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O direito do consumidor e a política

Estamos à beira do primeiro turno das eleições municipais e a questão do consumo e do direito do consumidor tem sido bandeira de alguns candidatos. Porém, nenhum deles traz a correta compreensão da responsabilidade do gestor municipal para a consecução da Política Nacional das Relações de Consumo.

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Atualizado: 

04/10/2012
Maria Elisa Cesar Novais
Cada instância política tem a responsabilidade de concretizar as diretrizes ditadas pelo Código de Defesa do Consumidor – estatuto de importância e previsão constitucional, alçado à garantia fundamental expressa textualmente na Carta Republicana – e que estão insculpidas no artigo 4º do referido diploma: reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, que gera, como consequência, ações governamentais para a proteção efetiva e coletiva dos consumidores mediante incentivos à criação e ao desenvolvimento de associações representativas; para garantir a presença do Estado no mercado de consumo, traduzida em órgãos fiscalizadores fortalecidos e imbuídos do exercício efetivo de suas competências, bem como na criação de Conselhos deliberativos com formação paritária entre governo e sociedade civil voltados para a definição de políticas no âmbito municipal; para garantir qualidade e segurança em produtos e serviços; para a educação contínua de fornecedores e consumidores sobre seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo, entre outras medidas constantemente revistas para oferecer respostas efetivas que atendam ao dinamismo do mercado de consumo.
 
Todavia, não é o que se tem observado. Em verdade, o debate sobre as demandas consumeristas tem se reduzido à solução de problemas individualizados, com discursos vazios de proteção e defesa de eleitores singularmente considerados, como se se tratasse de uma resposta a uma necessidade sobre a qual só se tem interesse em época de angariar votos. Quase se pode afirmar que esse tratamento tem forte influência em métodos ainda não superados em nossa política com base na troca de favores pessoais singelos por votos que podem eleger o candidato para uma administração de longos 4 anos.
 
O esvaziamento do debate político não se dá pelo motivo de que tudo está reduzido a uma situação de consumo. Ao contrário. O fato é que exatamente porque a nossa economia é de mercado, o que se reflete em todos os níveis e esferas de poder, é que o debate sobre a relevância dos consumidores deve ser um dos alicerces das propostas de governo. Os serviços que temos de utilização indispensável são prestados pela iniciativa privada e regulados e fiscalizados pelo governo, os produtos que consumimos, em sua extensa maioria, estão à disposição no mercado após aprovação governamental, o nosso transporte, ainda que público, é prestado mediante uma contraprestação pecuniária – muito além do seu valor individualmente considerado, pois, em determinada medida, todos financiam o seu funcionamento, ainda que não tenham a atividade diretamente prestada na medida em que contribuem –, o que fundamenta os pleitos pela qualidade do serviço. E, por fim, todos esses pleitos almejam a sustentabilidade da cidade, seja no que se refere ao consumo de serviços públicos, à mobilidade urbana, à defesa de direitos na esfera municipal.
 
Não é uma defesa individual de direitos que nos interessa e passa a ser constantemente alardeada por candidatos de toda estirpe. É uma proteção coletiva e ativa – não simplesmente reativa, como ouve-se aos quatro ventos – que faça entender qual é a posição do Governo Municipal na definição e implementação de estratégias que permitam a cidadãos consumidores terem voz ativa no estabelecimento de medidas que viabilizem e fortaleçam a sustentabilidade do seu bairro, de sua região e do Município como um todo.
 
Esta é a razão da preocupação do Idec e do Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa do Consumidor – FNECDC ao apresentar a Plataforma dos Consumidores para as Eleições Municipais 2012, disponível no site do Idec (http://www.idec.org.br/especial/plataforma-dos-consumidores#1).
 
A plataforma tem como premissas:
 
  • - a criação e implementação de órgãos municipais dotados de competências fiscalizatórias claras e efetivas, viabilizados mediante a constituição de um fundo municipal com dotação destinada a fins específicos de fortalecimento do Sistema Municipal de Defesa do Consumidor, bem como de órgãos deliberativos com prerrogativas para pautar o trabalho da Prefeitura;
  • - a divulgação das empresas mais reclamadas no âmbito municipal de forma sistematizada e adotando parâmetros já instituídos na esfera federal;
  • - educação e orientação sobre qualidade de produtos e serviços, saúde, alimentação, serviços públicos prestada de forma consolidada e consistente no ensino público e mediante programas governamentais específicos;
  • - garantia de sustentabilidade para o Município, destinando políticas e incentivos específicos para moradias sustentáveis, incremento da mobilidade, tratamento de resíduos, entre outros temas.

 

O que causa espanto é o ainda baixo comprometimento dos candidatos com essas propostas. Que se destaque a adesão de alguns poucos candidatos, fato é que aqueles que ocupam os primeiros lugares nas pesquisas de intenções de voto não chegaram a se manifestar sobre a adesão.

A iniciativa ora empreendida pelo Idec não é nenhuma novidade. Na esfera federal, o instituto fez o mesmo com os candidatos à Presidência da República e todos assinaram as propostas. A atual presidente, inclusive, em discurso recente ressaltou a importância do consumidor para o desenvolvimento do país e a necessidade primordial de preocupação com a qualidade de serviços prestados pelo governo ou pela iniciativa privada, pois os consumidores estão cada vez mais exigentes.
 
Infelizmente, a preocupação federal não se reflete naqueles que almejam gerir os mais de 5.000 Municípios do país e que restringem as demandas coletivas que têm origem em questões de consumo em soluções meramente paliativas, individualizadas e desvinculadas de qualquer formulação de política pública que vise à redução de desigualdades sociais e econômicas.
 
A conscientização política passa pelo direito do consumidor e dele não se aparta em absoluto. O direito do consumidor tem como princípios o reconhecimento de desigualdades fáticas e a construção de medidas claras, específicas e profundas que busquem a redução dessas desigualdades, o fortalecimento da participação social e a sustentabilidade das relações socioeconômicas.
 
Que não se minimize a relevância do tratamento coletivo, proativo, efetivo e sustentável das demandas dos consumidores à simples solução individualizada e empobrecida de conflitos mínimos e localizados. Para que não prevaleça esse entendimento pequeno da demanda dos consumidores cumpre a cada eleitor exigir do seu candidato a assinatura da plataforma e o seu cumprimento se eleito prefeito. Cumpre a nós, desde já, posicionarmo-nos como corpo uniforme, consciente, direcionado e legítimo para pleitear direitos, não para um ou dois, mas para toda a sociedade.