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Entre os dias 13 e 22/4, o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) participou de um dos mais importantes fóruns globais sobre preços justos no mercado de medicamentos - o Fair Pricing Forum, organizado pela Organização Mundial da Saúde. Ana Carolina Navarrete, coordenadora do Programa de Saúde do Instituto, foi uma das convidadas para a sessão sobre iniciativas nacionais de transparência, reforma nas políticas de precificação e papel dos diferentes atores da sociedade.
A reunião trouxe para o centro do debate a importância dos mecanismos de governança e transparência para garantir o equilíbrio do mercado e o acesso integral à saúde. Em sua apresentação, Ana Carolina Navarrete defendeu que requisitos de transparência sejam adotados no processo de incorporação de novas tecnologias nos sistemas nacionais de saúde como condição para a aquisição pública e para o registro sanitário.
Ela mencionou, como avanço brasileiro, a existência do Banco de Preços em Saúde, uma plataforma para a consulta dos preços praticados nas compras públicas. Foi a partir do estudo dos dados coletados nesse canal que o Grupo sobre Direito e Pobreza da USP (Universidade de São Paulo) conseguiu, por exemplo, identificar variações exorbitantes nos preços cobrados pelo tratamento da Hepatite C pela farmacêutica Gilead - o caso está sob análise do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).
Navarrete também falou sobre o projeto de lei 5591/20, de autoria do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que amplia os requisitos de transparência no processo de registro de novos medicamentos no mercado brasileiro. O projeto está em análise no Congresso e incorpora critérios propostos pela organização francesa OTMeds (Observatoire de la Transparence dans les Politiques du Médicament). A campanha Remédio a Preço Justo, lançada pelo Idec em fevereiro, pressiona os parlamentares pela aprovação do texto. Clique aqui para saber mais e apoiar.
Ao longo do painel, os participantes compartilharam experiências de países como Sri Lanka, Gana e Itália. Diogo Piedade, gerente de Acesso da Medicines for Europe, falou sobre os impactos dos mecanismos de comparação internacional de preços (as chamadas “cestas” de países) na definição de preços e na consolidação dos mercados nacionais - uma dinâmica que, segundo ele, pode limitar a entrada de medicamentos genéricos e biossimilares e reduzir o acesso da população a estas tecnologias.
Roz Scourse, assessora política da campanha de Acesso da organização Médicos Sem Fronteiras, comentou sobre o impacto da falta de transparência nos altos preços. Para ela, a apresentação de informações sobre os custos de pesquisa é pré-condição para que os governos possam realizar negociações justas com as empresas farmacêuticas. Scourse trouxe, como exemplo negativo, a falta de condicionantes nos investimentos públicos feitos para o desenvolvimento das vacinas contra a Covid-19.
O evento, que foi concebido pela OMS para acelerar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável na área da saúde, também colocou foco na emergência sanitária e no papel da inovação e dos mecanismos de mercado no enfrentamento à pandemia. Em um painel sobre bens públicos globais em tempos de Covid-19, a coordenadora da RedLam (Rede Latinoamericana para o Acesso a Medicamentos) María Lorena Di Giano ressaltou que há uma tendência em centrar o debate no modelo de inovação, que atualmente é baseado no monopólio e nas patentes, beneficiando a indústria farmacêutica em detrimento das populações.
Ela destacou também a desigualdade na distribuição das doses de vacinas no mundo e fez críticas a iniciativas baseadas no licenciamento voluntário, que terminariam garantindo a transferência de tecnologia a apenas alguns países. “A discussão deveria focar no desenvolvimento de soluções para toda a população”, defendeu.
Em outro painel sobre inovação, Pauline Londeix, cofundadora da organização francesa OTMeds, criticou negociações de preço baseadas no valor subjetivo do resultado clínico - uma forma, segundo ela, de colocar um preço na vida das pessoas e, dessa forma, limitar o poder de negociação dos governos.
Ela falou sobre a experiência francesa de incorporação de critérios de transparência elaborados pela sua entidade, e também ressaltou a falta de informações sobre os investimentos públicos e riscos assumidos por toda a sociedade no desenvolvimento das vacinas contra a Covid-19.
Veja aqui o relatório final Fair Pricing Forum (em inglês)