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Por que melhorar o transporte coletivo é vantajoso para toda a cidade

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Gaúcha ZH

Atualizado: 

19/06/2020
Foto: iStock
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Reportagem d Rádio Gaúcha ZH, publicada 19/06/2020

Em um local onde o sistema funciona bem, as pessoas não perdem tanto tempo no trânsito e se beneficiam do controle da poluição

Salvar o transporte coletivo em Porto Alegre não será tarefa simples. Exigirá mobilização e vontade política para fazer investimentos e enfrentar questões culturais arraigadas em parte da sociedade, que se acomodou em saídas individuais para os problemas de mobilidade. Deixá-lo ruir, por outro lado, seria uma estratégia sem ganhadores.

Além de facilitar os deslocamentos na cidade, o transporte coletivo é um aliado para diminuir congestionamentos e ajudar a controlar a poluição. Sua extinção traria consequências econômicas, ambientais e sociais.

Um estudo da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) estima que, no Brasil, o prejuízo acarretado pelo desperdício de tempo no trânsito é de mais de R$ 111 bilhões por ano. Sem transporte público, a economia de um grande centro urbano sucumbiria: com as vias ainda mais engarrafadas pelo aumento da circulação de carros e motos, as pessoas teriam menos tempo para se dedicar ao trabalho, mais atrasos e menor produtividade.

Também haveria mais problemas de saúde pública. Estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que 7 milhões de pessoas morrem a cada ano em decorrência de enfermidades causadas a partir do ar poluído. Com mais trânsito, os acidentes automobilísticos, que lideram as causas de morte entre pessoas de cinco a 29 anos, também tenderiam a aumentar.

Além disso, a Organização das Nações Unidas (ONU) calcula que dois terços da população mundial estará em centros urbanos em 2050. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 57% da população, ou 118 milhões de brasileiros, estão concentrados em apenas 5,6% dos municípios do país — somente o Estado de São Paulo conta com 21,8% da população. Sem o transporte público, a falta de acesso das pessoas que hoje vivem em bairros periféricos às oportunidades de emprego, concentradas na região central das cidades, se acentuaria. Uma das consequências da desigualdade, o aumento da violência seria questão de tempo.

Para a mestre em engenharia de trânsito e professora da Unisinos Nívea Oppermann, além de ser um meio democrático de deslocamento, o transporte coletivo promove a aproximação das pessoas com a cidade:

— Ele traz segurança, porque quem o utiliza precisa circular na rua: é bom para o comércio e aproxima as pessoas do espaço urbano. Temos de qualificá-lo, porque ele faz bem para as cidades, e, principalmente, para a sociedade.

Com tantos argumentos em favor desses modais, parece não fazer sentido que o poder público tenha deixado os coletivos em segundo plano nas últimas décadas. Mas fica fácil entender a urgência de resgatá-lo como a principal opção para os deslocamentos na cidade.

Mobilidade e qualidade de vida

Para especialistas, o transporte público de massa é, ainda, a espinha dorsal em torno da qual as soluções de mobilidade sustentável poderão prosperar. Com vias menos carregadas, é possível destinar mais espaço para a mobilidade ativa, aumentando a malha cicloviária e ampliando os passeios públicos.

Nesse sentido, o distanciamento social imposto pela pandemia de coronavírus tem se mostrado uma oportunidade para diversas cidades repensarem o uso do espaço público. Ruas sem congestionamento, a diminuição do barulho e a redução da poluição permitiram vislumbrar novos cenários em locais como Berlim e Bogotá, que implantaram ciclovias temporárias. Um dos primeiros lugares afetados pela pandemia na Europa, Milão anunciou recentemente um plano para implantar imediatamente 35 quilômetros de ruas com melhor infraestrutura para pedestres e ciclistas.

— É preciso ter mais áreas onde valha mais a pena ir de outros meios do que de carro. Os modos ativos são fáceis: ciclofaixas e faixas de pedestres são baratas. Muitas pessoas questionam o preço, mas quando se vai fazer um viaduto, não. E, em muitos viadutos, não podem entrar ônibus, pedestres e ciclistas — destaca o coordenador de mobilidade urbana do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Rafael Calabria.

Há, ainda, o viés ambiental do investimento. Se as cidades expandissem suas redes de transporte e incentivassem deslocamento com bicicletas e caminhadas, seria possível reduzir 40% das emissões de dióxido de carbono globais até 2050, de acordo com um estudo da Universidade da Califórnia.

Menos trânsito também significa uma necessidade menor de manutenção viária, que hoje compromete boa parte do orçamento público — somente em 2019, o valor aprovado para esse tipo de serviço em Porto Alegre foi de R$ 90 milhões. O dinheiro que sobraria poderia ser investido em outras áreas prioritárias, como saúde e educação.

Na Capital, as iniciativas para melhorar a mobilidade ativa caminham historicamente a passos lentos. Iniciada há mais de uma década, a malha ciclável da cidade hoje conta com apenas 54 quilômetros — quase um décimo de São Paulo e um quinto de Fortaleza, que começou a investir nesse tipo de iniciativa há apenas cinco anos. Basta uma volta pelos bairros da região central para observar que as condições das calçadas, cuja manutenção é de responsabilidade dos proprietários, tampouco é convidativa.

Segundo a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), durante a pandemia, foram construídos quatro novos quilômetros de ciclovias. Há planos de expansão da malha ciclável e melhorias para a circulação de pedestres na região central ainda neste ano — o órgão não detalhou nem estipulou data para as intervenções. Também há previsão para a implantação de novas faixas exclusivas — que foram expandidas em cerca de nove quilômetros nos últimos meses. Atualmente, Porto Alegre conta com 28 quilômetros destinados à circulação dos coletivos e 56 quilômetros de corredores de ônibus.

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