Eleições 2018
Embora 2018 seja ano de Copa do Mundo, para os brasileiros, o evento mais importante será, certamente, as eleições. E considerando o atual cenário em que o País se encontra, com graves crises política e econômica, e descrédito dos cidadãos em seus políticos, será um pleito histórico. Em outubro, eleitores irão às urnas para escolher não apenas o presidente da República, mas governadores, senadores e deputados estaduais e federais.
E cabe à Justiça Eleitoral – representada pelo Tribunal Superior de Justiça (TSE) – garantir a democracia. Entrevistamos, por e-mail, o ministro Luiz Fux, presidente do TSE até agosto, sobre questões importantes a respeito da votação que está por vir: fake news, Lei da Ficha Limpa, financiamento de campanhas, entre outras. Confira a seguir!
Esta será uma eleição histórica. Quais os desafios do TSE diante do atual cenário?
Luiz Fux: Em meu discurso de posse, fiz questão de frisar que vivemos um momento especial e desafiador para o País. Especial porque, em 2018, mais de 140 milhões de cidadãos brasileiros caminharão para a arena democrática a fim de escolher, pelo voto livre, o projeto de nação para os próximos quatro anos. Desafiador porque teremos uma eleição presidencial que se pré-anuncia como a mais espinhosa e, porque não dizer, a mais imprevisível desde 1989. A imensa responsabilidade, portanto, é evidente. Mas é também essa responsabilidade que materializa minha realização como agente público.
Não é novidade dizer que existe uma crise no País. Existe, sim, um descolamento entre os cidadãos e a classe política. E isso é ruim para a democracia e para o Brasil. O Parlamento, numa democracia, deve ser a caixa de ressonância dos sentimentos de ética, justiça, igualdade e liberdade almejados pela sociedade. A crise de representatividade pela qual passa a democracia brasileira somente é passível de ser superada por meio do voto popular. Neste momento histórico, é dever da Justiça Eleitoral posicionar-se como copartícipe da sociedade em sua ânsia virtuosa de transformação do cenário sócio-político: de fazer do passado o símbolo do fim; e do presente, o símbolo do recomeço.
Uma autêntica democracia não pode prescindir de uma classe política proba e comprometida com os ideários republicanos e democráticos. Todavia, e com o otimismo que carrego em todas as áreas da minha vida, creio que essa crise seja efêmera e que vamos superá-la, resgatando a credibilidade e a confiança do povo brasileiro nas instâncias majoritárias.
Diante do cenário de incertezas e descrédito dos cidadãos nos políticos brasileiros, a possibilidade de abstenção e votos brancos e nulos é bastante alta. Como elevar a confiança dos eleitores e, consequentemente, incentivar a participação deles em outubro? O que o TSE está fazendo ou fará para conscientizar os cidadãos da importância do voto?
LF: O TSE realiza, em ano eleitoral, diversas campanhas, não só de convocação para o cadastramento eleitoral, mas para esclarecimento e chamamento do eleitor para participação nas eleições, com o intuito de mostrar a importância do voto consciente e do envolvimento dos cidadãos para os rumos do País.
Devido aos boatos mentirosos que têm surgido nas redes sociais, e que somente contribuem para o caos e a desinformação, o TSE fará campanha específica de conscientização dos cidadãos sobre a importância do voto. Queremos esclarecer a população sobre mitos como “a eleição será anulada se houver mais de 50% de votos nulos e brancos”. Se houver 50% ou mais de votos nulos, brancos ou abstenções, a eleição não será anulada. Esses são votos inválidos. Os candidatos são eleitos com votos válidos, independentemente do percentual desses votos.
Já temos uma campanha chamada “Mitos e Verdades” nas redes sociais, na TV e no rádio para esclarecer várias informações equivocadas que circulam por aí, principalmente em ano eleitoral. Além do programa “Políticos do Futuro” dirigido aos jovens eleitores.
UMA AUTÊNTICA DEMOCRACIA NÃO PODE PRESCINDIR DE UMA CLASSE POLÍTICA PROBA E COMPROMETIDA COM OS IDEÁRIOS REPUBLICANOS. TODAVIA, CREIO QUE ESSA CRISE SEJA EFÊMERA E QUE IREMOS SUPERÁ-LA
Como as chamadas fake news (notícias falsas) podem afetar as eleições?
LF: As eleições têm experimentado a luta entre a virtude e a ira. Os exemplos de eleições estrangeiras evidenciam que os competidores do prélio eleitoral preferem destruir a honra alheia por meio de notícias falsas, principalmente pela via digital, a revelar as suas aptidões e qualidades para melhorar o país.
Notícias falsas derretem candidaturas legítimas. Uma campanha limpa se faz com a divulgação das virtudes de um candidato, não com a difusão de atributos negativos que atingem irresponsavelmente os concorrentes.
Apesar disso, não pretendemos tolher a liberdade de expressão e informação legítima do eleitor. Liberdade de expressão é pressuposto para a viabilidade de qualquer regime que se intitule verdadeiramente democrático. O papel do TSE, portanto, é o de neutralizar comportamentos anti-isonômicos e abusivos.
Como o TSE pretende combater as notícias falsas?
LF: Não cabe ao Tribunal fazer monitoramento de notícias falsas que circulam nas redes sociais.
Empresas têm participado de reuniões conosco no âmbito do Conselho Consultivo sobre Internet e Eleições e se empenhado em contribuir com ações preventivas nas redes sociais. Assinamos, em junho, um memorando de entendimento em que essas empresas se comprometem com a verdade dos fatos e não proliferação de notícias falsas. Um dos pontos do acordo ressalta a necessidade de diminuir a possibilidade de replicação de práticas aptas a distorcer a liberdade do voto do eleitorado e a formação de escolhas conscientes por parte dos cidadãos.
Acreditamos que ações inéditas como essa, que também fizemos com partidos políticos, imprensa e marqueteiros, vão garantir condições mais saudáveis ao processo eleitoral. Aliás, a imprensa nos auxiliará na aferição da verossimilhança das notícias.
O seu mandato termina em agosto, antes das eleições. Como avalia sua atuação nesses quase quatro meses como presidente do TSE?
LF: Até aqui, conseguimos implementar todos os projetos propostos na posse: Academia da Democracia, Políticos do Futuro, Justiça Eleitoral Itinerante e Inclusão Legal.
Também assumimos a responsabilidade de aplicar, sem hesitação, a Lei da Ficha Limpa nas eleições de 2018, bem como combater as fake news. Fizemos um encontro internacional, em junho, em parceria com a União Europeia, no qual tratamos dos grandes desafios em relação ao mal que é a divulgação de notícias falsas e também compartilhamos experiências.
Uma brecha no artigo que trata da composição dos tribunais eleitorais diz que “juízes dos tribunais eleitorais, salvo motivo justificado, servirão por dois anos, no mínimo, e nunca por mais de dois biênios”. A expressão “salvo motivo justificado” daria margem para alongar seu mandato, de forma que fique à frente do TSE nas eleições. Qual a probabilidade de isso ocorrer?
LF: Nenhuma. A ministra Rosa Weber assumirá em 14 de agosto a Presidência do TSE.
Este ano, assim como nas eleições municipais de 2016, empresas não poderão financiar campanhas. Existe uma avaliação que mostre que esse novo modelo de financiamento impediu a prática de caixa 2?
LF: Não temos como aferir ainda o impacto das novas modalidades de financiamento (crowdfunding e fundo eleitoral), bem como do autofinanciamento e do uso do Fundo Partidário, que já existiam, mas que sofreram modificações com a reforma política, como o teto de gastos de campanha por cargo eletivo. Provavelmente, só teremos isso no ano que vem, quando forem prestadas as contas relacionadas ao ano de 2018 pelos partidos políticos.
Qual a chance de um candidato condenado em segunda instância e, portanto, impedido de ser eleito de acordo com a Lei da Ficha Limpa, concorrer em 2018?
LF: O que eu disse em julgamento recente [do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva] é que não tem sentido que um ano e meio depois se possa mudar a jurisprudência, porque a jurisprudência é um argumento da autoridade. E para se ter autoridade tem que se ter respeito. E um tribunal, para gerar respeito junto aos cidadãos, tem de se respeitar. Um tribunal que não se respeita perde a legitimação democrática. E no momento em que isso ocorre, ele perde o respeito, e se instaura a desobediência civil.
Como um homem que sofreu inquérito, foi denunciado e condenado entra presumidamente inocente? Você consegue entender isso? Eu não entendo.
O senhor afirmou que político “ficha-suja é irregistrável”, o que gerou certa polêmica, pois há quem defenda que a Lei das Eleições autoriza candidatura com recurso judicial. Por que o senhor afirmou isso?
LF: Uma candidatura sub judice não pode receber essa categorização se o político inelegível provocar a Justiça. Essa seria uma forma de burlar a lei. Assim, teríamos a provocação de um candidato inelegível para que a sua candidatura ficasse sub judice. Com isso, ele poderia concorrer.
Essa é minha opinião, mas, obviamente, eu tenho de ouvir o colegiado. Essa deliberação vai ser fruto de uma reunião.
Os candidatos ao Executivo são obrigados a registrar seu programa de governo. Contudo, muitos o encaram como mera burocracia, sem se comprometer de fato com o que colocam nesse documento. Há algo que o TSE possa fazer para que o programa de governo seja levado mais a sério?
LF: A entrega do programa de governo é um dos pré-requisitos para registro da candidatura, mas não cabe ao TSE qualquer tipo de cobrança a respeito do cumprimento do conteúdo ali elencado.
FAKE NEWS DERRETEM CANDIDATURAS LEGÍTIMAS. UMA CAMPANHA LIMPA SE FAZ COM A DIVULGAÇÃO DAS VIRTUDES DE UM CANDIDATO, NÃO COM A DIFUSÃO DE ATRIBUTOS NEGATIVOS DOS CONCORRENTES