<div>
Iniciativa ventilada por Temer fere o Código de Defesa do Consumidor. Outra proposta, de adesão automática ao cadastro positivo, viola a privacidade dos consumidores</div>
separador
19/12/2016
Atualizado:
19/12/2016
O presidente Michel Temer anunciou na quinta-feira (15) uma série de propostas com o suposto objetivo de reaquecer a economia, mas que violam frontalmente os direitos do consumidor. Uma delas é permitir a adoção de preços diferenciados de acordo com o meio de pagamento - dinheiro ou cartão.
A ideia foi apresentada como a possibilidade de oferecer “desconto” para pagamento à vista no cartão de crédito. Mas a proposta tem uma série de pontos confusos e contraditórios. Hoje, não é proibido oferecer desconto; o que não pode é cobrar a mais do cliente que opta por pagar com cartão.
A diferenciação de preço para pagamento com cartão de crédito é ilegal, segundo o artigo 39, V do Código de Defesa do Consumidor (CDC), pois exigi do consumidor vantagem manifestamente excessiva. Cobrar mais caro de quem paga com cartão transfere para o cleinte os custos operacionais da transação, que são de responsabilidade do estabelecimento comercial.
“Essas despesas já são consideradas na definição do preço do produto ou serviço pelo lojista. Além disso, para o comerciante, dar a opção de pagamento com o cartão é uma estratégia para atrair mais clientes. Portanto, os custos são inerentes à sua atividade comercial”, ressalta Ione Amorim, economista do Idec.
Outro ponto bastante questionável do discurso de Temer a favor dessa iniciativa é que ela poderia impactar na redução de juros. “Ao alegar que os juros poderão baixar pela adoção do preço diferente, o governo reconhece que o consumidor já os paga sistematicamente nas compras parceladas, mas anunciadas como ‘sem juros’”, critica Amorim.
Segundo anunciado por Temer, essa e outras propostas serão apresentadas por meio de Medida Provisória - um ato legislativo que deveria ser utilizado apenas em casos de emergência, pois as regras começam a valer imediatamente após sua publicação de forma temporária, até serem avaliadas pelo Congresso.
Retrocesso no cadastro positivo
Outra medida anunciada pelo presidente foi a adesão automática ao cadastro positivo pelos consumidores que adquirirem qualquer tipo de crédito.
Aprovado em 2012, o cadastro positivo é um banco de dados com informações financeiras dos consumidores, criado com o suposto objetivo de ser de oferecer taxas de juros mais justas ao “bom pagador” - o que não aconteceu até hoje.
Desde que foi criado, a adesão ao cadastro depende de autorização expressa do consumidor, garantindo seu direito de escolha.
No entanto, a proposta de Temer é acabar com essa regra. Ele propõe que, ao abrir um crédito (fazer um empréstimo ou solicitar um cartão ao banco, por exemplo), o consumidor seja automaticamente incluído no cadastro. Se desejar, o cliente deve pedir para ser excluído.
Para o Idec, a iniciativa representa um forte retrocesso aos direitos garantidos por lei e viola a privacidade dos cidadãos. “Muitos consumidores compulsoriamente incluídos no cadastro teriam seu sigilo bancário exposto sem ter sequer conhecimento do assunto”, prevê.
Outra crítica é que os usuários estariam ainda mais sujeitos à abordagem de publicidade ostensiva e à oferta de crédito sem critério. “Isso já acontece atualmente e se intensificaria com o acesso irrestrito ao histórico financeiro das pessoas”, alerta Amorim.