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PL Azeredo e o desserviço à cidadania virtual

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Atualizado: 

13/10/2017
Guilherme Varella
O PL 84/99 (ou projeto de lei de cibercrimes), cujo substitutivo proposto pelo dep. Eduardo Azeredo (PSDB-MG) tramita em caráter de urgência na Câmara dos Deputados, deve ser votado em breve. Trata-se não apenas do debate sobre a criminalização do mp3 - claro que isso também, pois o PL o criminaliza, sim. Porém, mais que isso, estamos debatendo cultura política, cidadania na Internet e acesso à cultura.  
 
O PL 84/99 tramita há 12 anos no Congresso. 12 anos! Imaginem o que significam 12 anos para a Internet. Muito tempo. Uma geração conectada se formou nesse tempo. Nesse tempo, inúmeras vezes a Internet se transformou. É outra, e continua mudando a cada dia. Não é a mesma do século passado, 1999, quando o projeto foi proposto. No PL Azeredo há uma obsolescência embutida. E uma lei que serve para assegurar direitos na Internet tem que ser contemporânea, atual. Enfim, tem que ser do tempo da Internet  e não estar a um passo atrás dela, como é o caso do PL de cibercrimes.
 
E o tempo da Internet é o tempo da liberdade, do acesso à cultura, à informação, às redes, à criação colaborativa. De forma segura, sim. Mas também de forma a respeitar direitos, como à liberdade e à privacidade de todos. O PL Azeredo, porém, prevê crimes, e não direitos. Se fosse o contrário, teria mais lógica. Prevê, por exemplo, conforme o art. 285-B, que é crime compartilhar não apenas mp3, mas todos os arquivos digitais, que são dados e informações de sistemas informatizados, ou dependem destes para serem executados. Muitos desses arquivos são protegidos por restrições tecnológicas (os chamados DRMs), cuja desabilitação também passa a ser crime pelo PL. Assim como também adquire status de crime a transferência de arquivos já adquiridos legalmente de uma plataforma para outra (músicas de um CD para um computador, por exemplo), pois o “legítimo titular” desses sistemas não o autoriza expressamente. A pena para quem fizer isso? Um a três anos de prisão. Pena maior do que a de invasão à domicílio, que é de um a três meses.   
 
O PL toma as já restritivas disposições trazidas pelo direito autoral brasileiro e aumenta a sua carga penal. Não seria por outro motivo que a Aliança Internacional da Propriedade Intelectual (AIPI) elogia efusivamente o projeto Azeredo. Formada pela grande indústria fonográfica, cinematográfica e de software americana, radicalmente contra qualquer flexibilização da legislação autoral para o acesso à cultura, a AIPI publicou dois relatórios, em 2009 e em 2010, alegando que a aprovação do projeto de lei de cibercrimes iria facilitar a prisão de brasileiros que violam copyrights pela Internet. Isso consta no seu Special 301 Report, com a referência literal ao PL 89/03, número do PL Azeredo no Senado.  
 
Porém, para além de todo esse aspecto criminalizante, o que o PL Azeredo não incorpora é a nova cultura política existente, especialmente na elaboração das leis. Está no sentido contrário de processos como o Marco Civil da Internet e lei de proteção de dados, que utilizaram-se da própria Internet para possibilitar um debate público intenso, transparente e participativo. Estes dois projetos são muito mais saudáveis para a boa convivência e para a garantia dos direitos na Internet que o PL 84/99. 
 
Por isso, a campanha dos “Consumidores contra o PL Azeredo”  pede a rejeição desse projeto por entender que, muito mais que criminalizar o compartilhamento de mp3 na Internet, ele representa um óbice ao acesso à cultura através da rede e um desserviço ao exercício da cidadania virtual.

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