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Como ter acesso a recursos bancários e pagar contas de parente internado

Especialistas recomendam registrar procuração ou, caso a pessoa esteja inconsciente, pedir curatela à Justiça

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O Globo

Atualizado: 

26/02/2021
Foto: iStock
Foto: iStock

Reportagem do jornal O Globo, publicada em 25/02/2021

A pandemia de Covid-19 tem levado milhares de famílias a lidar com a falta repentina de recursos e a burocracia que envolve a movimentação bancária e o pagamento de contas, devido às internações prolongadas ou à morte repentina de um familiar.

A biomédica Larissa Basilio, de 24 anos, enfrenta uma rotina desgastante há nove meses, desde que a mãe dela morreu vítima de Covid-19 após ficar internada por dez dias. Larissa tenta resolver questões que vão da simples troca de titularidade das contas da casa ao acesso ao dinheiro depositado no banco:

— Tive problema com todos os serviços. Na Justiça, obtive o direito apenas de saber quanto a minha mãe tinha em conta. Nem o extrato impresso o banco me dá. Nas operadoras de telefonia e concessionárias, após mandar numerosas vezes o atestado de óbito, a impressão é que não me ouvem, pois ao ligar para o SAC continuam pedindo a autorização do titular da conta.

E acrescentou:

— É muito desgastante cada vez que preciso falar sobre a morte da minha mãe. Éramos só eu e ela, estou tendo que aprender a lidar com tudo sozinha — diz Larissa, que conseguiu resolver parte das pendências ao reclamar nas redes sociais.

A preocupação com o risco iminente de morte provocada pela Covid-19 fica evidente com o número recorde de testamentos registrados no Cartório de Notas do Brasil, entre agosto e dezembro do ano passado, cerca de 19 mil, o maior para o período desde 2010.

Segundo o Cartório de Notas, a procura aumentou não apenas entre os idosos, mas entre os mais jovens, especialmente profissionais de saúde.

Organizar documentos

Para o advogado Rodrigo Araújo, do escritório Araújo e Jonhsson Advogados, independentemente de estar doente, o ideal é manter senhas e documentos organizados com alguém de confiança, principalmente os idosos, ou fazer uma procuração por instrumento público, registrada em cartório, para nomear um tutor para caso de necessidade.

— Com a procuração fica mais fácil resolver qualquer questão em banco, plano de saúde e outros serviços. Se for uma urgência, pode-se fazer a procuração particular. Mas, se a pessoa estiver internada e sem condições de fazer qualquer documento, resta à família recorrer à Justiça para pedir a curatela, que é concedida em menos de uma semana. Passada uma semana de internação, aconselho já providenciar.

A advogada especializada em sucessões e heranças, Mariani Chater, diz que a curatela é parecida com o inventário, mas neste caso é preciso apresentar laudo médico e comprovar a dependência financeira em relação ao internado.

— A Justiça vai definir quais ações e valores estarão disponíveis para o curador. São poderes restritos, e este terá que prestar contas depois.

Para quem não conseguir fazer nada disso, mas tiver os dados e senha do familiar hospitalizado, Araújo avalia que é aceitável usá-los diante da situação. No entanto, explica a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), essa movimentação não é considerada regular, podendo até ser questionada mais tarde.

Por isso, o advogado aconselha guardar todos os comprovantes para justificar as movimentações, caso haja contestação.

Outro caminho que agiliza esse processo em meio ao caos da internação é fazer o cadastro no cartório digital. No e-Notariado, o interessado vai a um tabelionato de notas registrar sua foto, assinatura e outros dados no aplicativo, que é conectado com o cartório. Feito isso, está apto a fazer procurações e testamento por videoconferência.

Planos devem responder

Uma das grandes preocupações de quem tem um familiar internado, quando este é o titular do plano de saúde, é o que fazer em caso de problemas.

— A operadora é obrigada a responder a qualquer pedido de informação, seja um esclarecimento sobre a cobertura ou cobrança — diz Araújo.

O advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Igor Marchetti, esclarece ainda que, em geral, pai, filho ou cônjuge podem representar os interesses do paciente junto ao plano de saúde. No entanto, não há regulamentação que garanta agilidade desse processo.

— Se o consumidor fica desacordado, a solução também pode ser uma ação de curatela. Mas, dependendo da empresa, há alternativas de solução mais rápida. É preciso entrar em contato com a operadora e explicar a situação.

Com uma procuração em mãos, também é possível requerer acesso à aposentadoria da pessoa internada, no site do INSS ou no banco, que analisarão a documentação. Caso o segurado esteja impossibilitado de firmar a procuração, os familiares podem ir a uma agência do INSS para se cadastrarem como administradores provisórios, por um período máximo de seis meses, para receber o benefício, mesmo sem a procuração.

Contas suspensas

Com relação às contas de consumo, como água, luz, gás e telefone, pedir segunda via pode ser simples. Mas alterar a titularidade ou retirar a conta do débito automático podem exigir autorização legal ou a apresentação do atestado de óbito.

Para as contas de telefone, a Anatel explica que, embora não se tenha uma regularização sobre o congelamento a conta, com isenção de multa, ainda que se comunique o motivo, existe a possibilidade de o consumidor solicitar a suspensão do serviço, entre 30 e 120 dias, uma vez a cada ano.

Na Cedae não é possível pedir suspensão temporária da cobrança, entretanto, o corte continua suspenso enquanto durar a pandemia. 

Em relação ao gás e à luz, a Naturgy e a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) esclarecem que a família pode pagar com a fatura ou pedir segunda via nos canais de atendimento. Ambos dizem que não há previsão de congelamento da conta. A companhia de gás, todavia, ressalta, que sem consumo, em caso de internação, será cobrada a taxa mínima do serviço. Em caso de atraso, o pagamento após a internação pode ser parcelado em até 12 vezes sem juros.

Em caso de demora, a orientação é reclamar aos órgãos de defesa do consumidor e, em último caso, recorrer à Justiça. 

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