separador
Atualizado:
Reportagem do jornal O Tempo, publicada em 10/02/2021
Segundo a Confederação Nacional de Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), quase 67% das famílias brasileiras estão endividadas, e 11% já não conseguiram quitar os débitos em 2020.
Os números apontam para o aumento do contingente da população superendividada – quando as dívidas são tantas que fica praticamente impossível renegociar sem comprometer os gastos com o mínimo existencial, como moradia e alimentação. Os superendividados já ultrapassam 30 milhões de pessoas.
Para tentar fazer frente a esse grave problema, o Projeto de Lei 3.515/2015 pretende oferecer condições para facilitar a negociação e o pagamento das dívidas pelos consumidores. O texto está em tramitação há mais de cinco anos na Câmara dos Deputados.
Mais uma vez, a promessa dos parlamentares é que a pauta avance, principalmente após ser definida como uma das prioridades do governo federal para a retomada econômica. A expectativa é que a proposta seja votada amanhã.
Considerada uma espécie de recuperação judicial para pessoas físicas, uma das principais propostas do projeto é reunir todos os credores dos superendividados em uma audiência de conciliação extrajudicial. Aí, seria definido um plano de pagamento, que pode durar até cinco anos, cujas parcelas mensais se limitariam a 30% da renda líquida do consumidor com as dívidas.
Para o advogado cível Phelipe Cardoso, essa novidade pode ajudar muitas famílias a não serem mais excluídas do mercado consumidor, dando condições “factíveis” para o pagamento das dívidas. “Estão previstos mecanismos de conciliação, já que se muda o parâmetro. Antes, era uma coisa pulverizada; com o projeto passa a reunir todos os credores para colocarem as dívidas em um bolo, verificar a capacidade financeira do cliente e o juiz ajudar em um acordo final”, acrescentou.
Já o especialista em direito do consumidor e professor da Faculdade Batista Bertie Moura lembra que, após o pagamento final do débito, o consumidor não poderá aderir a um novo plano de recuperação em dois anos. “Nisso, o projeto é taxativo. Assim como já existe com as pessoas jurídicas, os superendividados poderão estruturar o pagamento da dívida por um período maior, sem ficar inadimplente e podendo se movimentar financeiramente, mas com algumas restrições”, explicou.
O relator do projeto na comissão especial, o deputado federal Franco Cartafina (PP-MG), lembra que o texto ficou parado entre 2015 e 2019.
“O relatório está apresentado, está pautado e, caso não ocorra nenhum contratempo com os líderes partidários, será votado. Queremos dar um alento para a população voltar a ter dignidade e ser reinserida no mercado de consumo”, explicou o parlamentar.
Caso o texto original do Senado seja alterado, o projeto segue mais uma vez para a Casa, que dará a palavra final.
“Vivemos uma epidemia de endividados”
A economista e coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim, lembra que a realidade brasileira é crítica e, por isso, o tema merece prioridade dos parlamentares.
“Vivemos uma espécie de epidemia (de endividados), que mina a capacidade de pagamento dos consumidores. As medidas hoje adotadas pelo sistema são insuficientes para combater essa questão e, ao mesmo tempo, temos um projeto bem estruturado”, declarou.
Para Ione, o acesso à educação financeira é um dos principais pilares da proposta e vai prevenir que mais brasileiros se tornem superendividados.
O coordenador do Procon Assembleia, Marcelo Barbosa, acrescenta ainda que a proposta traz um cuidado especial do idoso. “Muitas vezes, os idosos não possuem renda suficiente para honrar tudo isso, além de serem vítimas da publicidade desenfreada. O assédio ocorre até na rua”, finaliza.