Caruaru é conhecido como o município que sedia o "maior e melhor São João do mundo".
A história do São João na cidade começa ali por volta do ano de 1854, com festas simples organizadas por famílias da zona rural para homenagear São João Batista, santo de devoção católica e figura central das festividades juninas em todo o Brasil.
E como a gente já contou nesse material sobre culinária sertaneja, o milho é um alimento da safra de junho e a boa fartura da colheita era motivo de festa!
Mas foi na década de 70 que a união de cerca de 35 famílias mudou efetivamente a história de Caruaru.
O casal Agripino e Tereza Pereira tiveram a ideia de decorar a própria rua e convidaram outras famílias para comemorar o São João.
O que era uma reunião entre vizinhos em torno de fogueiras, quadrilhas e comidas típicas, foi tomando proporções maiores, impulsionado pela força da cultura nordestina e pela musicalidade do forró.
As mulheres se reuniam numa determinada casa, ou cada uma fazia parte da comida, as crianças ajudavam na decoração da palhoça.
Alguns colocavam um som mecânico, uma radiola, e quem tinha mais condições contratava um trio de forró ou uma banda de pífanos.
A festa foi crescendo, recebendo gente de todo o Brasil e em 1993 a Prefeitura de Caruaru fez um acordo com a população para organizar o festejo.
E a cidade é reconhecida por promover uma das maiores festas juninas do mundo, mantendo acesa a chama de tradições que atravessam gerações.
Quem visita o São João de Caruaru vê muitas marcas patrocinando o evento.
A festa ainda preserva uma identidade cultural forte, mas é importante se perguntar: qual o interesse dessas empresas em apoiar um festejo popular?
Mais do que divulgação, há uma tentativa de se associar ao sentimento de pertencimento que a festa desperta.
Por isso, é fundamental refletirmos sobre a importância de manter as tradições e o protagonismo das expressões locais.
São elas que formam a base da identidade regional, e é preciso cuidado para que o investimento de grandes empresas não padronize e distancie a cultura popular de seu povo.
Mas, para além dos grandes shows e do centro da cidade enfeitado, há um pedaço de Caruaru onde o São João tem um sabor ainda mais afetivo e comunitário: o bairro do Alto do Moura.
Conhecido por ser berço de mestres do barro, como os célebres artesãos Mestre Vitalino e Luiz Galdino, o Alto do Moura também abriga uma das manifestações mais singulares da festa junina: o Festival das Comidas Gigantes.
A tradição nasceu em 1999, na rua Mestre Tota, pelo desejo coletivo de valorizar as raízes locais e reunir os moradores em torno daquilo que mais representa o espírito de comunidade: o alimento.
Populares se reuniram e criaram a Festa da Pamonha Gigante para animar o São João da rua. A princípio, a pamonha gigante começou com 50 kg e já chegou perto dos 250 kg.
Desde então, famílias e vizinhos se organizam para preparar versões gigantes de outros pratos típicos da culinária nordestina.
Nada ali é feito por vaidade ou competição — tudo é pensado para partilhar, celebrar e afirmar uma identidade comum.
Durante o festival, ruas inteiras do bairro se transformam em salões a céu aberto, onde são expostos: pamonha de metro, pé de moleque gigante, maçãs do amor, xerém com galinha, cuscuz, canjica, mungunzá, milho cozido, caldo de macaxeira, entre tantos outros alimentos em grandes proporções, simbolizando a fartura e a união.
O público espera ansioso pelo momento de provar as iguarias, que são preparadas coletivamente, com ingredientes produzidos na própria região ou adquiridos em feiras locais.
Se a gente pensar bem, o tamanho gigante é apenas um detalhe visual — o que importa, de fato, é o gesto de oferecer, partilhar, cuidar do outro por meio da comida.
O Festival das Comidas Gigantes não é apenas um evento gastronômico, mas uma verdadeira celebração da cultura alimentar do Nordeste e até possui um dia no calendário de Caruaru.
Todo dia 22 de maio é comemorado o Dia Municipal das Comidas Gigantes.
Ali no Festival, o alimento cumpre seu papel mais antigo e essencial: reunir pessoas em torno de uma mesa, ainda que improvisada na rua, e afirmar que comer junto é um ato de pertencimento.
Em cada colherada, há um pouco da história de Caruaru, da luta da agricultura familiar, da criatividade das cozinheiras e da alegria contagiante do povo que sabe celebrar a vida.
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