A UNIÃO FAZ A FORÇA
Com o apoio de seus associados, o Idec conseguiu que R$ 1,7 bilhão fosse pago aos poupadores prejudicados pelos planos Bresser, Verão e Collor II. E após a assinatura do aditivo que prevê mais benefícios e prorroga o prazo de adesão ao acordo, esse valor certamente aumentará
A luta do Idec para recuperar os valores perdidos por milhões de brasileiros que foram prejudicados pelos planos econômicos implementados entre 1987 e 1991 estava prestes a chegar ao fim, em 12 de março. Contudo, a data final para adesão ao acordo firmado entre o Idec, a Frente Brasileira dos Poupadores (Febrapo) e a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) deve ser adiada para 2025 (o Supremo Tribunal Federal – STF – precisa homologar o aditivo assinado pelos envolvidos no acordo. Saiba mais sobre ele no quadro da página 20). Assim, o Idec continuará atuando em prol de seus associados, já que a prorrogação do prazo permite que poupadores (ou filhos, maridos, esposas e netos de poupadores falecidos) que ainda não aderiram avaliem melhor as condições do acordo. "Para o Idec, a prorrogação é benéfica, pois permitirá que mais pessoas sejam contempladas, já que haverá mais tempo para localizar e pagar poupadores que têm quantias a receber", afirma Carla Yue, gerente de desenvolvimento organizacional do Idec. E há muito o que se comemorar!
30 ANOS DE LUTA
Durante a década de 1990 e os anos 2000, os tribunais brasileiros reconheceram o direito à reparação dos prejuízos sofridos por quem tinha cadernetas de poupança na época dos planos econômicos Bresser (1987), Verão (1989) e Color II (1990). Assim, muitos cidadãos receberam indenizações. "O Idec pagou cerca de R$ 79 milhões a 4 mil associados. Além disso, um número incontável de consumidores em todo o Brasil beneficiou-se das Ações Civis Públicas (ACPs) vitoriosas do Instituto", informa Teresa Liporace, diretora executiva do Idec.
Infelizmente, nem todas as ações tiveram parecer favorável no Judiciário. Para piorar, no fim da década passada, os bancos ingressaram com a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 165 no STF, para extinguir todos os processos relacionados aos planos econômicos. Eles também entraram com recursos para tentar reverter, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), todas as decisões definitivas a favor dos poupadores. O resultado foi o retrocesso de aspectos já pacificados.
O STJ, num movimento liderado pelo ministro Luis Felipe Salomão, passou a adotar jurisprudência restritiva ao direito dos poupadores, dando novas interpretações para situações já bastante conhecidas. Por exemplo, em 2010, a Corte diminuiu de 20 para cinco anos o prazo para ingressar com ações civis públicas; e em 2015, reduziu em cerca de 70% o valor das indenizações a serem pagas aos poupadores, ao afastar a aplicação de juros remuneratórios (compensação paga a quem empresta o capital). O Idec reagiu. "Quando a ADPF 165 foi apresentada ao STF, o Instituto pediu ingresso como amicus curiae (amigo da Corte), reuniu-se com os ministros e realizou estudos jurídicos e econômicos que demonstraram que os argumentos dos bancos estavam equivocados. Além disso, mobilizou os consumidores em diversas campanhas", conta Christian Printes, advogado do Idec.
Enquanto o STJ reduzia as chances de um final feliz para os poupadores, a maioria dos ministros do STF mostrou-se sensível à manutenção dos direitos dos poupadores e da segurança jurídica gerada pelas decisões favoráveis ao longo dos anos. No entanto, o STF não concluiu nem o julgamento da ADPF 165 nem dos recursos extraordinários. Consequentemente, milhares de ações ficaram paralisadas.
ACORDO: A MELHOR SOLUÇÃO
Diante do imbróglio jurídico e das ameaças aos direitos dos consumidores que aguardavam há quase 30 anos uma solução definitiva para o caso, surgiu uma luz no fim do túnel: em 11 de dezembro de 2017 – após mais de um ano de negociações – o Idec, a Febrapo e a Febraban – mediados pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pelo Banco Central – selaram um acordo. Em 1o de março de 2018, o documento foi homologado pelo STF e começou a valer em 12 de março. "Na maioria dos casos, aderir ao acordo – mesmo que os valores negociados estejam abaixo do que gostaríamos – é mais vantajoso do que continuar brigando na Justiça, considerando as últimas decisões dos tribunais", opina Yue.
NÚMEROS DO ACORDO
2.823 associados aderiram ao acordo
(54% dos associados que participam dos processos)
38% dos associados já receberam
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R$ 1,7 bilhão foi pago pós-acordo a 113 mil poupadores brasileiros
R$ 48 milhões foram pagos a associados do Idec
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R$ 19,3 milhões devem ser pagos em breve
18% dos associados aguardam pagamento
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50 mutirões foram realizados para pagamento dos associados
Saiba mais:
Página especial sobre o acordo: https://bit.ly/2xq3xSz.
O acordo previa o ressarcimento a todos os poupadores prejudicados pelos planos Bresser, Verão e Collor II que ingressaram na Justiça com ações individuais ou que executaram sentenças de ações civis públicas ou coletivas dentro dos prazos legais, independentemente de vínculo com as associações signatárias. "Um acordo pressupõe que as partes envolvidas cedam em alguns pontos, e não foi diferente nesse caso. Mas como protagonista nessa árdua luta pelos poupadores contra instituições poderosas, o Idec assinou esse documento com a convicção de que, nesse contexto, ele era a melhor saída", argumenta Walter Moura, advogado do Idec em Brasília.
Maria Elisa F. Ragazzon, funcionária aposentada do Ministério Público, pertence ao grupo de associados do Idec que aderiu ao acordo. Na época do Plano Verão, ela tinha conta no banco Itaú. "Como eu confio no Idec, eu não contratei um advogado. E sou muito grata por tudo o que o Instituto fez", ela declara. "Doei parte do que recebi ao programa de rádio do apresentador Eli Corrêa, para que fosse comprada uma cadeira de rodas", completa. Já Willian dos Santos, engenheiro industrial aposentado, reconhece o esforço que o Instituto fez para que os poupadores lesados fossem ressarcidos. Entretanto, considera que ganhou muito pouco se comparado ao valor que esperava receber. "Eu não tive outra alternativa que não aderir ao acordo. Era isso ou não receber nada. Eu me sinto roubado pelos bancos", ele desabafa.
MAIS TEMPO E BENEFÍCIOS PARA OS POUPADORES
Em 11 de março de 2020, o Idec, a Febrapo, a Consif e a Febraban assinaram um aditivo que modifica o contrato do acordo de planos econômicos, firmado em março de 2018.
As principais mudanças são:
Inclusão das ações referentes ao Plano Collor I* e dos bancos do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer).
Prazo prorrogado até 2025;
Pagamento em uma única parcela;
Aumento dos honorários dos advogados;
Mais agilidade no processamento dos dados.
*Ressaltamos que o Idec não obteve sucesso na ação coletiva que visava ao ressarcimento do Plano Collor I
Após o acordo ter sido firmado, foram pagos R$ 1,7 bilhão a poupadores de todo o Brasil (48,4 milhões a associados do Idec). "E ainda tem mais de 19,3 milhões a serem liberados em breve para associados do Idec, porque a documentação já foi submetida aos bancos", adianta Yue. Para Marilena Lazzarini, fundadora do Idec e presidente do Conselho Diretor, o fato de o Instituto ter assumido essa luta foi determinante para que ela alcançasse tamanha dimensão. "O Idec sempre atuou com o apoio da imprensa, que foi fundamental para que os poupadores acompanhassem a evolução dos processos e se mobilizassem participando de campanhas e atos públicos, especialmente nos momentos em que os caminhos no sistema judicial se tornavam mais espinhosos", ela aponta. Yue conclui: "Se conseguimos alcançar esse resultado foi graças ao apoio que recebemos de nossos associados, que estiveram conosco durante essas três décadas, acreditaram em nosso trabalho e não desistiram apesar das adversidades".
O IDEC E OS PLANOS ECONÔMICOS
- 1990: Primeira ação judicial pedindo as diferenças do Plano Verão (1989) para quatro associados. O Idec entrou ainda com 120 mandados de segurança para desbloquear os valores retidos pelo Plano Collor I (1990) de 1.200 poupadores.
- 1993: Primeira Ação Civil Pública (ACP) – contra o Banco Mercantil –, para reparação dos prejuízos referentes ao Plano Verão.
- Fim dos anos 90: Após decisões judiciais reconhecerem o direito dos poupadores ao ressarcimento dos prejuízos com os planos Bresser e Verão, os bancos tentaram extinguir as ACPs do Idec, alegando que as cadernetas de poupança não caracterizavam relação de consumo e, por isso, o Instituto não seria parte legítima para defender os poupadores.
- 2001: O STJ reconheceu que as cadernetas de poupança configuram relação de consumo, mas os bancos recorreram ao STF, por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), para impedir que o Código de Defesa do Consumidor fosse aplicado a atividades bancárias. A Adin foi julgada em 2006 a favor dos consumidores.
- 2003: De acordo com os tribunais estaduais, as instituições financeiras não eram obrigadas a ressarcir os poupadores lesados pelo Plano Collor I. Diante das decisões desfavoráveis, o Idec não ingressou com ações para esse plano.
- 2008: A Febraban divulgou que indenizações decorrentes das ações do Plano Verão podiam chegar a R$ 100 bilhões, o que desequilibraria o sistema financeiro, e ameaçou entrar com ação para extinguir os processos. O Idec lançou manifesto contra o calote do Plano Verão e se reuniu com ministros do STF para defender os poupadores.
- 2009: A Confederação do Sistema Financeiro (Consif) ingressou com a ADPF 165 no STF para extinguir todos os processos sobre planos econômicos, alegando que os planos foram constitucionais. O Idec entrou no processo como amicus curiae e apresentou aos ministros um estudo jurídico demonstrando que a questão já havia sido pacificada a favor dos poupadores (Planos Bresser e Verão) e outro econômico retratando a plena capacidade dos bancos de pagar as diferenças sem comprometer sua liquidez; além de um abaixo-assinado com mais de 12 mil assinaturas contra a ADPF 165.
- 2010: O STF definiu quatro recursos extraordinários sobre planos econômicos. Assim, o que fosse decidido valeria para todas as ações semelhantes. A medida, concedida pelos ministros Gilmar Mendes e Dias Toffoli, paralisou todos os processos que não tinham decisão definitiva. O STJ reduziu de 20 para cinco anos o prazo para entrar com ACP.
- 2013: O Idec enviou petições ao STF pedindo julgamento da ADPF 165 e dos recursos extraordinários. Também entregou aos ministros mais de 20 mil assinaturas exigindo justiça. Em novembro, o Supremo iniciou o julgamento, mas não o conclui. O Idec, como amicus curiae, apresentou novo estudo econômico que reiterou que os valores informados pelos bancos (e endossados pelo Banco Central) eram falaciosos. Enquanto eles falavam em R$ 149,9 bilhões, o Idec calculou R$ 8,4 bilhões.
- 2014: Recurso judicial do Banco do Brasil no STJ tentou limitar a abrangência da ACP vitoriosa do Idec sobre o Plano Verão apenas a poupadores do Distrito Federal, desrespeitando a lógica da ação civil pública, que beneficia todos os consumidores do país. Os bancos também alegaram que só poderiam se beneficiar das ACPs do Idec associados que tivessem listados na petição inicial do processo (regra que não existe).
- 2015: Surgiram novos recursos para rever os cálculos das indenizações. Os bancos pediram revisão das regras sobre juros remuneratórios, expurgos inflacionários e juros de mora. Com isso, o poupador receberia cerca de um décimo do que lhe era devido. Em abril, o STJ acatou pedido dos bancos e retirou a aplicação de juros remuneratórios nos processos em que a sentença não previa expressamente a sua incidência até o pagamento pelo banco. Dessa forma, o valor da indenização foi reduzido em cerca de 70%.
- 2016: Idec, Febrapo e Febraban – com mediação da AGU – começam a discutir a viabilidade de um acordo para encerrar as disputas judiciais sobre planos econômicos.
- 2017: O STF confirmou que todos os poupadores têm direito de se beneficiar das ACPs do Idec. No entanto, o ministro Ricardo Villas-Boas Cueva retirou o caráter repetitivo dos recursos, determinando que eles fossem julgados isoladamente. Em 11 de dezembro, após mais de um ano de negociações entre representantes dos poupadores e dos bancos, o acordo foi celebrado e enviado para homologação do STF.
- 2018: O STF homologou o acordo. Com isso, começaram a correr os prazos para pagamento aos poupadores.
- 2020: Assinado aditivo que prevê mais benefícios aos poupadores e prorroga o prazo de adesão ao acordo.