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Idec quer barrar mudanças nos termos de uso do Whatsapp

Política já é objeto de investigação sigilosa na Senacon; aplicativo diz atender à lei de proteção de dados

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Folha de S. Paulo

Atualizado: 

12/04/2021
Foto: iStock
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Reportagem da Folha de S. Paulo, publicada em 07/04/2021

O Idec (Instituto de Defesa do Consumidor) enviou ao Ministério da Justiça e à ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados) um documento de 20 páginas em que pede a suspensão da mudança dos termos de uso do aplicativo WhatsApp, prevista para 15 de maio. 

A política já é objeto de investigação sigilosa na Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor), da Justiça, e a ação do Idec será considerada, de acordo com a pasta.

Na notificação, o instituto requer que as autoridades determinem ao WhatsApp “que se abstenha de limitar envio e leitura de mensagens” dos usuários que rejeitem os novos termos de uso.

Solicita, ainda, que o aplicativo não repasse dados a outras empresas do grupo econômico Facebook, do qual pertence, para fins de publicidade, marketing e analytics e de melhoria do produto.

Desde 2016, Instagram e Facebook recebem dados de WhatsApp dos usuários —os chamados metadados, que nada têm a ver com o conteúdo de mensagens. São exemplos o tipo de aparelho celular, a frequência de uso do app por cada pessoa, o nome dos grupos aos quais pertence, o nome, entre outros.

Esses dados agregados a outros rastros deixados no Facebook e no Instagram ajudam a formar perfis detalhados sobre as pessoas, o que facilita a segmentação de anúncio publicitário (modelo de base de Instagram e Facebook).

A política de compartilhamento entre as três plataformas voltou ao debate porque, agora, quem não compactuar com os termos do WhatsApp não poderá mais usar o aplicativo. A mudança é global e, no Brasil, acontece após o Banco Central autorizar que os usuários façam transferências bancárias por meio do WhatsApp. Dessa maneira, quem não consentir, fica também fora desse tipo de transação.

O prazo final para a aceitação desses termos era fevereiro, mas depois de repercussão negativa, gerada por reações de entidades civis, o aplicativo adiou a política para 15 de maio, e ampliou os esclarecimentos sobre as mudanças.

O Idec menciona que o compartilhamento foi instaurado quando o Brasil ainda não dispunha de uma lei de proteção de dados. Em 2021, o cenário é outro. A legislação tem 10 bases legais, como legítimo interesse e consentimento, que devem justificar a finalidade da coleta de dados e requerer autorização das pessoas

Para a instituição, pela lei, o Facebook deveria apresentar identificação específica do interesse legítimo para compartilhar dados do WhatsApp com Facebook e Instagram, demonstrar que o compartilhamento é estritamente necessário para atingir uma finalidade legítima, além de equilibrar interesses, direitos e liberdade do titular dos dados, no caso usuários de WhatsApp.

"Não está clara a base que explica o compartilhamento de dados entre as empresas. É para melhorar algoritmo do Instagram? É para fins de segurança do usuário? Eles citam que coletam dados como IP, de conexão, mas não são tão explícitos sobre quais dados compartilham entre as empresas", diz a advogada Juliana Oms, uma das autoras do documento.

As alterações nos termos da empresa se referem, principalmente, a explicações sobre os tratamentos de dados já realizados e informação sobre coleta e compartilhamento de dados provenientes de serviços que não existiam anteriormente, como o Facebook Pay, programa de pagamentos.

Outro ponto, considerado o mais crítico pelos advogados, é a oferta do serviço Facebook Inc., que dará possibilidade de o Facebook gerenciar a comunicação do WhatsApp Business.

O Business é a versão comercial do aplicativo, em que marcas conversam com consumidores de forma automatizada ou não. O Facebook vai oferecer um serviço para gerenciar essas conversas, como se fosse um terceirizado de telemarketing de uma empresa tradicional.

"Suponha que uma loja como a Americanas contrate o Facebook [para gerenciar as contas comerciais]. O Facebook passa a ler a conversa do WhatsApp. Isso ainda não foi anunciado, mas precisamos de um compromisso claro do que será feito com essas conversas", acrescenta Juliana.

O Facebook não deve usar isso para motivações próprias, segundo envolvidos na implementação. O grupo também não passará a realizar anúncios no mensageiro.

Quando o Facebook comprou o WhatsApp, em 2014, Mark Zuckerberg, já pressionado por questões de antitruste, afirmou a alguns reguladores que não mudaria o modelo de negócios da plataforma de conversas. No mensageiro, o usuário não é considerado um produto, como é no Facebook e no Instagram —onde entram gratuitamente mas têm os dados pessoais usados para fins publicitários.

Pesquisadores que acompanham o assunto criticam que, quando essa política de compartilhamento é alterada, à medida que o aplicativo ganha uma escala de dominância no Brasil (com quase 100% de smartphones com o app instalado), há uma quebra de expectativa e um aspecto de concorrência a ser considerado.

Entidades de proteção de dados defendem modelos de controle de privacidade granulares, em que a pessoa tem opções de configuração sobre o que pode ou não ser coletado. Em aplicativos como Uber, no Google ou mesmo no Facebook, é possível dizer sim a algumas coletas e não a outras.

Na opinião do Idec, o novo modelo do WhatsApp é um "consentimento forçado", no estilo "aceite tudo ou vá embora", o que se torna agressivo diante da adesão de brasileiros à plataforma, incorporada à rotina de trabalho e de comunicações de mais de 120 milhões de brasileiros.

"É preciso mais discussão pública e transparência. O debate em 2021 não pode ter a política de 2016 no centro, agora temos a LGPD. A questão é qual nosso poder sobre os dados e como vamos reforçar nossa capacidade de controle dos dados", afirma o professor Bruno Bioni, fundador do Data Privacy Brasil.

Autoridades de outros países estão se opondo às mudanças desde 2016. Na Itália e na Espanha, o Facebook já foi multado por induzir os usuários do WhatsApp a aceitar integralmente os novos termos de uso. Índia e Turquia também brigam contra o compartilhamento.

OUTRO LADO

Em nota, o WhatsApp diz que está à disposição para prestar os esclarecimentos necessários às autoridades competentes e reforça que atende às legislações de proteção de dados aplicáveis, incluindo a LGPD no Brasil.

"É importante ressaltar que a atualização anunciada em janeiro de 2021 não amplia a capacidade do WhatsApp compartilhar dados com o Facebook, que já existia e estava prevista desde 2016, e não impacta como as pessoas se comunicam de forma privada com seus amigos e familiares em qualquer lugar do mundo. O WhatsApp permanece totalmente comprometido com a proteção da privacidade das pessoas”, afirma.