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Foto: Alf Ribeiro/iStock
Publicado originalmente por Estadão
Nada justifica tal demora, durante a qual, na maior e mais rica cidade do País, um serviço de tal importância foi regido por contratos emergenciais, renovados a cada seis meses
A assinatura dos novos contratos com as empresas que prestam o serviço de ônibus da capital, depois de uma longa novela – a licitação se arrastava desde 2013 –, deixa uma importante lição sobre como os administradores públicos não devem se comportar em casos semelhantes. Nada justifica tal demora, durante a qual, na maior e mais rica cidade do País, um serviço de tal importância foi regido por contratos emergenciais, renovados a cada seis meses. Com eles, só as empresas concessionárias se beneficiaram, desobrigadas de cumprir metas de melhora do serviço, clara e formalmente estabelecidas.
Os 32 novos contratos, no valor de R$ 63 bilhões – uma das maiores concorrências do País –, terão a duração de 15 anos, em vez dos 20 anos previstos inicialmente. Esse foi o último grande obstáculo a ser superado para enfim se encerrar essa história. Em 24 de maio último, em ação movida pelo diretório estadual do PSOL, o Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que o prazo de 20 anos era ilegal. O PSOL defendia o prazo de 15 anos estabelecido por lei de 2001. O prazo de 20 anos foi introduzido por outra lei municipal aprovada em 2015. Depois de receber, dia 6 último, o parecer pedido à Procuradoria-Geral do Município sobre a questão, o prefeito Bruno Covas anunciou logo a assinatura dos contratos com esse prazo reduzido.
São fortes os indícios de que a rapidez da decisão do prefeito está ligada também à paralisação dos ônibus no próprio dia 6 último, sobre a qual pesam suspeitas de ser sido feita de comum acordo entre empresários, motoristas e cobradores, caracterizando locaute. Embora todos eles neguem, o secretário municipal de Segurança Urbana, José Roberto Rodrigues de Oliveira, enviou ofício à Delegacia de Polícia de Proteção à Cidadania (DPPC) pedindo que se investiguem as suspeitas de locaute. Segundo Covas, “cabe à Polícia Civil dizer se isso ocorreu, quem investiga prática de crimes é ela”. Se se confirmar o locaute, espera-se a adoção das providências indispensáveis para que todos os nele implicados sejam severamente punidos. Os milhões de usuários de ônibus não podem ser joguetes nas mãos de irresponsáveis.
Durante o período de 2013 até agora – quando o serviço de ônibus esteve sob contratos emergenciais – tudo correu bem para as empresas. Essa situação em que tudo era provisório, sem a necessidade de seguir planos de renovação e melhorias no serviço, era cômoda para elas. Mas saía cara para os paulistanos, que sofriam com a degradação contínua do serviço – lento e desconfortável, submetendo os usuários a longas esperas nos pontos. As viagens diárias de ônibus de ida e volta para o trabalho e outros compromissos se tornaram um suplício. E o ônibus é e continuará sendo por bom tempo um dos mais importantes meios de transporte coletivo da capital, tendo em vista o alto custo e a natural demora exigidos para a ampliação das linhas do metrô.
O que os paulistanos se perguntam agora é por que os prefeitos que se sucederam naqueles seis anos não tomaram as medidas que se impunham para evitar esse absurdo. Jogar a culpa da demora na Justiça e no Tribunal de Contas do Município (TCM), como se essas instituições tivessem algum prazer sádico em criar dificuldades para a realização das licitações, e assim infernizar a vida dos paulistanos, é desculpa que não convence ninguém. No ano passado, quando os contratos de emergência foram renovados mais uma vez, um pesquisador em mobilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Rafael Calábria, pôs as coisas em seus devidos lugares, ao afirmar que a culpa pelo atraso na licitação era da Prefeitura, que não elaborava edital de licitação sem a correção de erros já conhecidos.
Por que ter insistido tanto tempo nesses erros, que só beneficiaram as empresas, se eles podiam ter sido facilmente identificados com a ajuda de técnicos competentes e experientes? Responder a essa questão, mesmo correndo o risco de ferir suscetibilidades, é uma valiosa contribuição que Bruno Covas pode dar à cidade.
Publicado originalmente por Estadão