Alimentando políticas
Há um ano, o projeto Alimentando Políticas procura tornar a linguagem de pesquisas científicas acessível para gestores públicos, ajudando-os a melhorar a alimentação dos brasileiros
Em 8 de abril de 2019 nascia um dos projetos queridinhos do Idec: o Alimentando Políticas. A ideia é fornecer a gestores públicos informações científicas confiáveis e em linguagem acessível, para que possam promover políticas públicas efetivas em prol da alimentação adequada e saudável. "Entregamos a informação 'mastigadinha' (ilustrada com infográficos, vídeos etc.), para os gestores públicos poderem propor leis/mudanças", conta Laís Amaral, nutricionista e pesquisadora do programa Alimentação Saudável e Sustentável do Idec. "No Brasil, o uso de evidências científicas para formulação de políticas ainda é extremamente limitado, ou porque os gestores não se interessam por elas ou porque pesquisadores não conseguem apresentá-las de forma que possam ser facilmente compreendidas", completa Rafael Moreira Claro, professor adjunto do departamento de Nutrição da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), parceira do Idec nesse projeto inovador.
Demorou meses para o site do Alimentando Políticas ficar pronto. Segundo Hélen de Freitas, analista de comunicação do Idec, foram feitas entrevistas com gestores públicos, jornalistas e membros do governo a fim de entender suas necessidades. O site também passou por vários testes antes de ser lançado. "A gente convidou algumas pessoas para navegar pelas páginas do Alimentando Políticas e fazer comentários, pois nosso plano era fazer um site rico em conteúdo, mas simples e compreensível", ela afirma.
E como missão dada é missão cumprida, após um ano, temos muito o que comemorar.
PESQUISAS TEMÁTICAS
Para que este projeto fosse concretizado, o Idec se cercou de parceiros importantes do meio acadêmico: ACT – Promoção da Saúde, Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (Nupens/USP), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e The University of Edimburgh (Universidade de Edimburgo).
Antes de serem incluídas no site, as pesquisas dessas instituições, feitas em parceria com o Idec, precisam ser publicadas em forma de artigo científico em revistas especializadas. Na página do Alimentando Políticas, elas estão agrupadas de acordo com o tema a que pertencem. Na seção "Ambiente alimentar", os internautas encontram as pesquisas "Quais alimentos as periferias brasileiras consomem? e "É fácil comprar alimentos em qualquer lugar da cidade?", ambas coordenadas pelo Nupens/USP; na seção "Publicidade de alimentos", a pesquisa "Compreendendo as preferências alimentares das crianças: qual a influência da publicidade?", do Nupens-USP e do Idec; em "Rotulagem de alimentos", a pesquisa "Advertência ou semáforo: qual é o melhor modelo de rotulagem de alimentos para o Brasil?", do Nupens/USP, da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e do Idec.
As seções "Alimentação saudável de verdade", "Preço de alimentos" e "Conflito de interesses" devem receber conteúdo em breve. A pesquisa "Estratégias político-corporativas e políticas de saúde no Brasil: o caso do Marco Legal da Primeira Infância", feita pela ACT e pelo Idec, entrará no espaço "Conflito de interesses". "O assunto 'conflito de interesses' é menos palpável para as pessoas, além de ser considerado tabu pela classe política, pelo menos os casos relacionados à corrupção. Por isso, foi preciso muitas conversas para definir a abordagem", declara Camila Maranha, pesquisadora da ACT.
EVENTOS PARA DIVULGAÇÃO
Quatro eventos foram realizados em 2019 para promover o projeto e as pesquisas realizadas. O lançamento do Alimentando Políticas aconteceu na 22a Marcha à Brasília em Defesa dos Municípios (mais conhecida como "Marcha dos Prefeitos"), que reuniu 9 mil prefeitos, vereadores, secretários municipais e assessores entre 8 e 11 de abril. Embora o nome seja "marcha", o evento lembra as grandes feiras de negócios, com estandes para venda de produtos e serviços, palestras e debates. Lá, a equipe do Idec distribuiu materiais informativos, explicou o projeto e tirou dúvidas dos visitantes sobre políticas relacionadas à alimentação.
Em agosto, o pesquisador neozelandês Boyd Swinburn, um dos maiores especialistas em saúde e alimentação do mundo, esteve no Brasil para apresentar e divulgar a versão em português do relatório The global syndemic of obesity, undernutrition and climate changes (A sindemia global da obesidade, desnutrição e mudanças climáticas), elaborado pela Comissão de Obesidade The Lancet. A tradução foi feita pelo Idec e lançada em eventos na Universidade de Brasília (UnB), em Brasília (DF), e na USP, em São Paulo (SP).
O seminário "Da ciência ao prato: políticas públicas para uma alimentação saudável" foi realizado em setembro. O objetivo era discutir com pesquisadores e gestores públicos assuntos como rotulagem, preço e publicidade de alimentos, acesso e informação da população sobre alimentação adequada e saudável e conflito de interesses. O evento foi mediado pelos jornalistas do site O Joio e o Trigo e contou com a participação de pesquisadores que apresentaram resultados de estudos e compartilharam experiências.
O último evento do ano foi o seminário "Regulação da rotulagem de alimentos: desafios para a América Latina", realizado em parceria com a Fundación InterAmericana del Corazón Argentina (FIC) e a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), com especialistas de países latino- -americanos, como Chile, Uruguai, Argentina e Brasil.
Saiba mais
Alimentando Políticas: http://alimentandopoliticas.org.br/
ALIMENTANDO POLÍTICAS EM JUNDIAÍ
O vereador de Jundiaí (SP) Faouaz Taha contou ao Idec como o Alimentando Políticas tem sido usado no município.
Qual a importância do Alimentando Políticas para Jundiaí (SP)?
Faouaz Taha: O Alimentando Políticas abriu inúmeras portas. Ele me ajudou a acompanhar legislações e medidas relacionadas à alimentação saudável e a fundamentar meu projeto de lei (PL) que estipula um limite de altura para exposição de alimentos ultraprocessados em gôndolas de estabelecimentos comerciais. Apresentei o PL no seminário "Da ciência ao prato: políticas públicas para uma alimentação saudável", organizado pelo Idec. Infelizmente, o projeto foi vetado após aprovação.
O município, que se empenha para oferecer merenda cada vez mais saudável, também acompanha os dados disponibilizados no site do projeto.
Quais políticas públicas já foram implementadas em Jundiaí?
FT: O governo municipal, em parceria com o Instituto Kairós, realiza um trabalho muito eficiente para facilitar o uso de plantas alimentícias não convencionais (PANCs) na merenda escolar. Também existe um programa de combate à obesidade infantil com incentivo ao cultivo de hortas para abastecimento de escolas municipais com verduras frescas.
E eu tenho um projeto de lei que prioriza os alimentos orgânicos nas merendas. Ele será discutido este ano.
O que você recomendaria a outros municípios brasileiros que gostariam de incentivar seus cidadãos a investirem numa alimentação adequada e saudável?
FT: Acredito que ainda temos muito a fazer, mas vejo Jundiaí como um exemplo por conta dos resultados obtidos. Toda medida pública que mexe com hábitos, culturas e consumo é sentida com mais profundidade em longo prazo, mas em meses já é possível perceber o interesse das crianças por alimentos saudáveis. Assim, eu recomendo que os municípios troquem experiências, busquem bons exemplos e se aproximem de instituições sérias como o Idec. Isso é importante para se encontrar soluções para os problemas relacionados à alimentação e nutrição.