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Valor do mínimo existencial é afronta ao povo brasileiro

Decreto do Governo Federal coloca a população abaixo da linha da pobreza

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Atualizado: 

28/07/2022
Foto: iStock
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O Governo Federal publica hoje (27) o decreto que permite o chamado mínimo existencial. Essa decisão faz com que bancos e financeiras possam utilizar quase toda a renda do consumidor para o pagamento de dívidas e juros, sobrando apenas cerca de R$ 300,00 para que as pessoas possam comer, comprar remédios e pagar o aluguel.

O mínimo existencial determina que para viver uma pessoa precisa de R$ 300,00. Ou seja, todos os serviços considerados essenciais podem ser pagos com esse valor. “Agora pense se isso é possível. Como pagar o aluguel, a conta de energia, de água, o condomínio, comprar comida, água para beber, gastos básicos com saúde e educação com R$ 300,00? É isso que o governo Bolsonaro diz ser factível”, afirma a coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Idec, Ione Amorim.

O restante do valor fica liberado para que bancos possam pegar como pagamento de dívidas das pessoas. “Em uma grande manobra para favorecer os bancos, o governo entrega ao setor a vida financeira dos consumidores. Entre as medidas recentemente anunciadas está a ampliação da margem de consignação de 35% para 45% da renda dos usuários do crédito consignado, inclusive com a possibilidade de consignação do Auxílio Brasil, programa social para a população em situação de vulnerabilidade. Agora os bancos ainda podem utilizar 75% da renda do consumidor para pagar as dívidas bancárias”, relata a coordenadora.

A armadilha do aumento do Auxílio Brasil

Recentemente, o governo Bolsonaro aprovou um aumento no valor do Auxílio Brasil que passaria de R$ 400,00 para R$ 600,00.

Com a aprovação do mínimo existencial fica comprovado que o repasse desse dinheiro para os trabalhadores e trabalhadoras brasileiros não vai ser feito da forma como foi dito. Como as pessoas vão ficar com apenas R$ 300,00 do dinheiro, já que os outros R$ 300,00 vão ser utilizados pelos bancos para pagar dívidas de crédito, na verdade o valor do Auxílio Brasil diminuiu em vez de aumentar.

Se for usado para o crédito consignado, o que ainda aguarda as regras pelo Ministério da Cidadania, quem pegar o crédito com base no valor de R$ 600,00, a partir de janeiro de 2023, receberá líquido somente R$ 160,00. O restante ficará com o banco pela parcela do crédito.  

Antes as pessoas tinham R$ 400,00 para poderem sobreviver. Agora esse valor será de apenas R$ 300,00, visto que o endividamento atinge 77% das famílias do Brasil, boa parte delas tem como única fonte de renda o Auxílio Brasil. “Uma parcela significativa do endividamento das famílias ocorre pelo uso de crédito para suprir o pagamento de despesas correntes e garantir a própria sobrevivência.  Nesses casos, a relação renda e crédito se complementa para garantir a sobrevivência. Porém o pagamento de parcelas futuras acrescidas de juros acabam comprometendo ainda mais a disponibilidade de renda e alimenta um ciclo contínuo de uso de crédito”, confirma Amorim.

A atuação do Idec no tema do mínimo existencial

O Idec é completamente contra a existência de um mínimo existencial que não leve em consideração a realidade do povo brasileiro. Hoje são mais de 125 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar, sendo que 33 milhões delas passam fome diariamente no país, acirrando as desigualdades de raça, classe e gênero. Ter R$ 300,00 para sobreviver é uma completa afronta à vida dessas famílias.

O decreto aprovado não tem embasamento em estudos e desconsidera contribuições de setores importantes da sociedade civil feitas durante a audiência pública convocada pela Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor) em outubro de 2021 para debater o tema. Naquela oportunidade, o Idec apontou que a eventual definição do mínimo existencial a partir de um teto fixo ocasionaria o desvio da finalidade principal da Lei do Superendividamento, tornando-a contrária à dignidade das pessoas superendividadas. Nesse sentido, também propôs que a definição do mínimo existencial deveria ocorrer por meio de um índice capaz de mensurar as principais variáveis que afetam as condições de sobrevivência das pessoas, como gastos com habitação, saúde, alimentação, transporte, educação, entre outros.   

O Idec continua trabalhando na proposta que possibilitará a avaliação do mínimo existencial e da capacidade de comprometimento de renda dos consumidores. A proposta em estudo contempla a situação individual do tomador de crédito e o seu histórico de endividamento. Medidas necessárias para coibir a prática dos bancos de concessão de crédito baseada somente nas regras aprovadas, como no caso do crédito consignado que não leva em consideração o endividamento e comprometimento de renda, mas apenas a disponibilidade de margem e prazo para ser explorado.

Quer se aprofundar no assunto? Acesse a Nota Técnica sobre o Mínimo Existencial feita pelo Idec e pelo Programa de Apoio ao Endividado da USP - Faculdade de Direito de Ribeirão Preto!