no STJ e nos demais Tribunais do país, no sentido de que a operadora de plano de saúde, que presta serviços remunerados de assistência à saúde à população tem sua atividade regida pelo Código de Defesa do Consumidor.

Com a edição desta súmula, fica mais evidente e premente a necessidade da ANS incorporar o Código de Defesa do Consumidor na regulação dos planos de saúde.

Ao analisar disposições normativas relativas à Agência observa-se um número significativo de convergências das mesmas com o conteúdo disposto no Código de Defesa do Consumidor. Tomemos, exemplificativamente, o art. 3º da lei de criação da ANS, Lei 9.961/00, que prevê como finalidade institucional da Agência promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das ações de saúde no País.

Embora existam diversas disposições na legislação de criação da ANS que remetam à necessidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor pela Agência, esta não é uma prática que tem sido observada:

Como a prestação de serviços pelos planos de saúde envolve uma relação de consumo, é imprescindível que a ANS também leve em conta, no exercício de sua atividade regulatória, os preceitos do Código de Defesa do Consumidor. A própria Lei dos Planos de Saúde e a Lei da ANS exigem a aplicação subsidiária do Código nas relações entre planos de saúde e usuários. Mas, na prática, a Agência despreza o CDC como instrumento para ser utilizado no controle dos reajustes e na fiscalização dos planos de saúde. (Idec, CREMESP, 2007, p. 11)

Pela leitura de correspondências enviadas pela ANS ao Idec, percebe-se, inclusive, que a aplicação da legislação consumerista não é consenso interno:

Lembramos que a ANS é um órgão federal que atua de acordo com a Lei 9.656/98 e regras complementares, regulando e fiscalizando as empresas que comercializam planos de saúde (as chamadas operadoras), punido-as quando infringem a legislação vigente. Em outras palavras, a ANS é um órgão criado para fiscalizar condutas das empresas que atuam no mercado vendendo planos de saúde e tem suas competências definidas e determinadas por Lei, não podendo, desta forma, fugir de suas competências.

Em outra correspondência também enviada ao Instituto, em resposta a denúncia relativa a não disponibilização de lista de rede credenciada por operadora de plano de saúde, a Agência admite afastar a aplicação do CDC nas suas tomadas de decisões:

A ANS é um órgão regulador e sua fiscalização não tem como único fim a defesa do consumidor. Este é apenas um dos elementos que levamos em consideração na análise processual. O funcionamento do mercado e o respeito às leis setoriais são outros aspectos por nós analisados e que terminam, por vezes, a afastar a própria aplicação  a Lei 8078/90 (Código de Proteção e Defesa do Consumidor).

Considerando que o Código de Defesa do Consumidor é norma de ordem pública (art. 1º), equivocada a visão de que sua aplicação é afastável.

Vale lembrar, ainda, que é dever constitucional do Estado regulamentar, fiscalizar e controlar os serviços de saúde, inclusive os prestados por pessoas jurídicas de direito privado (art. 197 da CF/88). E através da Lei nº 9.961/00 o Estado delegou o exercício dessa função em relação aos planos de saúde para a ANS. Na lei de criação da Agência não há qualquer restrição da sua atuação relacionada ao tipo de contrato ou à sua data de assinatura. 

A aplicação do Código de Defesa do Consumidor apresenta especial relevância da regulação dos contratos de planos de saúde antigos – assinados antes da edição da Lei 9.656/98, a Lei de Planos de Saúde. Assim também nos contratos coletivos – aqueles intermediados por empregadores, associações e sindicatos – no que diz respeito a casos de rescisão unilateral de contratos.

É certo que, para agir, a ANS teria que lançar mão da legislação aplicável a cada situação, valendo-se do Código de Defesa do Consumidor para os contratos antigos e da Lei dos Planos de Saúde e do CDC para aqueles firmados a partir de 1999.

Assim, a ANS deve aplicar o Código de Defesa do Consumidor como parâmetro fiscalizatório e punitivo, inclusive no que diz respeito às exclusões contratuais de cobertura neles contidas, em cumprimento à farta jurisprudência e agora à Súmula nº 469 do STJ. 

Bibliografia:
Idec; CREMESP. Planos de Saúde: nove anos após a Lei 9.656. São Paulo: Idec e Cremesp, 2007.

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