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Essa parece ser a receita da ANS para tentar “reativar” a ínfima oferta de planos de saúde individuais

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Atualizado: 

14/05/2015
Carlos Thadeu de Oliveira, gerente técnico do Idec e Joana Indjaian Cruz, advogada e pesquisadora do Idec
Atualmente, a regulação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para planos de saúde individuais/familiares (pessoa física contratante) é diferente da regulação dos planos coletivos (pessoa jurídica contratante: empresas, associações e sindicatos). Pode-se dizer que, somente os primeiros, são integralmente regulados pela ANS, pois apenas para eles a agência reguladora limita valores de reajustes de mensalidades e proíbe o cancelamento unilateral do contrato pela operadora. Já para os planos coletivos, a ANS permite que as operadoras reajustem o quanto quiserem e cancelem o contrato quando bem entenderem. Obviamente, a regulação dos planos individuais é bem mais fiel aos direitos do consumidor, enquanto a dos coletivos passa por cima desses direitos, agradando (em muito) as operadoras de planos de saúde.
 
As consequências da omissão regulatória da ANS já são conhecidas: hoje, apenas 20% dos planos são individuais e 80% coletivos. Mesmo que o consumidor queira ser cauteloso e contratar um plano com limitação de reajustes e cancelamento de contrato, é difícil encontrar operadoras que ainda ofertem planos individuais. Assim temos enxurradas de ações judiciais de consumidores buscando seus direitos contra reajustes abusivos e cancelamentos de contratos. Felizmente, o Poder Judiciário tende a aplicar o Código de Defesa do Consumidor e a julgar em favor dos consumidores.
 
Por conta desse cenário, o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) historicamente pleiteia que a ANS pare de passar por cima dos direitos dos consumidores de planos coletivos. Para tanto, deve fixar o valor teto dos reajustes de planos coletivos e proibir seu cancelamento unilateral, assim como faz para planos individuais. Essas medidas não somente trariam mais efetividade aos direitos dos consumidores, mas também diminuiriam a procura pelo Poder Judiciário e resolveriam a questão da baixa oferta de planos individuais.
 
Recentemente, dois grandes veículos de comunicação noticiaram que a ANS pretende criar medidas para fomentar a oferta de planos de saúde individuais/familiares. Entretanto, as medidas propostas representam um verdadeiro retrocesso na agenda da defesa do consumidor de planos de saúde. Segundo as notícias, ao invés de cumprir seu papel social e regular os reajustes e cancelamentos dos 80% do mercado, a ANS passará a deixar de fixar os reajustes e passará a permitir o cancelamento dos contratos individuais. Além disso, foi mencionada a redução do número de exames nos planos de saúde. Em seu site, a ANS divulgou uma nota dizendo que tal medida não se aplicaria aos direitos e contratos adquiridos, dando a entender que valeria para novos planos individuais. 
 
Ora, de que serve poder contratar um plano individual que tem as desvantagens de planos coletivos? O consumidor que procura planos individuais – e que com grande dificuldade consegue encontrá-los – o faz justamente para poder ter maior proteção de seus direitos, com reajustes limitados e proibição de cancelamento de contrato pela operadora. A proposta de oferta de planos individuais sem essas características pode ser resumida da seguinte forma: planos com as desvantagens dos contratos coletivos serão vendidos, sob o nome de individuais. Isso é, basicamente, vender gato por lebre para a população que cobra há tempos uma resposta da ANS aos seus problemas com planos de saúde. 
 
Se o mercado de planos de saúde individuais/familiares está minguando, a solução não é acabar com seus diferenciais, sobretudo, quando sabemos que esses diferenciais são exatamente o que os fazem melhores que os planos coletivos para os consumidores. O caminho não seria o contrário, isto é, regular mais fortemente os planos coletivos?
 
É preciso deixar claro: esta realidade da total ausência de regulação dos reajustes prejudica a todos, inclusive as empresas que contratam os planos coletivos, pois ao término de um ano se veem obrigadas a engolir reajustes absurdos impostos pelas operadoras ou mudar de operadoras, trazendo um custo administrativo extraordinário e inconvenientes a todos seus funcionários.
 
Devemos participar ativamente das consultas públicas, audiências e outras formas de participação social que discutirão tais propostas escandalosas, de forma a cobrar que os direitos do consumidor sejam respeitados na regulação dos planos de saúde. Caso sejam aprovadas, cabe a todos nós rechaçá-las fortemente. O Idec fará isso de maneira incansável e obstinada recorrendo, se necessário for, a outras autoridades além da própria ANS. Aliás, fica no ar uma pergunta: saúde privada não é assunto do Ministério da Saúde? É só da ANS?
 

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