separador
Atualizado:
A energia solar hoje já é uma realidade no Brasil. Milhares de pessoas em todo o País contam com sistemas para utilizar a fonte limpa e renovável para abastecer sua própria casa ou negócio, o que é chamado de Geração Distribuída (GD). O problema é que as mesmas regras que viabilizaram esse avanço da participação da fonte têm resultado em pressão sobre as contas de luz dos demais consumidores, daqueles que não utilizam a GD. Por isso, é preciso modificar a legislação do setor de modo que quem usa sistemas de geração distribuída pague a totalidade dos custos relativos à sua operação. Confira a seguir quais são exatamente os problemas.
1. Por que o atual modelo prejudica os consumidores não adotantes de painéis fotovoltaicos?
A conta de energia elétrica é formada basicamente pelos custos de transmissão, distribuição, encargos setoriais, perdas, custo da energia e impostos. Mas, no caso do consumidor que tem dinheiro para instalar um painel solar em sua residência ou comércio, a conta se limita a uma tarifa mínima de disponibilidade da rede elétrica. O problema é que essa tarifa não cobre a totalidade dos custos que sua instalação demanda do sistema, que depende da rede nos momentos em que não há geração de energia suficiente para todo o seu consumo. Segundo cálculos da Aneel, esse subsídio cruzado somará R$ 55 bilhões entre 2020 e 2035, dinheiro que será cobrado principalmente das famílias mais pobres, via conta de luz.
2. Quem é o principal prejudicado nesse processo?
Os incentivos atualmente concedidos aos adotantes da GD causam impactos sobre as tarifas de todos os demais consumidores. Mas esse impacto é mais significativo sobre as famílias mais pobres, uma vez que a conta de luz impacta seu orçamento, em média, cinco vezes mais do que o das famílias mais ricas.
3. Mas a GD não gera empregos, impostos e reduz o impacto ambiental do setor elétrico?
A arrecadação adicional de impostos não compensa os custos pagos por quem não pode ter GD em casa.
A energia solar realmente ajuda a evitar o acionamento de térmicas a combustíveis fósseis, reduzindo a emissão de poluentes. Mas esse mesmo benefício pode ser obtido de maneira muito mais econômica por meio da energia solar e eólica comprada nos leilões de energia organizados pelo governo, cujo custo é cerca de três ou quatro vezes menor do que o dos painéis solares instalados diretamente por consumidores.
A geração de empregos também merece ser celebrada. Mas é preciso considerar que o aumento da tarifa dos não optantes pela GD impacta os custos de todos os demais consumidores. Resultado? Um ciclo vicioso perverso, em que empresas pagam energia mais cara e geram menos empregos. Mais, consumidores residenciais gastam mais com energia, consomem menos e prejudicam as empresas, o que também tem impacto na geração de empregos.
4. Pesquisa do Ibope Inteligência revelou que 9 em cada 10 brasileiros querem gerar a própria energia renovável em casa. Portanto, mudar as regras da GD não vai contra os interesses da maior parte da sociedade?
O interesse é legítimo, mas a mesma pesquisa também revela que 3 em cada 5 brasileiros não estão dispostos a pagar mais caro na conta de luz para beneficiar quem instalou painéis solares em residências ou empresas, como bancos, telefônicas e redes varejistas. 57% das pessoas acham injusta a cobrança extra na conta de luz. Portanto, os resultados da pesquisa precisam ser mais bem avaliados, uma vez que sugerem desconhecimento, pela população, dos reais efeitos da GD.
5. O custo das placas solares caiu mais de 80% nos últimos anos e hoje a energia solar já está presente em diversas comunidades pobres. Esses não são sinais de que, assim como o celular, todos os brasileiros poderão ter acesso à energia solar?
A presença de projetos de GD entre as famílias mais pobres ainda é uma exceção. Atualmente, quem realmente tem condição de colocar painel solar em casa são consumidores de alta renda. Estudo do Idec mostra que 31% da potência instalada em São Paulo está localizada nas regiões mais ricas da cidade, enquanto apenas 4% está nas regiões mais pobres. No caso de Belo Horizonte, a discrepância é ainda mais acentuada, com 42% da potência em bairros ricos e menos de 1% nos de baixa renda. Quanto aos projetos empresariais, 20% da potência instalada por pessoas jurídicas (ou 10% de toda a capacidade de GD instalada no país) pertence a empresas com capital social superior a R$ 100 milhões.
6. Consumidores sem condições de instalar os próprios painéis fotovoltaicos podem comprar energia solar gerada em fazendas solares, normalmente com descontos em relação às tarifas convencionais. Esse modelo não é positivo, uma vez que democratiza o acesso dos consumidores à energia limpa e reduz seus custos?
A análise de projetos desse tipo mostra que, na prática, os detentores das fazendas solares capturam boa parte dos benefícios da GD, concedendo descontos mínimos aos consumidores e obtendo lucros elevados. Isso pode ser evidenciado pela constatação da enorme quantidade de empresas de GD que são alvo de investimentos por fundos de investimentos, interessados nas altas taxas de retorno geradas às custas de um incentivo prejudicial aos consumidores de menor renda. A GD virou um negócio altamente rentável e isso é mais um motivo para a revisão das regras atuais.