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Sete entidades da sociedade civil — das quais seis são integrantes da Coalizão Direitos na Rede — entraram na noite de ontem (05/08) com uma Ação Civil Pública contra a União e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) na Justiça Federal.
Intervozes-Coletivo Brasil de Comunicação Social, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Instituto Bem-Estar Brasil (IBEBrasil), Coletivo Digital, Garoa Hacker Clube, Associação Internacional de Comunicação Compartilhada (Compas) e Clube de Engenharia contestam o decreto 10.402, publicado pelo governo federal no dia 17 de junho de 2020, que dispõe sobre a adaptação do instrumento de concessão de telefonia fixa para autorização de serviços de telecomunicações.
As organizações refutam a metodologia de cálculo do valor dos bens reversíveis do Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC) realizada pela Anatel a partir da Consulta Pública n° 5 e contestam também as determinações do decreto com relação às autorizações hoje em vigor para o uso de radiofrequências, que poderão passar a ser delegadas por prazo indeterminado para as teles.
O pedido de liminar da Ação Civil Pública é para suspender os dispositivos do Decreto 10.402/20, tendo em vista os riscos de danos graves e de difícil reparação ao erário e ao interesse públicos.
“O objetivo da Ação Civil Publica é que a União Federal e a Anatel calculem os bens reversíveis com base nas determinações do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Justiça Federal, para que se considere tudo o que foi ou não foi vendido desde o início da concessão em 1998 até agora”, explica a advogada do Intervozes Flávia Lefèvre, especialista em telecomunicações.
O Tribunal de Contas da União (TCU)já atestou que há mais de 20 anos a Anatel, além de ter deixado de fazer o acompanhamento do equilíbrio econômico das concessões, também não fez qualquer controle do acervo de bens vinculados às concessões constituído por centenas de imóveis, redes de dutos, redes de telecomunicações, redes de acesso, redes de transporte, backhaul, antenas e equipamentos instalados em todo o território nacional.
De acordo com o critério patrimonial de avaliação determinado pelo TCU e pela Justiça Federal, o valor desses bens reversíveis é estimado em R$ 121 bilhões. O extinto MCTIC (à época do decreto; agora Ministério das Comunicações) e a Anatel, no entanto, consideram apenas o valor de hoje, que estaria na casa de R$ 17 bilhões.
Lefèvre explica que alguns dos valores desses bens foram depreciados e as empresas de telefonia ganharam bilhões com o processo de vendas ilegais sem o controle da Anatel. Portanto, desrespeitando o devido processo, que deveria ser computado agora para se garantir o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos de concessão.
“De acordo as regras de migração dos contratos de concessão para autorizações, vai se apurar o valor da concessão, incluindo o valor dos bens reversíveis, e o que for apurado será utilizado para se firmar compromissos das empresas para se fazer novos investimentos em redes de banda larga. Ou seja, se a gente subavaliar esses bens como Anatel está fazendo, vamos ter menos investimentos na nova infraestrutura de redes para atender a demanda do brasileiro por banda larga”, sintetiza.
“Quanto menos valor for atribuído aos bens reversíveis, mais o Estado vai ter que se virar para garantir investimentos em redes de banda larga. Ou não tendo dinheiro para tal, a sociedade ficará sem acesso, sem infraestrutura, sem a democratização da infraestrutura de banda larga. Significa a manutenção desse fosso digital imenso que é a desigualdade de acesso à internet no Brasil, tão clara agora nesse cenário de pandemia”, complementa a advogada.
Soberania nacional ameaçada com as mudanças do regime para radiofrequências
O decreto 10.402/20 também dispõe sobre a prorrogação e a transferência de autorização de radiofrequências, de outorgas de serviços de telecomunicações. O texto determina que a autorização de radiofrequência seja por tempo indeterminado, seguindo a mesma dinâmica das autorizações dos contratos que vão ser migrados da telefonia fixa para um contrato de licença única para exploração de todos os serviços.
Segundo Lefèvre, a medida é ilegal e impacta diretamente na soberania nacional, porque contraria os princípios da licitação e de interesse da administração pública, uma vez que o Estado estaria entregando um recurso público de alto interesse (radiofrequência), finito, para a iniciativa privada sem o poder regulatório previsto.
“Esse decreto não é lei, é um ato administrativo e como tal deve cumprir os princípios da legalidade. O decreto precisa obedecer os princípios que estão na Constituição. Por todas essas razões, a gente, organizações da sociedade civil, entende que esse decreto é ilegal”, resume.