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09/02/2012
Atualizado:
29/09/2017
Joana Cruz
Atualmente, é de notório conhecimento o grande número de operadoras de planos de saúde que passaram a anunciar planos coletivos para pequenos grupos de consumidores, a partir de três pessoas. Trata-se de contratos firmados entre as operadoras e outras pessoas jurídicas, tais como pequenas empresas, sindicatos de trabalhadores ou associações civis. Para esse tipo de contratação, basta que a parte contratante possua um CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica).
Além do aumento da oferta dessa modalidade de planos, nota-se, ao mesmo tempo, a diminuição e extinção da oferta de planos individuais, havendo casos de operadoras que sequer disponibilizam este tipo de contratação e somente firmam contratos coletivos, seja para 3 ou para até mais de 100.000 pessoas.
Essa estratégia representa uma “falsa coletivização”, pois consumidores, sob a ilusão de pagarem mais barato em seus planos, são estimulados a ingressarem em determinada associação ou sindicato, ou a utilizarem qualquer CNPJ para conseguir um contrato coletivo. Essa foi a forma encontrada pelas empresas de planos de saúde para fugir da legislação e da fiscalização da ANS (Agência Nacional de Saúde Complementar), uma vez que os planos coletivos não precisam submeter seus reajustes anuais ao órgão e podem ser rescindidos unilateralmente pelas operadoras quando estas bem entenderem.
Os principais motivos para este tipo de comportamento das operadoras residem nos seguintes fatos:
• As operadoras possuem maior liberdade para reajustar os valores dos planos, uma vez que os reajustes em contratos coletivos não são regulados pela ANS e independem de autorização prévia da Agência (ao contrário do que ocorre no caso dos planos individuais/familiares);
• Como a legislação não proíbe expressamente a rescisão unilateral pelas operadoras nos contratos coletivos, toda vez que estes não se apresentem mais vantajosos aos interesses econômico-financeiros daquelas, o consumidor encontra-se impossibilitado de obter acesso à assistência à saúde contratada;
• Os planos coletivos não têm obrigação de cobrir doenças profissionais e acidentes do trabalho.
A situação atual é extremamente prejudicial aos consumidores de planos de saúde coletivos que, segundo dados disponibilizados pela ANS em seu último “Caderno de Informação da Saúde Suplementar”, totalizam 36.152.682 cidadãos brasileiros que contrataram serviços de assistência privada à saúde.
No caso dos falsos planos coletivos, ou seja, planos com pequeno número de consumidores, a questão é ainda mais perigosa, uma vez que trata-se de contratos com características típicas de planos individuais (por conta do pequeno número de consumidores), mas que possuem reajustes com característicos de planos coletivos. Ainda, nos contratos coletivos com até 30 consumidores é permitido às operadoras submeterem os consumidores ao cumprimento de carências para acesso a procedimentos como consultas, exames e realização de parto e cobertura parcial temporária.
Reajustes abusivos
Os reajustes (anuais e por sinistralidade) representam um dos pontos mais críticos no tocante aos direitos dos consumidores que contratam planos de saúde coletivos. No Idec (Instituto de Defesa do Consumidor), os reajustes abusivos correspondem ao segundo maior problema enfrentado por nossos associados (ficando somente atrás da negativa de coberturas).
Isso se dá, principalmente, por conta da falta de transparência na metodologia utilizada na fixação dos critérios de reajustes, juntamente com a ausência de informação prévia e adequada aos consumidores. Tanto nos contratos novos quanto nos contratos antigos (celebrados antes da vigência da Lei de Planos de Saúde – Lei 9656/98), as cláusulas referentes aos reajustes anuais frequentemente apresentam critérios vagos e dispõem sobre “custos médico-hospitalares” como fator de cálculo, o que torna impossível a efetiva ciência do consumidor sobre a forma de aumento da contraprestação pecuniária.
Esta é uma conduta ilegal à luz do CDC (Código de Defesa do Consumidor), uma vez que fere as seguintes disposições deste diploma legal: a obrigação dos fornecedores de informarem aos consumidores de forma clara sobre os preços de produtos e servidos ofertados (artigos 6 e 31 CDC); e a nulidade a abusividade de cláusulas contratuais que permitam “ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação de preço de forma unilateral” (artigo 51, X, CDC). Ainda, o artigo 16, XI, da Lei de Planos de Saúde estipula que os contratos deverão discriminar os “critérios de reajuste e revisão das contraprestações pecuniárias”.
Quanto aos reajustes por sinistralidade, estes correspondem ao aumento imposto pela empresa sob a alegação de que o número de procedimentos e atendimentos (ou “sinistros”) cobertos foi maior do que o previsto em determinado período. Esse tipo de reajuste, criação do mercado de planos de saúde, também é ilegal, porque significa uma variação de preço unilateral, que não estava prevista no contrato.
No entanto, a ANS, ao regular somente os reajustes de contratos individuais/familiares novos, impede a aplicação, no âmbito de sua atuação, dos direitos acima expressos a todos os consumidores de planos de saúde individuais/familiares antigos e coletivos. Estes últimos, atualmente, representam 77% do total de cidadãos que pagam seus planos de assistência privada à saúde. Isso porque, se os reajustes aplicados independem de autorização prévia da ANS e estão suscetíveis ao disposto nas cláusulas contratuais, que, em sua maioria, são genéricas e imprecisas, estas devem ser afastadas e consideradas nulas, pois contrariam o disposto nos artigos 6, 31 e 51, X, do CDC, bem como o artigo 16, XI, da Lei de Planos de Saúde.
A omissão de controle de reajustes de contratos coletivos pela ANS, no entendimento do Idec, não tem respaldo legal. A Agência pressupõe que nesta modalidade de contrato o poder de negociação é mais equilibrado, o que nem sempre reflete a verdade. Por isso, as operadoras se interessam tanto pelos contratos coletivos. No vácuo da legislação, as empresas de planos de saúde apenas exigem a apresentação de um número de CNPJ) para que o contrato seja coletivo. Famílias e pequenos grupos têm adquirido contratos assim, sem saber dos riscos de reajustes altos.