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Estudo mostra que proibir ultraprocessados nas escolas reduz obesidade infantil

Pesquisa do Idec indica que proibir ultraprocessados nas escolas promove benefícios econômicos e sociais, apesar de lobby corporativo tentar barrar projetos de lei nesse sentido

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Atualizado: 

28/11/2025

Nesta quarta-feira (26), o Instituto de Defesa de Consumidores (Idec) divulgou os resultados de um estudo desenvolvido com o pesquisador Eduardo Nilson, do Observatório Brasileiro de Hábitos Alimentares da Fiocruz e do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da USP. A pesquisa estima como adolescentes de 10 a 19 anos seriam impactados caso a venda de ultraprocessados e bebidas adoçadas fosse proibida em cantinas de escolas no Brasil.

>>> Confira aqui a pesquisa completa

Foram analisados diferentes cenários de regulação da venda de ultraprocessados nas escolas, e todos apresentaram benefícios expressivos. Quando a comercialização de ultraprocessados e bebidas adoçadas é totalmente restringida em escolas públicas e privadas, há uma redução de 25% no consumo de bebidas adoçadas e de 8% no consumo de ultraprocessados (guloseimas, salgadinhos etc.). Ao mesmo tempo, aumenta de 2% a 8% o consumo de água, sucos naturais e frutas.

Traduzidos em nutrientes, esses resultados significam até 20 calorias a menos e 4,7 gramas a menos de açúcares livres por dia, sem prejuízo para o consumo de vitaminas e minerais, o que pode levar a uma queda de até 8,9% na prevalência de obesidade infantil. 

Por que isso importa?

Dados nacionais mostram que, entre 1974 e 2009, a prevalência da obesidade entre adolescentes aumentou de 0,6% para 5,0% (IBGE, 2011), porém, o Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) mostrou prevalência de obesidade e de obesidade grave de 12,8% entre os adolescentes acompanhados pela Atenção Primária à Saúde em 2024. O cenário da obesidade infantil é ainda mais grave, na medida em que, mais recentemente, o Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (Enani), realizado em 2019, revelou que a prevalência de obesidade em crianças menores de cinco anos foi de 10,1%.

Pesquisas mostram que crianças e adolescentes com excesso de peso ou obesidade apresentam maior probabilidade de enfrentar problemas como pior saúde ainda na infância - incluindo diabetes tipo 2, asma, pressão alta, apneia do sono, problemas musculoesqueléticos e distúrbios metabólicos -, bem como menor autoestima, maior chance de serem vítimas de bullying e menor frequência e desempenho escolar. Além disso, crianças e adolescentes com obesidade terão maiores chances de problemas de saúde no futuro, pois esta condição é um forte preditor de obesidade na vida adulta, além de aumentar o risco de doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes tipo 2, doenças do coração e alguns tipos de cânceres. Os impactos futuros da obesidade infantojuvenil também incluem maiores chances de consequências socioeconômicas e laborais negativas, como menor empregabilidade, redução da produtividade e menores salários.

Como podemos mudar esse cenário?

Crianças e adolescentes podem fazer entre uma e quatro refeições por dia na escola ao longo de 12 anos. É um período decisivo, no qual convivências, valores e rotinas moldam hábitos que influenciarão a relação com a comida por toda a vida. A escola, portanto, é um espaço privilegiado de educação também sobre alimentação, onde são descobertas cores, sabores, texturas e são construídas referências que se somam às experiências da família e da comunidade.

Os números da pesquisa evidenciam o potencial transformador da regulação do ambiente escolar, uma política que promove saúde, reduz desigualdades e concretiza o direito humano à alimentação adequada.

Para o pesquisador Eduardo Nilson: “A regulação das cantinas representa uma política essencial para proteger a saúde de crianças e adolescentes, aumentando o acesso a alimentos saudáveis e reduzindo o consumo de alimentos ultraprocessados dentro e para além do ambiente escolar. Os impactos dessa política, particularmente sobre a obesidade, serão relevantes para sua saúde atual e futura a partir da formação de hábitos alimentares saudáveis a partir das escolas”. 

O Brasil avançou nesse tema com a publicação do Decreto Federal nº 11.821/2023, que orienta estados e municípios a limitarem a venda de ultraprocessados nas escolas públicas e privadas. Porém, a medida precisa se tornar uma Lei e esse processo segue enfrentando resistência para a aprovação de projetos de lei (PL) sobre o assunto, como o PL nº 4.501/2020, que proíbe o comércio e a publicidade desses produtos em todas as escolas brasileiras. 

“O Brasil é uma referência na alimentação escolar nas escolas públicas no mundo inteiro. Porém, precisamos avançar em medidas que, de fato, garantam que esses espaços sejam promotores de hábitos alimentares saudáveis, que vão impactar ao longo da vida das pessoas. Esse estudo reforça a importância dessa medida. Não há mais dúvidas sobre a importância de proibir ultraprocessados nas escolas, as evidências vêm avançando de forma muito robusta, e esse estudo é mais um deles, apresentando dados muito importantes. O lobby dos ultraprocessados é forte no Congresso Nacional, mas nossos parlamentares precisam avançar de forma efetiva na proteção de crianças e adolescentes”, afirma Ana Maria Maya, especialista do programa de Alimentação Saudável e Sustentável do Idec.

Metodologia

O estudo se baseou na modelagem de microdados de consumo alimentar da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2017-2018 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e na estimativa das mudanças no índice de massa corporal (IMC) dos indivíduos de 10 a 19 anos e da prevalência de obesidade nessa faixa etária a partir das mudanças na ingestão total de calorias da dieta.

Foram construídos seis cenários de políticas, considerando a aplicação de restrições da venda a bebidas adoçadas e/ou lanches ultraprocessados em cantinas comerciais de escolas públicas e privadas.