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Começou a tramitar no Senado o Projeto de Lei 3292/20, que altera o marco legal do Pnae (Programa Nacional de Alimentação Escolar) de forma preocupante. O PL impõe a obrigatoriedade da compra de leite fluido (líquido), desconsiderando a autonomia das secretarias estaduais e municipais, bem como do profissional nutricionista na elaboração dos cardápios das escolas de acordo com as necessidades locais. O projeto foi aprovado pela Câmara dos Deputados em 6 de maio, após um acordo entre os líderes colocá-lo em regime de urgência.
Para o Idec, a proposta é um grave ataque a um dos programas mais antigos e mais importantes do Brasil. “O Pnae é um programa da educação e tem papel fundamental na garantia da alimentação saudável, segurança alimentar e nutricional dos estudantes, ao mesmo tempo em que estimula o desenvolvimento de arranjos produtivos locais, garantindo a compra de alimentos produzidos localmente pela agricultura familiar, com prioridade para comunidades indígenas e quilombolas”, afirma Patrícia Gentil, consultora técnica do Idec.
De autoria do deputado Vitor Hugo, o projeto impõe cota para a compra de leite em forma fluida no valor de 40% do total de verbas destinadas à compra de leite pelo FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), gestor do programa em parceria com os órgãos estaduais e municipais. Ao mesmo tempo, retira a prioridade de aquisição de produtos concedida às comunidades tradicionais indígenas e de remanescentes de quilombo.
As alterações aprovadas na Câmara afetam duas das principais diretrizes do Pnae. Ao retirar a prioridade de compras de produtos oriundos de comunidades indígenas e de remanescentes de quilombos, faz com que o programa deixe de funcionar como uma política pública que apoia o desenvolvimento sustentável, fragilizando grupos historicamente vulnerabilizados que dependem das políticas públicas para garantia da segurança alimentar e nutricional.
Além disso, ataca diretamente a prerrogativa de decisão de compra no nível local, por profissional competente, ao impor cota para produto determinado. As compras locais, além de atenderem a uma premissa de desenvolvimento econômico regional, respondem a uma necessidade de adequação da alimentação escolar aos hábitos e culturas locais. “No caso do leite fluido, especificamente, a proposta desconsidera que muitas escolas e mesmo municípios não têm condições logística e de infraestrutura para armazenar o produto com segurança sanitária” explica Gentil.
O Idec alerta, ainda, que esta mudança pode abrir espaço para outros diversos projetos que há anos circulam pelo Congresso Nacional, tentando impor regras e cotas de compras de produtos específicos. “O PNAE não pode servir para interesses de mercado definindo a obrigatoriedade de determinados alimentos. O Programa tem lei e regulamentos que orientam a compra de alimentos com base nas diretrizes oficiais de alimentação saudável, como o Guia Alimentar da População Brasileira, tornando-o flexível para se adaptar às diferentes realidades das escolas e das regiões”, comenta a consultora do Instituto.
Ao lado de seus parceiros, o Idec seguirá monitorando a tramitação do PL e atuando junto aos senadores, alertando para os riscos de descaracterização de um importante programa de segurança alimentar justamente quando o Brasil volta a figurar no mapa da fome.