separador
Atualizado:
Quando você pensa em pratos da culinária sertaneja, o que vem em mente? Cuscuz, tapioca, baião-de-dois e carne de sol? Mas e a buchada de bode, a galinha à cabidela e o sarapatel, já ouviu falar?
O sertão brasileiro reserva um repertório amplo e criativo de pratos. São preparos culinários que aproveitam integralmente os alimentos ofertados diante das secas. Confira como essa culinária se estabeleceu e a importância dela para milhares de famílias nordestinas.
O que é o sertão brasileiro?
É uma sub-região do Nordeste que tem um clima tropical semi-árido, ou seja, quente e seco, e tem o menor índice de chuvas de todo o país. A caatinga é a vegetação própria do local, com forte presença de cactos, que são plantas com presença de espinhos para evitar a perda de água para o ambiente.
O sertão brasileiro compreende os estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe e norte de Minas Gerais. Muito mais do que uma demarcação geográfica, o sertão e as suas comidas estão associadas à cultura popular e aos meios social e natural.
É também representatividade e reconhecimento para um povo, principalmente as mulheres, que criaram e disseminaram pratos de acordo com o período de chuva ou de seca.
Quem são os sertanejos?
“O sertanejo é, antes de tudo, um forte”. Euclides da Cunha, em “Os Sertões”.
A palavra “sertanejo” atualmente tem muita ligação com a figura do cantor do estilo musical sertanejo. Mas "sertão'' deriva do termo "desertão" usada pelos portugueses, que ao penetrarem o interior do país, sentiram o clima seco e a aridez da paisagem, perceberam uma área deserta, desabitada.
O sertanejo é o fruto de um grupo étnico composto pelos nativos indígenas, colonizadores portugueses e os africanos trazidos como escravos. O povo sertanejo é rural, as famílias vivem em comunidades e praticam a agricultura de subsistência.
Origem da culinária sertaneja
Assim como as demais cozinhas regionais do Brasil, a culinária sertaneja tem influência das culinárias indígena e portuguesa. Câmara Cascudo escreveu em 1983, que a cozinha sertaneja genuína é aquela criada pelos descendentes de indígenas, pois tinha que ser uma comida de “sustança”, afirmava o autor.
Já os refogados, ensopados, guisados e assados com bodes, carneiros e caças foram influência da culinária portuguesa.
As plantas nativas da caatinga não são apenas componentes da paisagem das regiões secas, são também presença marcante na cozinha sertaneja.
O mandacaru, o umbu, a algaroba e o licuri são algumas das espécies que compõem pratos tradicionais.
O mamão-de-veado, por exemplo, é um arbusto resistente às secas e muito utilizado como doce, facilmente encontrado nas feiras livres do sertão baiano.
Já a macambira, uma bromélia existente na caatinga, era matéria-prima para a fabricação de pão, a batata da planta era transformada em farinha de mingau, farofa, pão, angu ou biscoito.
A literatura brasileira eternizou o modo de comer no sertão. O escritor e jornalista Euclides da Cunha presenciou a Guerra de Canudos e relatou a experiência em “Os Sertões” e “Canudos: diário de uma expedição” onde conta que, para o povo se manter de pé, se alimentava de “bró”, um pão que empazinava os famintos e das raízes dos umbuzeiros e dos cactos, tinha-se uma fonte de alimento e de água para beber.
As principais características da culinária sertaneja
- A comida tem uma pegada rústica. Forte no sabor, na apresentação e no conjunto de ingredientes, ela tem seus encantos e uma identidade social muito grande para os sertanejos;
- Por muito tempo os pratos eram pensados para durar muito tempo, como as carnes desidratadas e também a presença de alimentos secos, como as farinhas de milho, mandioca, feijões, favas e rapaduras;
- Pequenos animais de criação integram as receitas sertanejas, como: cabrito, bode, tatu, preá e outras espécies;
- O queijo coalho e a manteiga de garrafa são preparos artesanais marcantes na região;
- Tudo é precioso demais para ser desperdiçado. Os alimentos são aproveitados integralmente.
O aproveitamento integral dos alimentos na culinária sertaneja
Não foi uma escolha intencional, aproveitar os alimentos em sua totalidade, foi uma necessidade. Para quem não tem familiaridade com o termo, explicamos o que é aproveitamento integral dos alimentos.
Como a vegetação é seca, o tempo é quente e chove pouco, no passado, quando a farinha de mandioca ficava escassa, as partes menos nobres do bode secavam no tempo e depois eram piladas e viravam farinha de bode.
Aves como as rolinhas e roedores como os mocós e os preás eram preparados com leite do coquinho licuri, uma espécie de palmeira presente na caatinga e no cerrado brasileiro.
Os legumes marcam forte presença na culinária sertaneja, são eles: abóboras, maxixe, quiabo, batata-doce, bredo e milho verde.
Das abóboras são aproveitadas tudo: polpa, folhas, flores, “olhos”, “tripas” e sementes.
As espécies de feijão mais comuns são feijão gordo, feijão de corda e mulatinho.
Além das próprias leguminosas, as folhas no feijão são refogadas e usadas em ensopados com leite de coco.
Qual a relação das festas juninas e da culinária sertaneja?
Uma das maiores manifestações culturais nordestinas são as festas juninas. Elas são uma herança portuguesa em homenagem ao nascimento de João Batista, o São João.
A festa junina é uma festa popular e religiosa e tem grande importância cultural e econômica para as cidades do Nordeste.
E se tem festa, tem comida! A maioria dos pratos típicos leva milho, que é um alimento da safra do meio do ano. Milho de canjica, o milho quebrado em forma de canjiquinha, pamonha, bolo de milho verde são alguns dos pratos típicos das festas juninas.
Mas outros alimentos in natura são base para as receitas juninas, são eles: o amendoim, o coco e a mandioca.
Quer comer um mingau de milho verde em uma festa junina do Nordeste? Peça um curau. Aqui tem receita para você fazer essa iguaria junina em casa.
Já o mungunzá doce ou canjica leva leite de coco e canela e, feito na panela de pressão, fica pronto rapidinho.