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O crédito do celular pré-pago está sendo consumido em um ritmo maior do que o habitual? Atenção, você pode ter contratado da sua operadora, sem saber, o chamado Serviço de Valor Adicionado (SVA) — que vai de música a horóscopo, passando por cursos on-line de inglês e futebol. E não se sinta uma exceção. Segundo pesquisa qualitativa feita pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), mais de um terço dos clientes de pré-pagos aceitaram o serviço sem querer ou acreditando que era gratuito. E 82% dos entrevistados, nessa modalidade de contratação, se dizem vítimas de cobranças indevidas por serviços adicionais. Entre os consumidores com contratos de celular pós-pagos, esse índice cai para cerca de 68%. Em 2016, os SVAs foram responsáveis por mais de R$ 8 bilhões em receitas para as empresas de telefonia.
— O resultado da pesquisa vem ao encontro dos dados do Sindec (que reúne as queixas feitas a Procons Brasil afora), que já apontavam que os consumidores com celulares pré-pagos são os que mais sofrem com os SVAs. Como não têm fatura, fica mais difícil a identificação de cobranças indevidas. O que quer dizer que esse número pode ser maior, pois outros consumidores talvez não tenham se dado conta ainda da cobrança indevida — ressalta Rafael Zanatta, pesquisador em telecomunicações do Idec, responsável pelo levantamento.
Mesmo recebendo a fatura em casa, Ricardo Machado Alves dos Santos, dentista, só percebeu, no fim de agosto, que estava sendo cobrado por um serviço de futebol que não contratou.
— Foi mais de um ano de cobrança. E não se pode dizer que é desleixo meu, pois costumo olhar as faturas e essa cobrança não estava identificada. Quando ela passou a aparecer, era de uma forma minúscula, difícil de perceber. Depois que reclamei à Defesa do Consumidor, este mês a minha conta veio com um estorno de R$ 370 — conta Santos.
A Vivo ratifica que o caso foi solucionado e as questões do consumidor esclarecidas.
Queixas na Anatel
Mais de 90% das queixas encaminhadas à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) relacionadas a SVAs são sobre cobrança indevida. Os serviços adicionais foram responsáveis por 5% a 10% de todas as reclamações encaminhadas pelos consumidores ao órgão regulador entre janeiro e outubro, último dado disponível. A gravidade e a importância o tornaram o foco de um projeto-piloto da Anatel, com procedimentos de fiscalização regulatória que foi instaurado, em abril, junto às quatro maiores operadoras do setor (Claro, Oi, TIM e Vivo).
Arthur Rollo, titular da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), diz que até meados de novembro serão julgados processos administrativos relacionados a SVA. A maioria por irregularidade na cobrança e por serviços não solicitados.
O levantamento feito pelo Idec, com 296 pessoas, nas ruas de São Paulo e pela internet, aponta ainda que mais da metade dos consumidores não recebe a devolução dos valores cobrados indevidamente (51% dos clientes pré-pagos e 73,7% dos pós-pagos). O pagamento em dobro, então, conforme estabelece o Código de Defesa do Consumidor (CDC), é uma raridade: apenas 5,3% dos clientes pós-pagos obtiveram esse tipo de reembolso, contra 19% dos clientes pré-pagos.
— O SVA virou uma indústria de captar recursos. É preciso que haja a regulação deste mercado e uma maior atenção das práticas das empresas pelo agente regulador. Hoje, se o cliente clica sem querer no link, contrata de imediato o serviço, sem que haja sequer uma mensagem de confirmação para garantir que era seu desejo aquela contratação — diz Zanatta, informando que, em média, o custo é de R$ 5 por semana, o que equivale a um terço dos créditos recarregados, já que a média é de R$ 15.
O especialista chama a atenção para a proliferação de ofertas enganosas e de golpes aplicados via serviços adicionais.
— As empresas deveriam ser responsabilizadas. Afinal, estão na cadeia de remuneração e deveriam se preocupar com o serviço que oferecem — afirma.
Segundo Eduardo Tude, diretor da Teleco, consultoria especializada em telecomunicações, desde o ano passado, as empresas vêm enxugando seus portfólios de SVA, que representa cerca de 13% da receita da telefonia móvel.
— A tendência é a concentração nos serviços campeões de venda. Havia tantos que as pessoas não sabiam sequer o menu de oferta daquela operadora. Hoje, ainda há uma desinformação das duas partes sobre esse produto, o que causa esses problemas — avalia.
Empresas dizem que simplificaram oferta
O Sinditelebrasil, entidade representativa das empresas do setor, confirmou a simplificação do portfólio de produtos, “para oferecer o melhor atendimento aos clientes”. E ressaltou o esforço contínuo para melhoria na gestão e controle de processos dos serviços de valor adicionado. A entidade chamou atenção para o tamanho da amostra da pesquisa do Idec, que corresponde a 0,0001% do total de usuários de telefonia móvel no Brasil, o que, continua, pode gerar interpretações equivocadas do ponto de vista estatístico. Consultadas, Oi, Vivo, TIM e Claro informaram que o sindicato respondia pelas empresas.
— Não é uma pesquisa que tem a pretensão de gerar resultados científicos e irrefutáveis, mas que sugere problemas graves com usuários de pré-pago — diz Zanatta, do Idec.