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Nesta quarta-feira (21), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou o projeto de lei (PLS 232/2016) que expande o mercado livre de energia elétrica, permitindo que pequenos consumidores possam fazer a portabilidade da conta de luz. No dia anterior, o projeto já havia sido aprovado pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. A pauta também está em discussão na Câmara dos Deputados, onde tramita o PL 1917/2015. Os textos dos dois projetos são idênticos e, apesar de se apresentarem como propostas positivas, alguns pontos precisam ser aperfeiçoados para que se atenda plenamente aos interesses e direitos dos consumidores.
Para o Idec, ONG de Defesa do Consumidor, em ambas as propostas, duas questões precisam de maior atenção dos congressistas: a adesão automática ao pré-pagamento em caso de inadimplência sem que o consumidor tenha optado por essa modalidade; e a falta de proteção e limites nos encargos que as tarifas estão sujeitas, principalmente os relacionados à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
No sistema de pré-pagamento, o consumidor tem acesso à energia pela compra prévia de créditos. Caso tenha alguma dificuldade, pode solicitar uma cota emergencial. Se não conseguir comprar novos créditos, o serviço é suspenso. “Ou seja, o corte passa a ser um risco constante ao consumidor que, além de assumir o controle do seu gasto, também estará exposto às eventuais falhas e abusos do sistema”, explica Clauber Leite, especialista em energia do Idec.
Além disso, a inclusão na modalidade pode ocorrer por adesão ou compulsoriamente, em caso de inadimplência recorrente. Considerando os constantes aumentos de tarifa, a possibilidade de falhas no sistema e dificuldades na compra de créditos, os consumidores estão muito vulneráveis, principalmente os mais carentes. “A própria Aneel reconheceu esses riscos em consulta pública recente. A energia é um direito essencial, previsto na Constituição, e o sistema pré-pago é extremamente abusivo”, ressalta Leite. Por outro lado, há muitos benefícios para as distribuidoras com a redução dos custos operacionais (antecipação da receita, diminuição da inadimplência, ausência de impressão e entrega das faturas etc). Essa economia não é necessariamente repassada para o consumidor.
Com relação aos subsídios, o PLS propõe que, para as usinas com concessões prestes a vencer, a outorga seja licitada e os recursos decorrentes sejam direcionados para a redução de encargos, subsídios e outros custos do setor. Contudo, o projeto não propõe um limite nem um mecanismo de transparência e participação social. Assim, os consumidores só pagam, mas não influenciam em nada sobre o aproveitamento dos recursos para o “Desenvolvimento Energético”.
Recentemente, uma pesquisa do Idec revelou que grandes montantes gerados pela CDE são direcionados a atividades que não compõem o setor elétrico, beneficiando empresas sem qualquer interesse público justificável, como shoppings centers, lojas de departamento, imobiliárias, comércio de produtos farmacêuticos, organizações religiosas, cursos preparatórios, entre outros.
O Ministério de Minas Energia realizou uma Consulta Pública, em maio de 2018, com o objetivo de reduzir estruturalmente as despesas dessa conta. O relatório preliminar apresenta várias críticas a esse encargo, como as faltas de limite de gastos ou do montante a ser subsidiado; de foco e prazo para sua utilização; e de limitação à cumulatividade de subsídios.
Segundo Igor Britto, advogado do Idec, os congressistas ainda têm a oportunidade de corrigir falhas graves no PL e no PLS. “Para se ter um mercado livre de energia, é necessário que as pessoas possam fazer escolhas conscientes. Por isso, a futura lei deve garantir uma comunicação transparente, didática e constante com o consumidor sobre esse novo ambiente de contratação. Deputados e senadores precisam também refletir sobre os impactos negativos aos consumidores e incluí-los nas discussões”.