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A defesa do consumidor só se concretiza com participação social

O fim de um ano e a chegada de um novo é a típica época para realizarmos um balanço das conquistas, avaliarmos as dificuldades e prepararmos o espírito para novas metas. Os direitos do consumidor também merecem essa avaliação

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Atualizado: 

13/10/2017
Maria Elisa Novais
A condição de consumidor é vivida por qualquer cidadão. Não poderia ser diferente em uma economia de mercado: até direitos essenciais são pagos, direta ou indiretamente. Assim, é importante que, para o adequado exercício da cidadania, todos estejam bastante atentos às conquistas alcançadas e dificuldades enfrentadas pelos consumidores e por seus representantes na sociedade frente ao Poder Público, à Justiça e às empresas.
 
E, em 2011, a defesa do consumidor teve bastante trabalho. Como ocorre há muito tempo, os problemas dos consumidores adquirem outras facetas, mas os setores mais reclamados ainda são os mesmos. Além disso, as lutas dos consumidores se acumulam e se diversificam ao longo dos anos. 
 
No início da vigência do Código de Defesa do Consumidor, as grandes bandeiras foram garantir a qualidade de alimentos, a informação e o controle de qualidade de produtos, o cumprimento de ofertas com a entrega de produtos no prazo que deveria ser informado ao consumidor, o acesso à justiça, largamente viabilizado com a criação de Juizados Especiais Cíveis, entre outros. Hoje ainda a luta inclui muitos dos direitos citados, mas também inclui a necessidade de universalização de serviços essenciais, de informação e orientação clara e adequada sobre o crédito, sobre a melhor opção disponível, de participação social nos debates que interessam à sociedade consumerista junto às agências reguladoras, entre tantos outros. E o ano que acabou de se encerrar demonstrou que é preciso trabalhar muito no intuito de tornar tantos direitos muito mais efetivos.
 
Um claro exemplo disso é o acesso universal à banda larga. É inegável que a banda larga é um serviço indispensável à prática da cidadania e viabiliza o pleno exercício de uma série de direitos fundamentais. Em 2011, os debates sobre o Plano Nacional de Banda Larga começaram: as concessionárias assumiram o compromisso de universalizar o seu acesso até 2014. O Idec esteve atuante nesses debates, inclusive conquistando uma vaga na representação dos consumidores junto ao Comitê Gestor da Internet. A campanha “Banda Larga é um direito seu” alcançou os Trend Topics do Twitter. 
 
Não é só o serviço de banda larga que está muito aquém das expectativas do consumidor. O item mais reclamado no Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas, do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, é o celular. O problema mais reclamado é defeito. Segundo a Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações, em março do ano passado já havia mais de 210 milhões de celulares no Brasil , enquanto que o Censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE indicava uma população brasileira com quase 191 milhões de pessoas.
 
Há, na média, mais de um celular por pessoa no país. Muitos têm apenas o celular como telefone principal, não se valendo da telefonia fixa. Ficar sem o celular, para muitos, é ter impedido o direito fundamental à comunicação. Evidencia-se a essencialidade do aparelho e a necessidade de que os fabricantes melhorem, e muito, a qualidade do seu produto. Nesse sentido seguiu a campanha do Idec pela essencialidade do celular, defendendo a sua troca imediata em caso de defeito – dispensando o prazo de 30 dias para o conserto; mais de 2.500 consumidores já aderiram à campanha.
 
Outros setores não deixaram por menos. O segundo setor mais reclamado no já mencionado Cadastro Nacional de Reclamações Fundamentadas é o setor financeiro. Dispensável discorrer sobre seus abusos. Comparando novembro de 2011 e o mesmo mês em 2010, os números do Banco Central demonstram que houve um crescimento de 42,9% nas reclamações dos consumidores. Os problemas reclamados se repetem: débitos não autorizados nas contas correntes, cobrança indevida de tarifas, principalmente sobre serviços não solicitados. 
 
Em maio de 2011, o Idec fez um pesquisa sobre as tarifas bancárias e detectou que os pacotes chegaram a subir até 124%. 
 
Além disso, falta ao consumidor informação sobre o funcionamento e o risco de produtos financeiros. Todos os produtos financeiros, sem exceção, são bastante complexos e o que se observa é um grande incentivo à concessão de crédito, principalmente, para a nova classe C, um estrato social que há pouco tempo tem acesso ao crédito. E acaba por ter acesso a créditos muito caros – basta observar como o cartão de crédito se proliferou nos últimos anos, visto que de 2004 a 2011 houve um crescimento de 228% apenas no número de cartões de crédito no Brasil –, sem qualquer informação e aconselhamento sobre a sua adequada e saudável utilização. O consumidor precisa de informação. Nesse sentido, o Idec também cumprindo uma série de pesquisas sobre cartões de crédito, avaliou vários contratos e notou uma série de cláusulas abusivas com as quais o consumidor precisa estar muito atento: alteração unilateral do contrato, inclusão do nome do consumidor em órgãos de proteção ao crédito sem prévio aviso, bloqueio temporário do cartão sem aviso prévio, vencimento antecipado de débitos em caso de atraso, entre outros. 
 
O ano passado ainda vivemos a expectativa e a intensidade dos debates sobre o Cadastro Positivo. Em trabalho atuante, o Idec participou de todo o processo de discussão da legislação, inclusive pedindo expressamente o veto de dispositivos que prejudicariam os direitos à informação e à privacidade do consumidor, bem como fez campanha com a participação dos consumidores dirigida à Presidente Dilma Roussef com excelente resultado: os pedidos de veto foram integralmente aceitos. Vale lembrar: a autorização expressa do consumidor para a abertura do cadastro é imprescindível. 
 
O setor de saúde também merece atenção: desde 1º de janeiro deste ano as operadoras de planos de saúde têm limite de tempo para marcação de consultas e outros procedimentos e houve definição de regras para os contratos coletivos de planos de saúde em caso de demissão ou aposentadoria. 
 
Mais uma preocupação do consumidor é em relação à alimentação. Foi promulgada uma lei estadual que exige maior clareza na informação sobre alimentos transgênicos nos rótulos das embalagens. Essa luta é antiga: o Idec, há cinco anos, exige o aviso sobre a presença de alimentos transgênicos nos rótulos das embalagens independentemente de sua concentração. O excesso de sal em alimentos industrializados também é uma preocupação da sociedade consumerista e o Ministério da Saúde instituiu limites máximos desse componente nos alimentos.
 
Outros temas também invadem a esfera de liberdade de escolha do consumidor. Nesse diapasão está o acesso ao conhecimento: a luta para o exercício pleno do direito de escolha do consumidor ganhou destaque em 2011. A tentativa do PL Azeredo de criminalizar uma série de práticas na internet que disponibilizam de forma muito mais ampla o acesso ao conhecimento é uma delas. O Idec fez campanha incisiva para barrar o prosseguimento da aprovação do Projeto de Lei nos termos e que foi relatado. 
 
A diversificação dos problemas enfrentados pelos consumidores caracterizou-se também por intensificar os problemas com serviços: atrasos e cancelamentos de voos, falta de assistência material e informativa e práticas abusivas destacaram-se na aviação civil, exigindo da ANAC – Agência Nacional da Aviação Civil mais rigor nas punições das companhias e transparência na divulgação desses números; descumprimento da Lei de Entrega em São Paulo e problemas na prestação de serviços em sites de compras coletivas, com muitas práticas abusivas, fizeram com que elas se tornassem alvo da fiscalização do Procon em São Paulo.
 
Vale ressaltar o ponto positivo da criação da Câmara Técnica de Supermercadistas do Procon de São Paulo, da qual o Idec faz parte, que proporcionou ao consumidor segurança na venda de produtos dentro da validade. O consumidor, se encontrar algum produto fora da validade, leva outro de graça. 
 
Avaliar a qualidade dos produtos continua sendo uma bandeira da defesa do consumidor e que dá resultado: em 2010, o Idec fez um teste sobre a segurança dos ventiladores e constatou uma série de irregularidades que colocavam o consumidor em risco. A partir deste ano, os ventiladores de mesa serão comercializados com o selo do Inmetro.
 
O trabalho em 2011 foi árduo e os resultados podem e, de fato, demoram a aparecer. Muito mais do que ações, passamos por processos. Ter consciência de que se é parte fundamental desse processo é importante para o consumidor: seu direito só será respeitado se ele exigir o respeito. 
 
2012 é mais um ano para lutar por mudanças e por respeito: consumo sustentável, crédito responsável, qualidade de produtos e serviços, participação social na regulação. E hoje não basta mais exigir o respeito para si mesmo, mas exigir o fim de práticas abusivas padronizadas para todos. É preciso mobilização. Esse processo depende do envolvimento e sensibilidade da sociedade, de cada cidadão, para perceber que, por meio de representantes legítimos e sérios frente ao Poder Público, ao Poder Judiciário e às empresas, grandes metas são alcançadas. Conhecer o trabalho da sociedade civil organizada e participar é fundamental. Esse trabalho só se torna possível com participação social. 

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