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Está na pauta do STJ (Superior Tribunal de Justiça) desta quinta (16) um julgamento decisivo para os 48 milhões de usuários de planos de saúde no Brasil. Os ministros devem determinar se as operadoras de planos de saúde podem limitar a cobertura de seus contratos aos tratamentos elencados no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS (Agência de Saúde Suplementar).
Essa lista, cujo processo de atualização está sendo revisto, mas que é defasada por natureza, sempre foi entendida pelo Poder Judiciário como uma referência mínima, jamais exaustiva, das obrigações das operadoras junto aos consumidores. Por conta de uma divergência aberta pela 4ª Turma em 2019, o tema volta agora ao centro do debate.
Apoiadas em argumentos estritamente financeiros, as empresas sustentam que a cobertura de tratamentos não elencados no rol coloca o mercado de saúde suplementar em grave risco e, em último caso, recai na conta do próprio consumidor. O velho terrorismo econômico que nunca se verificou na prática. Desde a promulgação da Lei de Planos de Saúde, em 1998, os tribunais deram decisões reiteradas sobre a natureza exemplificativa do rol sem que isso representasse qualquer ameaça ao mercado. As operadoras seguem, aliás, exibindo orgulhosamente seus resultados positivos nos jornais.
Na outra ponta, consumidores cada vez mais pressionados pela crise sanitária e econômica são diariamente surpreendidos com a prática sistemática e generalizada de negativa de cobertura. Nos momentos de maior necessidade, mesmo honrando os boletos todos os meses, vêem-se na dramática situação de ter de bancar com recursos próprios os tratamentos indicados pelos médicos.
Até 2019, estes usuários podiam contar de maneira inabalável com a proteção do Judiciário e da Lei de Planos de Saúde, que não deixa espaço para dúvidas ao determinar tratamento para todas as doenças incluídas na CID (Classificação Internacional de Doenças) da Organização Mundial de Saúde. A Lei também já indica quais são as tecnologias e eventos já excluídos da cobertura - como é o caso de tratamentos experimentais ou procedimentos meramente estéticos. Essa segurança ruiu e, agora, abre-se a possibilidade de que o dever de cuidar se transforme em direito de negar.
Ao contrário do que as operadoras tentam impor, não se trata de uma discussão terminológica sobre a natureza do rol, mas da preservação dos princípios que fundamentaram a regulação do mercado de saúde suplementar no Brasil.
Aliás, casos envolvendo acesso a medicamentos no âmbito do SUS e na saúde suplementar que já foram discutidos pelo próprio STJ dão pistas de como é possível enfrentar o tema sem necessariamente chancelar os abusos das empresas. Um exemplo é a imposição de requisitos claros e razoáveis para concessão de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS - como é o caso da comprovação da necessidade do medicamento ou da incapacidade financeira de arcar com o tratamento.
Esse tipo de exigência não afeta a natureza do rol e, mais importante, dá aos consumidores transparência e segurança no momento de exigir seus direitos frente a operadoras acostumadas a dizer não.