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O Ministério Público Federal (MPF) resolveu entrar na polêmica sobre acesso a medicamentos no Brasil. No último dia 24 de abril, o procurador-geral da República, Antônio Fernando Barros e Silva de Souza, propôs uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) requerendo a inconstitucionalidade dos artigos 230 e 231 da Lei de Propriedade Intelectual (nº 9.279/96), que prevêem as patentes de revalidação, conhecidas como patentes pipeline. A ADI foi distribuída à relatora Carmen Lúcia Antunes Rocha, que julgará o pedido de liminar de suspensão dos efeitos dos artigos.
O mecanismo pipeline possibilitou depósitos de patentes em campos tecnológicos não reconhecidos até então no país, permitindo a proteção patentária de produtos farmacêuticos e alimentícios, entre outros. Ao todo foram depositadas 1.182 patentes por esse mecanismo, entre elas estão medicamentos importantes para o tratamento do HIV/AIDS e leucemia, por exemplo.
Para o MPF, o conhecimento que já está em domínio público integra o patrimônio comum da sociedade. "O que fez o legislador, por via oblíqua, foi promover uma espécie de expropriação de um bem comum do povo sem qualquer amparo constitucional."
A ação proposta pelo procurador é resultado da representação feita em novembro de 2007 pela Rebrip (Rede Brasileira Pela Integração dos Povos) e pela Fenafar (Federação Nacional dos Farmacêuticos). Um parecer elaborado por economistas e incluído nessa representação dimensiona o prejuízo hipotético causado pela adoção do mecanismo pipeline no Brasil no caso específico das compras governamentais de cinco medicamentos antiretrovirais (ARVs) utilizados para combater o vírus da AIDS ocorridas entre 2001 e 2007.
Os dados revelam que o Brasil gastou entre US$ 420 milhões (a partir da comparação com os preços mínimos da OMS (Organização Mundial de Saúde) e US$ 519 milhões (comparando com preços mínimos da organização Médicos sem Fronteiras) a mais, apenas com os cinco medicamentos antiretrovirais.
Efeito contrário
Na opinião de Cristina Pimenta, coordenadora-geral da Abia (Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids), organização que atualmente coordena o GTPI (Grupo de Trabalho em Propriedade Intelectual) da Rebrip, "o mecanismopipeline, ao invés de fomentar o desenvolvimento do país e servir ao interesse público, serve de barreira ao acesso universal ao tratamento das pessoas com HIV/AIDS, pois o governo é obrigado a negociar constantemente com as empresas multinacionais para reduzir o preço de medicamentos protegidos por este mecanismo, quando alternativas genéricas a preços mais acessíveis já estavam disponíveis no mercado internacional".
A presidente da Fenafar, Célia Chaves, acrescenta que "não houve nenhum ganho para o Brasil com esta concessão, quer para a indústria e setor farmacêutico nacionais, quer para a população em geral. Todos foram prejudicados pelas patentes pipeline".
Segundo Eloísa Machado, advogada da Conectas Direitos Humanos, organização que também participa do GTPI, "num momento em que o STF realiza audiências públicas sobre saúde e que o tema do custo dos medicamentos é colocado em discussão como limitador do acesso, é de suma importância o questionamento da constitucionalidade das patentes pipeline, já que esse mecanismo gera enormes prejuízos financeiros ao Estado e ao acesso da população a medicamentos. Trata-se de um momento oportuno para que o STF (Supremo Tribunal Federal) analise os reais motivos para os altos preços pagos pelo Estado a medicamentos essenciais e desmistifique os argumentos relacionados ao custo da inovação. Preços altos podem ser frutos de práticas monopolistas injustificáveis".
No dia 27 de abril de 2009 a ADI foi distribuída à relatoria da Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, que apreciará o pedido liminar de suspensão dos efeitos dos artigos questionados.