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Brasil, hora de reverter a trajetória de pária ambiental

Vale lembrar que o País enfrenta inúmeros desafios ambientais, sendo o principal deles o desmatamento acelerado da Amazônia

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Atualizado: 

22/04/2021
Clauber Leite

Artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, em 22/04/2021

Os resultados da eleição presidencial dos Estados Unidos mudaram o status político da questão ambiental e escancararam o descompasso de nações como o Brasil em relação à nova realidade. Logo após assumir a presidência, Joe Biden pôs seu país de volta no Acordo de Paris. Poucos dias depois, baixou uma série de medidas de enfrentamento das mudanças climáticas. Entre elas, uma instrução em favor da ratificação da Emenda de Kigali ao Protocolo de Montreal.

Por aqui, a Câmara dos Deputados aguarda há mais de um ano para votar a mesma ratificação, que já passou pela análise de diversas comissões internas e parou na mesa do ex-presidente da Casa Rodrigo Maia.

A adesão de ambos os países estabelecerá cronogramas de redução gradual no consumo de hidrofluorcarbonetos (HFCs), poderosos agentes de efeito estufa. Seu principal uso, para o qual já há alternativas menos danosas ao meio ambiente, é como fluido refrigerante em condicionadores de ar e refrigeradores.

No caso do Brasil, além do impacto climático, a morosidade parlamentar custa mais de US$ 100 milhões, que estão à disposição da indústria brasileira para atualização tecnológica. A verba é parte dos recursos do Fundo Multilateral para Implementação do Protocolo de Montreal em países em desenvolvimento. Seu destino seria a inovação, com a adaptação de processos produtivos em favor de sistemas de refrigeração com uso reduzido de gases HFCs.

A ratificação da emenda também alinharia a indústria brasileira às tendências do mercado internacional, aumentando nossa competitividade e colocando o País na rota da inovação. Um dos gases do tipo HFCs mais utilizados atualmente como fluido refrigerante de aparelhos de ar-condicionado no País, o R-410A, tem potencial de aquecimento global (GWP, na sigla em inglês) duas mil vezes maior do que o do dióxido de carbono.

É direito do consumidor brasileiro receber o que existe de mais moderno em termos de tecnologia e de proteção ao meio ambiente. E é dever da nossa indústria se adequar a parâmetros internacionais de excelência. Por que devemos aceitar menos do que o melhor? A busca por um parque industrial mais avançado trará, além da proteção ao meio ambiente, benefícios para o bolso do consumidor. Afinal, equipamentos com tecnologia mais avançada oferecem, em geral, maior eficiência energética e o resultado aparece em contas de luz mais enxutas. Os recursos do Fundo Multilateral podem contribuir para que essa importante evolução não resulte em custos extras para os consumidores.

Trazer a questão para a pauta também será uma maneira de o Congresso dar uma sinalização positiva aos investidores internacionais sobre seu compromisso com uma economia de baixo carbono. Mais, ao alinhar o perfil brasileiro às medidas globais, a Emenda de Kigali impede que o País se torne destino de tecnologias ultrapassadas – uma espécie de “patinho feio” que recebe aparelhos obsoletos do Primeiro Mundo.

Por fim, vale lembrar que o Brasil enfrenta inúmeros desafios ambientais, sendo o principal deles o desmatamento acelerado da Amazônia.

Portanto, o novo presidente da Câmara, Arthur Lira, tem na Emenda de Kigali um instrumento simples para minimamente indicar se o País também pretende iniciar a reversão do descaso em relação ao meio ambiente e seguir numa trajetória em linha com a da maior economia do mundo. Antes que seja tarde.

*Clauber Leite é coordenador do Programa de Energia e Sustentabilidade do Idec