No intervalo de uma semana, duas agências reguladoras – a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) e a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) – anunciaram medidas inusuais contra a má qualidade dos serviços prestados por empresas sob sua fiscalização.
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30/07/2012
Atualizado:
30/07/2012
Fulvio Giannella Jr. e Carlos Thadeu C. de Oliveira
No âmbito da ANS, estão suspensas, desde 13 de julho, as vendas de 268 planos de saúde de 37 operadoras; enquanto a Anatel proibiu temporariamente a comercialização de chips da TIM, Claro e Oi, três das quatro maiores operadoras de telefonia móvel do país. A medida entrou em vigor no dia 23 de julho e, segundo a própria Anatel, perdurará até que essas empresas apresentem, em 30 dias, um plano de investimento para os próximos dois anos, com metas para resolver problemas na qualidade dos serviços prestados aos consumidores. Já os planos de saúde tiveram suspensas suas vendas por descumprimento de prazos estabelecidos pela própria ANS para atendimento médico e realização de exames e internações – a decisão será reavaliada daqui a três meses. Se o número de reclamações diminuir, a suspensão será revogada; caso contrário, será mantida.
O Idec vê de forma positiva essas decisões. Na verdade, há muito tempo tais problemas vêm sendo denunciados pelos usuários desses serviços sem que nenhuma medida mais dura tivesse sido tomada pelas agências reguladoras. Estas se limitavam até então a lavrar multas, que muitas vezes não eram pagas. Ao exigir das empresas uma garantia efetiva na melhoria de seus serviços, e suspendendo sua comercialização, a ANS e a Anatel sinalizam que não basta zelar pelo controle e equilíbrio econômico-financeiro do mercado que está sob sua responsabilidade reguladora, mas é preciso defender efetivamente o direito dos consumidores, elo mais fraco da relação de consumo. As agências tocam no âmago dos negócios dessas empresas, que é a expansão de oferta, nem sempre acompanhada pela expansão dos investimentos e melhoria da qualidade dos serviços.
Até agora as agências reguladoras deixavam a cargo das entidades que compõem o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor a função primordial de exigir alguma forma de punição e o cumprimento efetivo das disposições contidas no CDC (Código de Defesa do Consumidor) por parte dos fornecedores de produtos e serviços. As ações mais drásticas tomadas pela ANS e pela Anatel contra empresas que desrespeitam o consumidor, colocando seu lucro acima de qualquer compromisso com a qualidade dos produtos e serviços ofertados no mercado, podem representar um ponto de inflexão importante em direção à compreensão de que todo mercado precisa ser disciplinado dentro de parâmetros éticos aos quais qualquer interesse econômico precisa estar submetido.
Espera-se que outras agências sigam o mesmo caminho. Ainda mais porque as medidas tomadas pela ANS e pela Anatel dão mostras claras de que ainda convivemos com um mercado rebelde a qualquer tipo de controle e fiscalização, no qual muitas empresas sentem-se à vontade para praticar todo tipo de abuso em detrimento dos consumidores. E esse tipo de postura poderia se agravar ainda mais no momento em que um novo contingente significativo de consumidores está chegando ao mercado, impulsionado por uma demanda reprimida por produtos e serviços e desconhecendo quase por completo seus direitos.
Se até agora o ônus da resolução de problemas de consumo recaía diretamente apenas sobre os consumidores e sobre o Estado; agora, ele começa a pesar no bolso das empresas, de imediato.
O que se espera diante desse novo quadro é que a ANS e a Anatel mantenham uma postura firme nas exigências feitas e no acompanhamento da implementação dos planos de reestruturação e investimento que devem ser levados a cabo pelas empresas desses setores, estabelecendo sanções efetivas em caso de descumprimento. Porque o enfrentamento de conflitos de consumo passa não só pela punição após o dano ao consumidor, mas pela prevenção e antecipação a potenciais novos problemas.