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A informação adequada e clara sobre produtos é um pilar fundamental dos direitos do consumidor em qualquer parte do mundo. Do pioneiro discurso de John Kennedy em 1962 à resolução da ONU (Organização das Nações Unidas) de 1985, o direito à informação correta para permitir escolhas conscientes por parte dos consumidores se consolidou ao redor do mundo como um dever dos fornecedores que exige constante administração e vigília do Estado.
No Brasil, o poder público tem o dever constitucional e fundamental de defender os consumidores. E, seguramente, o direito à informação sobre produtos e serviços é o que historicamente mais exigiu a atuação das autoridades públicas reguladoras e fiscalizadoras.
Isso é assim porque a omissão de dados e informações nos produtos impede que consumidores exerçam as melhores escolhas para suas necessidades e ao mesmo tempo garante um poder abusivo aos fornecedores. Mesmo diante de regras estabelecidas, fabricantes foram denunciados e penalizados pelo uso de alegações e informações enganosas em rótulos.
Em praticamente todas as iniciativas que o poder público realiza para implementar melhores padrões de informações em rótulos há enorme resistência de entidades representantes do setor produtivo. Recorrem quase sempre a argumentos alarmantes, de risco de queda na produtividade, impacto nos empregos, fechamento de fábricas, com base em dados falsos e simplórios. Adotam, enfim, toda espécie de pressão para impedir a modernização das regras, como se as pessoas não devessem ser informadas e como se esse direito não existisse.
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) conduz desde 2014 um processo de discussões para a revisão das normas de rotulagem nutricional no Brasil. Durante este período, a agência ouviu diversos representantes do setor produtivo, universidades e entidades da sociedade civil organizada, como o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor). Todos puderam apresentar seus estudos e evidências científicas - e esse processo ainda está em franco desenvolvimento.
Qualquer cidadão, especialista, profissional ou interessado pôde e ainda poderá apresentar argumentos e evidências que contribuam para a elaboração de uma nova regra de rotulagem nutricional mesmo após a tomada pública de subsídios da agência.
A avaliação técnica da Anvisa, submetida à contribuição dos interessados, já concluiu que os rótulos de alimentos e bebidas precisam contar com alertas frontais que indiquem a presença de alto teor de ingredientes críticos, como sódio, açúcar e gorduras. Esse modelo de rotulagem já está em vigor no Chile e em desenvolvimento no Uruguai, Israel, Canadá, entre outros.
O modelo de alertas frontais, que setores da indústria insistem em negar, facilita a localização e a leitura das informações nutricionais, auxilia na comparação do conteúdo nutricional dos alimentos e na compreensão da qualidade nutricional dos alimentos, além de ampliar o número de consumidores capazes de usar essa informação e promover escolhas alimentares mais saudáveis.
Informar às pessoas sobre a presença de nutrientes críticos não gera riscos ou prejuízos econômicos para a indústria. Pelo contrário, gera o desenvolvimento econômico e social, porque amplia as possibilidades de escolhas alimentares mais saudáveis e promove a competividade baseada no que é melhor para os consumidores: o atendimento às suas demandas por produtos mais saudáveis.
O Idec participa dessa discussão na Anvisa desde o princípio, propondo modelos de rotulagem nutricional adequada com base nessas exigências, e concretizando sua missão de orientar, conscientizar e defender a ética nas relações de consumo, há mais de 30 anos. E não está sozinho nisso: diversos órgãos e entidades públicas e privadas, nacionais e internacionais, acompanham e apoiam essa luta, como o Ministério da Saúde, a Organização Pan-Americana da Saúde, o Instituto Nacional do Câncer, institutos de pesquisa renomados de universidades brasileiras, as entidades e pessoas que integram a Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável - todos engajados moralmente com o combate à obesidade e às doenças crônicas não transmissíveis provocadas pelo consumo de alimentos e bebidas com alto teor de ingredientes críticos.
A adoção de normas de rotulagem que garantam essa imprescindível informação é um caminho sem volta. É isso o que os cidadãos consumidores querem e o que os governos estão reconhecendo.
*Publicado originalmente em Correio Braziliense