Pesquisa
Idec analisa o desempenho dos canais de atendimento dos sete maiores bancos que atuam no Brasil e constata que uma em cada cinco reclamações não foi solucionada em 2021
A história a seguir parece de novela, mas é bem real. Aconteceu com a gerente de contas Luísa Cristina Moroni, 32 anos. Em 5 de julho de 2021, ela viajou para o Acre para passar quase um mês numa aldeia indígena. Quando chegou em Tarauacá, a 408 km de Rio Branco, e perguntou ao motorista da van onde era o caixa eletrônico do Santander ou 24 horas mais próximo, foi informada de que estes não existiam. Entrou então no aplicativo do banco, mas este tinha parado de funcionar, com a mensagem de que ela precisava comparecer a um caixa eletrônico para cadastrar sua digital e, assim, desbloquear a conta. "Fiquei desesperada, porque precisava de dinheiro, mas voltar para a capital seria muito complicado. São oito horas de viagem pra ir e oito para voltar. Além disso, custaria caro e atrapalharia meu cronograma", lembra Moroni.
Ela ligou para o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) do Santander, e a atendente lhe disse que o problema seria resolvido em cinco dias. "Precisei fazer um escândalo para ela reduzir o prazo para 48 horas. Três dias depois, recebi um SMS que dizia o que o próprio app já havia informado: "vá a um caixa do Santander ou 24 horas", ela conta. Sem dinheiro, a solução foi a mãe dela usar o limite de sua conta corrente para lhe enviar dinheiro.
Mas o perrengue não acabou aí. De volta a Rio Branco, conseguiu recadastrar sua biometria, mas mesmo assim o banco não autorizou a compra de uma passagem de avião. Então, Moroni não teve outra opção que não voltar para São Paulo de ônibus, numa viagem que durou três dias e meio. "Estou muito brava e quero uma reparação pelos danos materiais e morais sofridos", desabafa. Ela tem toda a razão. E infelizmente ela não está sozinha nessa. De acordo com um estudo do Idec que analisou o desempenho dos canais de atendimento, como SACs e ouvidorias, dos sete maiores bancos que atuam no Brasil – Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Bradesco, Santander, Itaú, BTG Pactual e Safra –, em 2021, um a cada cinco consumidores não teve seu problema solucionado. "Em se tratando de instituições financeiras, tendo em vista o desequilíbrio causado pelo poder econômico que elas têm, espera-se que os canais de atendimento aos consumidores respondam às demandas de maneira efetiva, com qualidade e celeridade", afirma Julia Dias, advogada do Programa de Serviços Financeiros do Idec e uma das responsáveis pela pesquisa.
PESSOAS X MÁQUINAS
O estudo evidenciou ainda que o investimento em tecnologias para a digitalização do setor – com os consumidores tendo de falar com máquinas e não com seres humanos –, após o início da pandemia, não resultou numa melhora no atendimento, muito menos na resolução dos problemas dos consumidores. "O investimento em tecnologia deveria refletir em aumento da capacidade de solução de problemas de consumo, mas não foi o que constatamos. A modernização traz comodidades, mas em caso de demandas mais complexas, o atendimento humano é mais efetivo. Sem esquecer que há pessoas sem acesso à tecnologia ou que não sabem usá-la", afirma Dias.
Com a digitalização e o aumento dos atendimentos online, agências e postos de atendimento presenciais estão sendo fechados, prejudicando consumidores vulneráveis, como idosos e pessoas das classes C, D e E. Dos sete bancos analisados, quatro fecharam filiais entre 2019 e 2021. "Foram fechadas 2.318 agências", informa Dias.
Dentre os bancos avaliados, Caixa, Bradesco e Santander foram os que demonstraram menor capacidade de implementar melhorias no tratamento das reclamações dos consumidores durante a pandemia. De acordo com os dados do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec) e do Banco Central avaliados, esses bancos solucionaram menos reclamações em 2020 e 2021, anos pandêmicos, do que em 2019, pré-pandemia. Bradesco e Caixa também tiveram queda no índice de solução das queixas registradas na plataforma Consumidor.gov.br, do Ministério da Justiça e da Segurança Pública, durante o período analisado. Porém, apesar de resolver menos demandas, a Caixa teve o segundo melhor desempenho, logo atrás do Itaú.
Pactual e Safra, por sua vez, apresentaram os piores desempenhos, tanto em 2019 quanto em 2021, mesmo tendo resolvido mais queixas registradas no Banco Central. "Portanto, o que vimos no estudo é que, durante a pandemia [2020 e 2021], os sete maiores bancos comerciais não demonstraram uma satisfatória adaptação às novas necessidades de atendimento dos consumidores, na medida em que a digitalização dos canais não foi capaz de melhorar os índices de solução de demandas observados até o momento", conclui Dias.
Saiba mais
Pesquisa na íntegra: https://bit.ly/3xIUnfu