Bloco Associe-se

Associe-se ao Idec

Entidades demandam aprovação de mecanismo para ampliar produção nacional de vacinas

Em manifesto publicado hoje, 154 organizações pedem vacinação para Covid-19 exclusivamente pelo SUS e endossam o fim dos monopólios na indústria farmacêutica

Separador

Atualizado: 

27/04/2021

Nesta terça-feira (27), 154 entidades da sociedade civil lançam um manifesto demandando compromisso do Congresso com a vacinação de todas as pessoas através do SUS (Sistema Único de Saúde). O grupo pede, entre outras coisas, a derrubada de barreiras de mercado que limitam a produção nacional de vacinas, como é o caso do monopólio de fabricação e venda de imunizantes por farmacêuticas e empresas produtoras de outras tecnologias críticas para o combate à Covid-19. Também rechaçam a proposta que retira condicionantes para a compra e a administração de doses pela iniciativa privada - o projeto apelidado de “fura-fila” da vacina foi aprovado pela Câmara no início de abril e pode ser analisado pelo Senado nas próximas semanas.

O manifesto afirma que, “em vez de trabalhar para que medidas sanitárias comprovadamente eficazes sejam adotadas, o governo brasileiro, com apoio do Congresso, tem agido de forma a piorar as chances de seus cidadãos sobreviverem à pandemia”. A liberação da compra privada de vacinas e a redução do auxílio emergencial são apontados como exemplos de iniciativas que ampliam as desigualdades socioeconômicas, raciais, de gênero e territoriais no país. 

Clique aqui para ler o documento na íntegra. 

“O acesso à vacinação é limitado pelo racismo estrutural da sociedade brasileira. Além disso, o Plano Nacional de Imunização tem deixado fora da prioridade grupos com alta possibilidade de contágio e complicações mortais pelo vírus, tais como pessoas em situação de rua, quilombolas, trabalhadores de serviços essenciais e pessoas em situação de privação de liberdade”, diz trecho do documento. 

Nas mãos do Senado

O manifesto lançado hoje aumenta a pressão pela aprovação do licenciamento compulsório de produtos farmacêuticos relacionados à Covid-19. Essa medida suspenderia de forma temporária a exclusividade que as empresas farmacêuticas têm para explorar suas patentes, abrindo caminho para que outros laboratórios fabriquem vacinas enquanto durar a pandemia. Os detentores das patentes continuariam a receber royalties, mas a produção nacional aumentaria significativamente, com provável queda no preço das doses.  

O Senado pode colocar o tema em votação ainda nesta semana através do projeto de lei 12/2021, de autoria de Paulo Paim (PT-RS) e relatoria de Nelsinho Trad (PSD-MS). Na Câmara, o debate acontece ao redor do PL 1462/2020, que é assinado por 14 parlamentares de todo o espectro partidário. 

Como reforça o manifesto da sociedade civil, o licenciamento compulsório é uma medida prevista na legislação brasileira e em tratados comerciais dos quais o Brasil faz parte. “Centenas de países e personalidades estão hoje mobilizados para acionar esse dispositivo no âmbito da Organização Mundial do Comércio, por exemplo, para permitir que a vacina chegue a todas e todos o quanto antes”, diz trecho do documento. “O que pedimos é que, pelo menos nesse momento de catástrofe humanitária, as empresas farmacêuticas - e o Congresso brasileiro - coloquem as vidas acima do lucro.” 

Além disso, essa não seria a primeira vez que o Brasil tomaria uma decisão do tipo. Em 2007, o medicamento Efavirenz, que na época era prescrito para 40% das pessoas infectadas com o vírus da Aids, teve sua tecnologia liberada para outras empresas. Em cinco anos, a economia gerada foi de mais de US$ 100 milhões. Além disso, o número de pacientes em tratamento saltou de 60 para 100 mil pessoas neste período. 

Para as entidades, as soluções para a pandemia no Brasil precisam ser globais e passam  tanto pela produção e aquisição de vacinas, com mecanismos de transparência que garantam o seguimento dos contratos, quanto pela sua distribuição de forma equitativa,  centralizada no SUS e com priorização dos grupos mais vulneráveis.

Campanha pública

As organizações ainda lançam a campanha “Mais Vida, Menos Lucro”, em que fazem um apelo às empresas e ao Congresso brasileiro para que, pelo menos nesse momento de catástrofe humanitária, coloquem as vidas acima do lucro. Empresas como a Pfizer já anunciaram que pretendem subir o preço da dose da vacina de US$ 19 para US$ 150, o que  inviabilizaria a compra por diversos países. 

As grandes farmacêuticas receberam bilhões em recursos públicos para o desenvolvimento das vacinas - 97% do investimento feito na vacina da AstraZeneca foi público, por exemplo. O mesmo acontece com o imunizante da Pfizer, que recebeu mais de US$ 450 milhões do governo alemão. Nada mais justo que a sociedade como um todo também se beneficie dessas inovações, afirmam as organizações.

“Ao contrário do que é divulgado, não estamos falando de quebra de patentes, mas do fim do monopólio de venda e comercialização de vacinas. Não queremos tirar os direitos das empresas, mas que neste momento de emergência elas pensem menos no seu lucro e mais em salvar vidas. Salientamos que precisamos de vacina para todas e todos e rechaçamos aqueles que querem furar a fila da imunização. Não são os empresários que devem definir quem vai ser vacinado. Precisamos de soluções conjuntas, globais, e defender a lógica da imunização conforme maior risco de infecção. Com isso, muito mais gente será imunizada em um período menor de tempo. A desigualdade no acesso a vacinas coloca toda humanidade em risco, pois cria condições para a continuidade da pandemia e o surgimento de novas variantes”, afirma Sheila de Carvalho, advogada de Direitos Humanos, integrante da Coalizão Negra por Direitos. 

Clique aqui para ler a íntegra do manifesto. 

Entre as entidades que assinam o documento estão Associação Brasileira de Combate às Desigualdades (ABCD), Associação Brasileira de AIDS (ABIA), Associação Brasileira de ONGs (Abong), Católicas pelo Direito de Decidir, Coalizão Negra por Direitos, Conselho Indigenista Missionário, Fundação Avina, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), Instituto de Estudos Socio-econômicos (Inesc), Instituto Ethos, Nossas, Oxfam Brasil, Rede Advocacy Colaborativo (RAC) e Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).