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Pesquisa do Idec revela que, às vésperas da Copa do Mundo, estádios brasileiros desrespeitam direitos dos torcedores estabelecidos pelo CDC e Estatuto do Torcedor
Levantamento foi realizado em algumas das cidades-sedes da Copa do Mundo: Porto Alegre (RS), Recife (PE), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP). Foram consideradas quatro grandes categorias: ingressos, transportes, segurança e condições de conforto no estádio;
Entre os quatro estádios avaliados, dois (Arena Pernambuco e Maracanã) receberão jogos do Mundial. E, embora tenham apresentado melhores condições, também tiveram problemas, assim como o Pacaembu e o Arena do Grêmio;
O principal problema que a pesquisa revela é o desrespeito ao local de assento indicado no ingresso.
São Paulo, 08 de maio de 2014 – Para avaliar a real situação que o torcedor encontra para assistir às partidas de futebol no Brasil, o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), realizou uma pesquisa em quatro cidades que sediarão jogos da copa e que, ao mesmo tempo, são capitais de importantes campeonatos estaduais: Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo.
Em cada uma das cidades, foi selecionado um estádio: Arena do Grêmio, Arena Pernambuco, Maracanã e Pacaembu, visitado duas vezes para serem avaliadas em quatro categorias: ingressos, transportes, segurança e condições de conforto no estádio. Em São Paulo e Porto Alegre os estádios que sediarão jogos da Copa ainda não foram inaugurados.
“A intenção da pesquisa não era verificar se eles estão preparados para ser palco do Mundial ou se seguem o ‘Padrão Fifa’. A intenção era saber se eles cumprem os requisitos definidos pelo Estatuto do Torcedor e também o Código de Defesa do Consumidor (CDC)”, afirma o gerente técnico do Idec, Carlos Thadeu de Oliveira.
O principal problema que a pesquisa revela está relacionado à categoria ‘conforto nos estádios’: o desrespeito ao local de assento indicado no ingresso foi detectado em pelo menos um dos jogos em todos os estádios, com exceção da Arena do Grêmio. Nos dois jogos da Arena Pernambuco, os ingressos sequer traziam o número do assento correspondente. Esse direito é garantido pelo artigo 23, III, do Estatuto do Torcedor.
Além do desrespeito aos assentos, em três partidas, houve demora para entrar ou sair do estádio. No segundo jogo no Pacaembu, muitos torcedores só conseguiram entrar após o início da partida. Em um dos jogos da Arena do Grêmio, apenas duas das quatro rampas de acesso ao estádio estavam abertas, resultando em demora na entrada dos torcedores.
Ainda no quesito conforto, a qualidade dos banheiros também foi considerada e, por ser o estádio mais antigo entre os avaliados, o Pacaembu possui os principais problemas: más condições de higiene, mau cheiro e longas filas para utilização.
O gerente técnico do Idec ressalta “a oferta de boas condições nos estádios deve ser permanente e não restrita a um período e a mando de uma entidade privada”.
Ingressos
Com relação aos ingressos, o processo de compra foi o principal ponto avaliado pelo Idec. Foram encontrados problemas em três dos oito jogos analisados. Na arena Pernambuco e da Arena do Grêmio, havia filas consideráveis para a compra de ingressos antes da partida. O terceiro caso diz respeito à venda realizada pela internet, em jogo do Pacaembu: havia espera de cerca de uma hora. Superada a ‘fila virtual’ o consumidor tem apenas dez minutos para realizar a compra – tempo insuficiente para que todos os termos de condições de venda sejam avaliados.
Além disso, o Estatuto prevê que a comercialização dos ingressos seja realizada em no mínimo cinco pontos físicos de venda. Nos dois jogos do Pacaembu e em um da Arena Pernambuco, no entanto, havia oficialmente apenas quatro. Por fim, também foi verificado se havia cambistas vendendo ingressos antes das partidas. Em todos os jogos essa situação foi encontrada, à exceção das duas partidas na Arena Pernambuco. Sinal de que o velho “ralo” de ingressos continua existindo.
Transporte
Considerando a rede de mobilidade urbana disponível em cada cidade, as condições de transporte aos estádios encontradas durante a pesquisa foram, de modo geral, satisfatórias.
As condições de estacionamento basicamente se dividem entre os estádios que têm e os que não têm estacionamento próprio. A Arena Pernambuco e a do Grêmio, palcos totalmente novos, contam com essa possibilidade. Pacaembu e Maracanã, estádios antigos (ainda que este último tenha sido reformado) não têm local próprio para estacionamento. Resultado: nesses dois lugares (e também na Arena do Grêmio), se o torcedor decidir parar o carro em via pública, será provavelmente forçado a pagar uns bons reais a um guardador. Nos arredores do Pacaembu, a “taxa” era de R$ 20. Ressalte-se que o Estatuto do Torcedor prevê que a federação e o clube mandante solicitem ao poder público competente serviços de estacionamento.
O Estatuto prevê, ainda, que deve ser solicitado ao poder público meio de transporte, ainda que pago, para idosos, crianças e portadores de deficiência. Questionadas, nenhuma das federações afirmou se tal pedido foi ou não realizado.
Segurança
São diversas as variáveis para que a ida a um jogo de futebol seja considerada segura. Entre as principais, está a existência de laudos que atestem as boas condições do estádio. São quatro: de segurança (expedidos pela Polícia Militar), de engenharia, de prevenção e combate a incêndio e de condições sanitárias. O Estatuto do Torcedor determina que esses laudos sejam enviados pelas federações ao respectivo Ministério Público Estadual (MPE). As assessorias de imprensa dos MPEs do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo confirmaram o recebimento de tais documentos. Já o de Pernambuco, não soube informar sobre o envio dos laudos. Segundo a assessoria, a pessoa responsável estava de férias.
Outra importante medida é a elaboração de planos de ação referentes à segurança, ao transporte e às contingências que podem ocorrer durante os eventos. Segundo o Estatuto, tais planos devem ser publicados nos sites das federações. O Idec encontrou esse documento apenas nas páginas das organizações do Rio de Janeiro e de São Paulo. A Federação Pernambucana foi questionada e enviou um link de acesso ao documento; em todo o caso, o acesso ao plano, a não ser por meio desse link específico, é difícil. A Federação Gaúcha de Futebol também foi questionada sobre o assunto, mas não se pronunciou.
Além disso, os três planos de ação aos quais o Idec teve acesso são genéricos e consistem basicamente em um “protocolo de intenções” sobre o que deve ser feito. Em outras palavras, eles não tratam de pontos objetivos, concretos, deste ou daquele jogo.
Outro aspecto de segurança exigido pelo Estatuto é a existência de uma “central técnica de informações”. Basicamente, ela consiste em uma sala da qual se pode monitorar, por meio de imagens, o público presente. Indagados sobre a existência dessa estrutura, os orientadores de serviço de todos os estádios disseram informalmente que ela existe. Questionadas institucionalmente, apenas a administração do Maracanã respondeu e confirmou que, sim, há central técnica no estádio.
O Estatuto também prevê que as federações devem contratar seguro de acidentes pessoais em benefício do torcedor. Apenas os ingressos dos jogos da Arena Grêmio, comprados pela internet, não apresentavam o número da apólice do seguro.
A lei determina ainda que seja afixada ostensivamente nas entradas dos estádios a lista dos torcedores impedidos de participar do evento – em geral, os envolvidos em brigas. Tal lista também deve ser publicada no site da federação pertinente. Apenas a Arena Grêmio publicou em ambos os locais e apenas no segundo jogo; e o Maracanã, nas duas partidas analisadas, não divulgou a lista em nenhum meio. Os demais se alternaram entre publicar apenas no site ou apenas no estádio. Questionadas, apenas a Federação de Pernambuco se pronunciou, afirmando que, sim, essas relações são sempre afixadas.
Como foi feita a pesquisa
Foram escolhidas quatro cidades que sediarão jogos da Copa e que, ao mesmo tempo, são capitais de importantes campeonatos estaduais: Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo.
Em cada uma delas foi selecionado um estádio, visitado duas vezes. São eles, respectivamente: Arena do Grêmio, Arena Pernambuco, Maracanã e Pacaembu. A pesquisa foi realizada em março e a escolha das datas se baseou em jogos com grande expectativa de público.
A partir do Estatuto do Torcedor e do Código de Defesa do Consumidor, foi elaborado um roteiro de pesquisa que contemplou quatro grandes categorias: ingressos, transportes, condições dentro do estádio e segurança. Além da pesquisa in loco, também foram pesquisados os sites dos clubes e federações, a fim de avaliar informações suplementares e documentos que, por lei, devem ser publicados nesses meios.
Respostas
O Idec contatou, via assessoria de imprensa, todas as federações estaduais de futebol envolvidas, assim como os administradores dos quatro estádios avaliados. Entre as federações, apenas a de Pernambuco se manifestou. Segundo ela, as listas com os nomes dos torcedores impedidos ficam disponíveis nas entradas dos estádios. Quanto ao envio dos laudos de segurança ao Ministério Público, diz a entidade que “os estádios só são liberados (...) com os laudos atualizados. Caso não estivessem em dia, o próprio Ministério Público interditaria o estádio”. A Federação também acrescenta que, sim, solicita ao poder público meio de transporte para portadores de deficiência, idosos e crianças.
Entre os estádios, apenas o Maracanã respondeu: disse que conta com central técnica de informações, responsável por implementar os mecanismos de segurança. O estádio afirma que cabe ao poder público encaminhar a lista de torcedores impedidos de frequentar o local e que, caso isso ocorra, “trabalhará em parceria com o Estado para impedir o acesso dessas pessoas, bem como dar toda a publicidade prevista no Estatuto”, sem detalhar, porém, quais são os procedimentos adotados. Em relação à limpeza dos banheiros, informou a quantidade de funcionários contratados para a função e destacou que o item foi bem avaliado em recente pesquisa de opinião.
Veja tabela completa com a avaliação dos estádios:
* No Pacaembu, arquibancadas cheias e direito de assento não respeitado fizeram com que muitas pessoas assistissem ao jogo em locais onde não havia visão completa da partida. Na Arena Pernambuco, problema similar foi enfrentado pela torcida do time adversário.