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Publicidade de tabaco nos pontos de venda

Uma campanha de alerta sobre os perigos da publicidade do tabaco gerou polêmica nessa última semana. A ACT (Aliança de Controle do Tabagismo) veiculou um vídeo1  chamando atenção sobre a publicidade do tabaco nos pontos de venda e seu potencial de atingir o público infantil. Tal peça fora contestada judicialmente pela Souza Cruz, por considerá-la "inverídica", uma vez que não vende cigarros para crianças.

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Atualizado: 

02/10/2012
Mariana Ferraz
Sobre essa questão, alguns esclarecimentos do ponto de vista do direito internacional e do direito do consumidor se fazem necessários.
 
Em primeiro lugar, o Brasil é signatário da Convenção Quadro para o Controle do Tabaco, primeiro tratado internacional de saúde pública, celebrado sob os auspícios da Organização Mundial de Saúde, OMS, e ratificado por mais de 170 países, entre eles o Brasil (Decreto 5.658/2006). Tal convenção reconhece em seu preâmbulo, entre outras disposições, a importância do marketing como vetor da epidemia tabagística, em especial para crianças e adolescentes, bem como a atuação da indústria do tabaco para minar os esforços das políticas de saúde pública. O objetivo central da Convenção é proteger as gerações presentes e futuras das devastadoras consequências sanitárias, sociais, ambientais e econômicas geradas pelo consumo e pela exposição à fumaça do tabaco.
 
Importante notar que nove em cada dez fumantes iniciam-se antes dos 19 anos, razão pela qual o tabagismo é considerado doença pediátrica 2 .
 
Tendo em vista essas diretrizes internacionais, o Brasil aprovou em 2011 a Lei 12.546 que proíbe a publicidade nos pontos de venda. Diz o texto da lei que É vedada, em todo o território nacional, a propaganda comercial de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou qualquer outro produto fumígeno, derivado ou não do tabaco, com exceção apenas da exposição dos referidos produtos nos locais de vendas, desde que acompanhada das cláusulas de advertência a que se referem os §§ 2o, 3o e 4o deste artigo e da respectiva tabela de preços, que deve incluir o preço mínimo de venda no varejo de cigarros classificados no código 2402.20.00 da Tipi, vigente à época, conforme estabelecido pelo Poder Executivo.
 
Apesar da proibição legal, as empresas continuam fazendo publicidade nos pontos de venda através de pôsteres, painéis e cartazes. Além disso, verificam-se nos pontos de venda, tais quais nos caixas de padarias, a proximidade do apelo publicitário do tabaco aos doces, balas e chicletes que frequentemente chamam atenção do público infantil.
 
Cumpre-nos também notar as disposições da legislação consumerista acerca do tema. Sobre isso, importante ter em mente que o Código de Defesa do Consumidor prevê como direitos básicos do consumidor a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos (art. 6, I); e a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços (art. 6, IV).
 
Outra disposição do CDC que destacamos é a seguinte:
 
Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.
§ 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança. (grifo nosso)
 
O cigarro, não é um produto qualquer, é uma droga psicoativa que causa dependência, além de causar doenças e mortes. Apenas por essa disposição (art. 37§ 2° do CDC) é possível inferir que toda publicidade do tabaco é ilegal, pois tem como escopo a indução do consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde. A ilegalidade é ainda reforçada quando o marketing atinge o público infantil.
 
Importante notar que não há vedação à autorização de venda dos produtos fumígenos, mas sim às estratégias de marketing que visam estimular o consumo. Isso pode ocorrer das mais diversas formas, seja por uma embalagem atrativa, brindes promocionais associados à compra do tabaco, displays promocionais, etc.
 
No caso da campanha promovida pela ACT, a Juíza Veleda Suzete Saldanha Carvalho, da 23ª Vara Cível do Rio de Janeiro, acertadamente negou liminar pedida pela Souza Cruz para suspender campanha de prevenção ao tabagismo. A Juíza entendeu que a campanha não faz menção expressa à Souza Cruz nem a acusa de vender cigarros a crianças e adolescentes, argumentos utilizados para pedir a liminar.
 
Pelos fatos e direitos acima expostos, acreditamos que o trabalho da ACT e a campanha “Limite Tabaco” estão nos exatos termos da CQCT, e devem ser não somente apoiados, mas incentivados em nome dos direitos do consumidor, do direito à informação e à saúde.
 
 
[2] Tabagismo: Um grave problema de saúde pública. Instituto Nacional do Câncer – INCA. 2007.