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Negativa de atendimento de urgência por ausência de cheque caução é omissão de socorro

No último dia 29, começou a viger a Lei Federal 12.653/2012, que incluiu no Código Penal o artigo 135-A. O dispositivo, que estabelece novo tipo penal denominado “condicionamento de atendimento médico-hospitalar emergencial”, determina que:   “Art. 135-A. Exigir cheque-caução, nota promissória ou qualquer garantia, bem como o preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.

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Atualizado: 

14/06/2012
Maria Elisa Novais
Parágrafo único. A pena é aumentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave, e até o triplo se resulta a morte.”
 
Situação emergencial é aquela que implica risco imediato à vida ou de lesões irreparáveis para o paciente. A situação não ocorre com tanta raridade, como se pode imaginar. Culminar a sua proibição com a sua tipificação penal é uma importante garantia para o consumidor e espera-se que funcione como inibidor da prática lesiva. 
 
A pena aplicada será aumentada até o dobro se a negativa de atendimento que resultou em lesão corporal de natureza grave, tiver como resultado: (i) incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias; (ii) perigo à vida; (iii) debilidade permanente de membro, sentido ou função; ou (iv)  aceleração de parto.
 
Ainda que dificultadores possam se apresentar na imputação da prática criminosa a determinado agente, tendo em vista que a ocorrência configura-se como prática instituída por pessoa jurídica, muitas vezes, a melhor doutrina penal entende que, neste caso, os responsáveis pela empresa (seus sócios administradores) e seus prepostos serão os sujeitos ativos do crime.
 
Outro ponto relevante é a imposição de multa ao sujeito ativo. Seria possível atribuir a esse tipo penal as mesmas considerações feitas em relação à imputabilidade da pessoa jurídica em crimes ambientais? A teoria da dupla imputação1 sugere que à pessoa jurídica serão impostas as penas restritivas de direito e de multa. Nesse sentido, exatamente pela previsão de multa, é de extrema relevância que o aplicador da lei pondere pela finalidade da imposição de multa considerando a presença de pessoa jurídica como sujeito ativo de modo que tal penalidade tenha o condão de inibir a reincidência do crime e, portanto, seja estabelecida em montante sensível à realidade da pessoa jurídica.
 
Sem investir demais na seara penal e atendo-se à importância da medida para aprimoramento das relações de consumo, a questão em tela transcende o diploma consumerista que, por si só, já se constitui como norma de interesse coletivo e relevância social: a questão alcança a preservação da vida, bem como afasta a prática nefasta do proveito de momento de desespero do cidadão para garantir o lucro da empresa.
 
A Lei nº 12.653/2012 também exige dos hospitais a afixação em local visível, cartaz ou equivalente, a seguinte informação, para que o conhecimento sobre a previsão seja de célere difusão a todos: 
 
“Constitui crime a exigência de cheque-caução, de nota promissória ou de qualquer garantia, bem como do preenchimento prévio de formulários administrativos, como condição para o atendimento médico-hospitalar emergencial, nos termos do art. 135-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal.”
 
O Idec há tempos entende a cobrança de cheque caução por hospitais em casos de urgência e emergência, como forma de garantir que o paciente arque com os custos do serviço como prática ilegal. 
 
O assunto voltou a ser colocado em pauta depois que o secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento faleceu em janeiro deste ano, após dois hospitais do Distrito Federal terem se recusado a atendê-lo. A recursa ocorreu porque os estabelecimentos não atendiam o plano de saúde do secretário e, para poder interná-lo, exigiram cheque caução e ele estava sem o talão de cheques.
 
Vale lembrar que a exigência de cheque caução, depósito de qualquer natureza, nota promissória ou quaisquer outros títulos de crédito já é considerada prática ilegal pela legislação abaixo:
 
- A  Resolução Normativa 44/2003 da ANS estabelece que se um  hospital  fizer parte da rede credenciada de uma operadora de plano de saúde, é proibido "em qualquer situação, a exigência, por parte dos prestadores de serviços contratados, credenciados, cooperados ou referenciados das Operadoras de Planos de Assistência à Saúde e Seguradoras Especializadas em Saúde, de caução, depósito de qualquer natureza, nota promissória ou quaisquer outros títulos de crédito, no ato ou anteriormente à prestação do serviço" (ou seja, para estabelecimentos credenciados a operadoras é proibido exigir garantias em qualquer situação, mesmo nas que não sejam configuradas como emergenciais).
 
- A Lei do Estado de São Paulo 14.471/2011, proíbe a exigência de caução de qualquer natureza para internação de doentes em hospitais ou clínicas da rede privada no Estado de São Paulo (independentemente destes estabelecimentos integrarem a de rede credenciada de uma operadora), nas hipóteses de emergência ou urgência. Neste caso, os estabelecimentos devem devolver aos consumidores o dobro dos valores depositados e estarão sujeitos a multas que variam de R$ 18.200,00 a R$ 182.200,00.
 
Caso o consumidor tenha seu atendimento médico-hospitalar de emergência  condicionado à apresentação de cheque caução, nota promissória ou qualquer outro tipo de garantia (fiança ou número de cartão de crédito, por exemplo), bem como o preenchimento prévio de formulários (contratos de adesão com previsão nesse sentido), ele deve acionar a polícia civil, durante o ato, ou mesmo depois do ocorrido, se assim o desejar. Será registrado um Boletim de Ocorrência, para que o Ministério Público Estadual seja acionado e  instaure a ação penal.
 
Referências
1. Admite-se a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da pessoa física que atua em seu nome ou em seu benefício, uma vez que 'não se pode compreender a responsabilização do ente moral dissociada da atuação de uma pessoa física, que age com elemento subjetivo próprio' cf. Resp nº 564960/SC, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJ de 13/06/2005 (Precedentes) (STJ – (RMS 20601/SP, Rel. FELIX FISCHER, j. 28/06/2006)