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Desde o início do ano duas capitais já aumentaram o valor da tarifa do transporte público: São Paulo (SP), onde o metrô e o trem (CPTM) subiram de R$ 4,40 para R$ 5,00, e Belo Horizonte (MG), onde o ônibus urbano foi de R$ 4,50 para R$ 5,25, e o transporte metropolitano que custava R$ 7,20 passou para R$ 7,70. É possível que outras cidades também façam reajustes sob a alegação de aumento de custos gerado pela inflação.
Na visão do Idec, os aumentos precisam ser revistos e melhor explicados, pois as empresas concessionárias não dão transparência adequada para os custos de operação do serviço. Isso faz com que prefeituras, estados e a população não tenham qualquer ideia se os reajustes são de fato justos e necessários. Além disso, defendemos que haja uma mudança na forma como o transporte público hoje é financiado em todo o País: não pode ser somente a população usuária, que na sua maioria pertence às faixas de renda menores, a única responsável pela manutenção econômica dos sistemas. Os recursos precisam vir da sociedade como um todo. Outra mudança importante é a forma de remuneração: por que não remunerar, por exemplo, por km percorrido, independentemente da lotação, favorecendo assim a qualidade e a clareza sobre os custos?
Como é hoje?
Atualmente, o reajuste tarifário previsto nos contratos de concessão não se baseia em uma análise dos custos reais.
Na maioria das cidades, a remuneração das empresas concessionárias está baseada na quantidade de passageiros transportados, não no custo que se tem para transportar adequadamente a população, atendendo às suas necessidades de deslocamento. “Isso não tem sentido. Pensemos em um táxi: o preço para percorrer determinado trecho, seja com um ou quatro passageiros no veículo, será o mesmo, porque é baseado no custo que se tem para percorrer determinada quilometragem. No transporte público deveria ser igual”, compara a analista.
Na lógica da cobrança por passageiro, as empresas de ônibus, por exemplo, tendem a disponibilizar veículos mais antigos e em menor quantidade - visando diminuir custos e ampliar a margem de lucro - aumentando a lotação e rebaixando a qualidade do serviço. Também procuram pressionar o poder público pelo reajuste anual da tarifa. “Cada vez que a qualidade do serviço cai e que se aumenta o preço, passageiros abandonam o sistema; com isso, a receita das empresas diminui. Elas, então, procuram reduzir mais a qualidade e aumentar mais a tarifa para compensar a perda. É um círculo vicioso que está falindo os sistemas de transporte público em todo o país”, alerta Annie.
Além disso, a maioria das grandes cidades adota um modelo de fórmula paramétrica. Neste sistema, o valor do reajuste do custo é estabelecido a partir de índices, ou parâmetros, de preços nacionais, também dissociado do custo real do serviço em cada cidade. Trata-se de índices gerais de preço do diesel, de outros insumos como lubrificantes e material rodante, preço de veículos, custos de mão de obra. Alguns são públicos, calculados pelo IBGE, enquanto outros são calculados por entes privados, como a Fundação Getúlio Vargas.
Na fórmula paramétrica, esses índices são ponderados e multiplicados por uma tarifa base, normalmente a que estava em vigor quando o contrato começou. Quando um valor positivo é multiplicado pela tarifa corrente, seu valor aumenta. “Isso significa, portanto, que o reajuste tarifário poderá ser positivo, mesmo que o concessionário tenha conseguido reduzir seus custos. E como ele faz para reduzir custos e ampliar sua margem de lucro? Precarizando o serviço oferecido à população”, explica Annie Oviedo, analista de mobilidade urbana do Instituto.
Transporte público coletivo bom é um direito previsto na Constituição Federal. Ele deve existir e ser acessível a toda a população. Mas isso custa caro e não é justo colocar essa conta no bolso apenas de quem usa o serviço - em geral as pessoas mais vulneráveis -, pois o resultado será sempre aumentos de tarifa que expulsam os passageiros do sistema. O transporte público beneficia as cidades como um todo, mesmo quem não o utiliza. Reduz congestionamentos, poluição, fomenta a economia etc. Então, assim como ocorre com os outros serviços públicos, é necessário que a sociedade como um todo ajude a custeá-lo. Isso pode ser feito por meio de subsídio público.
“A saúde e a educação são pagas pela coletividade, e seu uso é gratuito. O saneamento e a coleta de lixo são pagos individualmente, mas as tarifas não são iguais para todo mundo: quem tem mais, paga mais, quem tem menos, paga menos, e quem não tem, não paga nada. Por que não é assim também para o transporte coletivo?”, questiona, Annie.
Subsidiar o transporte público, para reduzir e até zerar tarifas, nada mais é do que uma maneira de garantir o direito constitucional ao deslocamento para toda a população. “A tarifa, hoje, é uma barreira social que impede milhões de pessoas de acessarem outros direitos, como saúde, educação, trabalho, lazer etc”, conclui.