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As reportagens que o Jornal Nacional mostrou na semana passada sobre golpes aplicados por presidiários em pessoas que têm parentes internados em UTIs chamaram a atenção de órgãos de defesa do consumidor. Eles cobram uma responsabilidade dos hospitais pelo vazamento de informações sigilosas sobre os pacientes.
Cadernos apreendidos pela polícia mostram que os criminosos fizeram milhares de ligações para hospitais, clínicas e pacientes.
Uma mulher, que não quis se identificar, acreditou na história de um falso médico. O homem disse que o marido, internado em estado grave, devia pagar para fazer exames com urgência. Ela não suspeitou porque o bandido tinha muitas informações.
“Sabia o meu nome, sabia o nome dele. Sabia que ele estava no CTI e sabia qual o plano de saúde”, contou.
A polícia diz que a quadrilha enganou pacientes em hospitais públicos e privados em todo o Brasil. Escutas feitas com autorização da Justiça mostram que os criminosos perceberam o despreparo de funcionários que, sob pressão, acabavam revelando informações sigilosas como o nome e detalhes dos prontuários das vítimas.
O delegado responsável pela investigação disse que a quadrilha, presa na semana passada, conseguia informações em vários setores dos hospitais. Nesta conversa, um deles liga para a copa e convence a funcionária.
Golpista: Oi, minha querida, quem fala contigo é o Dr. Douglas, aqui da UTI. Trabalhando muito como sempre?
Funcionária: Como sempre, né?
Golpista: Bastante né, querida? A vida de todo o profissional aqui, não é mesmo? Pega para mim o mapa com a dieta dos pacientes aqui da UTI, por favor, querida. Primeiro leito, por favor, o nome e a dieta, por gentileza.
Funcionária: Primeiro leito é o Gabriel.
Golpista: Tem o número do atendimento dele aí queridinha, ou não?
Funcionária: Tem sim.
Ela dá o número sem questionar. Soletra nomes e passa registro e protocolo de vários pacientes
Golpista: Próximo paciente?
Funcionária: É o Saulo.
Golpista: UTI, né?
Funcionária: Isso, na UTI.
Golpista: Registro e protocolo?
Funcionária: Protocolo 1873...
A quadrilha, que atuava dentro de um presídio em Rondonópolis, em Mato Grosso, chegava a lucrar mais de R$ 200 mil por mês. Mesmo tendo, segundo a polícia, menos de 10% de sucesso nas abordagens com vítimas e funcionários de hospitais.
Golpista: Eu vou lhe repassar o nome da minha paciente, veja para mim se você consegue achar a data de nascimento dela para mim, por favor.
Funcionária: A gente não é autorizada a passar informações dos pacientes por telefone.
Golpista: Ah, sim. É verdade. Mas eu estava precisando somente da data de nascimento.
Funcionária: Mesmo assim, esse fato eu não vou poder te ajudar.
Golpista: Tudo bem... Tchau, tchau...
A Federação dos Hospitais reconhece que um bom treinamento é o primeiro passo para evitar que funcionários sejam manipulados pelos bandidos.
"Isso é uma coisa passível de solução, desde que haja um compromisso da gestão desses hospitais em treinar seu pessoal e aumentar sua segurança para o paciente evitar que ele caia nesse tipo de golpe”, disse o presidente da Federação Brasileira dos Hospitais, Luiz Aramecy.
Para prevenir os golpes, a Associação Nacional dos Hospitais Privados defende a colocação de avisos nos corredores e recomenda que os pacientes assinem um documento para provar que foram alertados sobre o problema, como fez a farmacêutica Daniele Bersot quando chegou na maternidade.
“Lá fomos informados que há esse golpe comum de que pessoas ligam para familiares pedindo algum tipo de dinheiro para ser depositado em conta bancária, mas que aquela maternidade não faz nenhum tipo de contato por telefone”, contou.
Mas o Instituto de Defesa do Consumidor afirma que a responsabilidade sobre o vazamento de dados dos pacientes é sempre dos hospitais.
“Esses golpes são aplicados com informações que são contidas em prontuários médicos. Esse tipo de informação é delicado, e ela está sob a guarda e acesso muito restrito do estabelecimento de saúde. Se essa informação vazou, algum dever de sigilo e de guarda foi negligenciado. Então, mesmo que seja possível avisar o paciente da ocorrência do golpe, ainda assim a responsabilidade dessas prestadoras, do hospital, do estabelecimento de saúde permanece”, explicou a advogada do Instituto Brasileiro de Defesa ao Consumidor.
A polícia diz que é importante que os hospitais adotem novos procedimentos de segurança.
“Na verdade, o que tem que se criar é um protocolo de segurança. Em que a pessoa que esteja fornecendo a informação tenha certeza absoluta de que aquele recebedor da informação é um profissional de saúde, é um profissional cadastrado e não um criminoso", disse o delegado Gabriel Ferrando.
Golpista: Próximo paciente?
Funcionária: Aí não tem mais não. São só esses.
Golpista: A gente não “temos” mais gente na UTI?