1) O que é o “novo” Cadastro Positivo?
É um sistema de pontuação que reúne informações sobre uma pessoa para avaliar o risco de oferecer crédito a ela. Ele mede se você é “mais confiável” para receber um empréstimo, um financiamento, ou uma compra no cartão de crédito. O sistema existe desde 2011, mas precisava da autorização prévia e expressa do usuário para que suas informações financeiras e de pagamento pudessem ser avaliadas pelos birôs de crédito, como Serasa Experian, Quod e Boa Vista SPC. Aprovado pelo Congresso em abril de 2019, o novo Cadastro Positivo modifica essa regra: agora, a abertura do cadastro será feita de forma automática, não mais voluntária, abrangendo todos os consumidores brasileiros.
2) Como é feita a pontuação?
O sistema pontua cada consumidor com uma nota que geralmente pode variar de 1 até 1000, calculada a partir das informações coletadas pelas empresas, com seus dados financeiros, sua renda, pagamento de contas de energia, água, telefone e qualquer pagamento realizado. Quanto mais perto de 1, considera-se maior o risco que a pessoa apresenta para a oferta de crédito. Inversamente, quanto mais próximo de 1000, maior a sua chance de ser considerada uma “boa pagadora”.
3) Como o sistema funciona?
As responsáveis por coletar as informações e elaborar uma pontuação são as empresas especializadas em análise de crédito, como Serasa, Boa Vista, Quod e SPC. Para isso, elas utilizam sistemas automatizados, chamados de algoritmos, que atribuem um valor diferente para cada usuário, resultando na nota final. Essas empresas podem então compartilhar a nota de cada consumidor com varejistas, instituições financeiras e bancos, que irão avaliar se concedem crédito e sob quais taxas de juros, de acordo com a capacidade de pagamento que avaliam que os clientes possuem.
4) Quais informações poderão ser acessadas pelas instituições financeiras e empresas?
O gestor do banco de dados será autorizado a disponibilizar às instituições financeiras e empresas somente a pontuação de crédito dos consumidores. O histórico de crédito, com acesso aos dados sobre pagamentos, somente poderá ser acessado mediante prévia autorização específica do cadastrado.
5) Quais informações podem e não podem ser utilizadas para “pontuar” o consumidor?
Pode: Serviços de proteção ao crédito poderão utilizar dados de suas contas pessoais - como água, luz, gás, internet e aluguel, além de todas as compras feitas à prazo. Informações sobre seus familiares, dependentes ou de primeiro grau (pais, mães, filhos e filhas), também podem ser utilizadas para classificar os consumidores.
Não pode: Não podem ser utilizados para a produção da pontuação do consumidor dados que não estejam exclusiva e diretamente ligados à avaliação de risco de crédito, como informações excessivas (que não estiverem vinculadas à análise de risco de crédito ao consumidor) e informações sensíveis (pertinentes à origem social e étnica, à saúde, à informação genética, à orientação sexual e às convicções políticas, religiosas e filosóficas). O Idec defende que dados “alternativos”, como aqueles ligados à navegação na internet e ao uso de aplicativos, dados de geolocalização, bem como dados de compras de bens e serviços em geral, também não possam ser utilizados, inclusive para a produção de perfis adicionais ou paralelos.
6) Por que estar no novo Cadastro Positivo não é necessariamente bom?
Porque, com isso, o consumidor será “avaliado” por essas instituições de diversas formas e, mesmo estando em dia com suas contas, poderá ser mal avaliado pelos operadores de crédito, podendo inclusive ter empréstimos negados - ou aceito com juros muito elevados - por ter uma pontuação baixa dada por esses operadores de crédito. Além disso, estar no Cadastro Positivo significa dar o seu aval para essas empresas buscarem todo tipo de informação sobre sua vida, o que pode dar margem para condutas discriminatórias, apesar da ilegalidade de utilização de dados sensíveis.
7) O Cadastro Positivo é o oposto do cadastro negativo?
O chamado Cadastro Positivo não é o oposto do “cadastro negativo”, onde constam os nomes dos consumidores inscritos nas listas de “proteção ao crédito”, por possuírem débito pendente. Essas listas são desenvolvidas pelas mesmas empresas que formulam o Cadastro Positivo. No sistema, constam todos os consumidores brasileiros com CPF, incluindo aqueles que têm ou tiveram seu nome “negativado”. Ou seja, estar no Cadastro Positivo não significa que o consumidor está sendo “bem avaliado”, muito pelo contrário, os indicadores econômicos apontam que há mais de 60 milhões de pessoas endividadas no Brasil, o desemprego segue altíssimo e a renda estagnada, o que certamente leva ao atraso em pagamentos da base da população brasileira. Tudo isso leva a crer que o contingente de consumidores com “pontuação baixa” será enorme, mesmo que eles não estejam “negativados”.
8) Atrasos em contas comuns podem reduzir minha pontuação?
Sim, atrasos em contas de luz, água, internet e telefonia levarão sua pontuação para baixo, fazendo com que você passa ser considerado um mau pagador. Mesmo que a cobrança pelos fornecedores dos serviços seja indevida, o débito será informado às empresas avaliadoras de crédito. Mas, diante da falta de transparência, o problema é maior: ainda restam dúvidas sobre quais outras contas, se atrasadas, podem influenciar em sua pontuação, ou quais outras ações do consumidor serão utilizadas como insumo para a produção desse score.
9) Se eu optar por retirar neu nome do Cadastro, posso sofrer represálias ou ter crédito negado?
Não, mas é preciso ficar atento. Você não poderá sofrer represálias por não querer compartilhar os seus dados no Cadastro Positivo, sobretudo se não possuir interesse em obter crédito e empréstimos no mercado e, também, para se proteger de publicidade e oferta de crédito. A proteção de sua privacidade é um direito e não pode gerar qualquer tipo de discriminação. Se isso ocorrer, recorra ao Procon e registre sua reclamação na Ouvidoria do Banco Central.
10) Posso cancelar ou suspender meu nome do Cadastro?
Sim, o consumidor pode, a qualquer momento, solicitar o cancelamento e a suspensão do seu nome no sistema. Ao cancelar sua inscrição, o consumidor não terá mais pagamento coletados pelos birôs, que terão acesso somente às informações de inadimplemento. Ao suspender seu Cadastro, os birôs continuam recebendo os dados, mas não podem repassá-lo aos consulentes e às empresas que usam a pontuação. Se solicitar o reingresso, o consumidor volta a ter seus dados coletados e repassado aos consulentes e não pode sofrer qualquer discriminação por isso. A solicitação deve ser feita em um único birô - por meio eletrônico, por telefone ou em atendimento presencial -, e este birô possui 2 dias úteis para processar o pedido e repassar a solicitação aos demais birôs, que também possuem mais 2 úteis dias para processar a informação e cancelar ou suspender o Cadastro.
11) Posso ter acesso aos meus dados, inclusive histórico e pontuação de crédito?
Sim, o consumidor pode solicitar aos birôs seu histórico e sua pontuação, assim como todos os dados que estão sendo utilizados como insumo para produção de seu score de crédito. O consumidor deve fazer a solicitação ao birô do qual deseja obter essa informação - por meio eletrônico, por telefone ou em atendimento presencial - e este birô possui 10 dias para responder ao pedido.
12) Posso ter acesso aos principais elementos e critérios considerados na análise de risco?
Sim, o consumidor tem o direito de solicitar a cada um dos birôs quais são os principais elementos que são considerados para a formulação da pontuação, bem como quais são os principais critérios considerados para essa formulação. Neste caso, o consumidor deve fazer a solicitação ao birô do qual quer obter a informação - por meio eletrônico, por telefone ou em atendimento presencial -, e este birô possui 10 dias para processar o pedido.
13) Posso solicitar a retificação de dados incorretos?
Sim, após obter acesso aos dados e verificar a existência de informações incorretas, desatualizadas ou incompletas, o consumidor pode solicitar a correção do dado, que deve ser processada em 10 dias e repassada aos demais birôs em 2 dias.
14) Posso solicitar ao consulente a revisão de decisão realizada por meios automatizados?
Sim, caso o consumidor se sinta prejudicado pela decisão tomada na formulação de sua pontuação ou na decisão tomada pelo consulente para restringir acesso ao crédito ou impor taxas de juros abusivas, ele pode solicitar que as empresas revejam essas decisões. Para que isso ocorra, o consumidor deve fazer a solicitação ao birô ou ao consulente - por meio eletrônico, por telefone ou em atendimento presencial -, que têm até 7 dias úteis para processar o pedido e enviar o resultado ao consumidor, que tem direito de receber uma resposta fundamentada. Lembrando que somente a solicitação ao consulente está previsto expressamente na lei.
15) Onde recorrer caso me sinta lesado?
Caso se sinta lesado, você poderá recorrer aos órgãos de proteção e defesa do consumidor, como o Procon e a plataforma Consumidor.gov, que podem aplicar medidas corretivas e determinar às empresas de avaliação de crédito excluir do cadastro informações incorretas, assim como cancelar os cadastros de pessoas que solicitaram.
16) Quem tem responsabilidade sobre essas informações?
São responsáveis por eventual dano que causarem ao cadastrado, de forma objetiva (independente de culpa) e solidária (todos respondem de forma igual), as empresas de banco de dados, as empresas que concedem crédito e que impliquem risco financeiro, inclusive as instituições financeiras e os prestadores de serviços continuados de água, esgoto, eletricidade, gás, telecomunicações e assemelhados, além das empresas que verificarem a pontuação de crédito.
17) Os bancos afirmam que os juros vão baixar com o novo Cadastro, é verdade?
Esse é um grande mito, pois os juros podem ser reduzidos, em ocasiões específicas, para um seleto público de alta renda considerado “bom pagador”. Em um país com mais de 60 milhões de consumidores endividados e quase 15 milhões de desempregados, além de outros milhões que, por conta das dificuldades financeiras, acabam eventualmente atrasando contas de consumo, o cenário que o Idec vislumbra para a maioria da população é de potencial restrição de acesso ao crédito, com manutenção da taxa de juros em níveis altos, ou até mesmo sua elevação de juros para a grande maioria da população.
18) Qual a posição do Idec sobre o novo Cadastro Positivo?
Consideramos que a inclusão automática dos consumidores no novo Cadastro Positivo conflita com a Lei Geral de Proteção de Dados , que afirma o princípio da autodeterminação informativa, ou seja, o direito de ter maior controle sobre todo o seu fluxo de informações, e o direito à informação adequada e clara.
Na prática, significa que seus dados são parte de você e por isso é direito seu determinar o que será feito com suas informações. Portanto, deveria ser direito de qualquer consumidor não ser incluído compulsoriamente no Cadastro Positivo.
Devido a falta de transparência sobre exatamente quais dados serão utilizados e irão compor a pontuação dos consumidores, existe o risco de discriminação na hora de solicitar crédito financeiro ou realizar compras à prazo.
19) Para quem pode ser vantajoso ou prejudicial estar no cadastro positivo?
Do ponto de vista da privacidade e da segurança da informação, consideramos prejudicial estar no Cadastro Positivo. No entanto, do ponto de vista econômico, não há uma única resposta para essa pergunta. Uma informação sobre a sua vida financeira nunca é positiva ou negativa em si mesma: tudo depende da interpretação que a empresa faz sobre os seus dados. É possível que a sua taxa de juros abaixe, assim como também é possível que ela aumente ou continue a mesma. Considerando isso, você deve refletir de acordo com os seus interesses e possibilidades.