Uma saída para os poupadores
Doze de junho de 1987; 15 de janeiro de 1989; 31 de janeiro de 1991. Essas datas possivelmente estão marcadas na memória de quem tinha caderneta de poupança na época em que foram instituídos o Plano Bresser, o Plano Verão e o Plano Collor II, respectivamente. Os famigerados planos econômicos mudaram os índices de correção da poupança e, uma vez que os bancos não creditaram corretamente as diferenças, causaram prejuízos aos poupadores. Do dia p ara a noite, milhares de brasileiros viram suas economias minguarem.
Três décadas depois, uma nova data ganha importância nessa história: 11 de dezembro de 2017. Nesse dia, representantes dos poupadores e dos bancos selaram um acordo que cria uma alternativa para aqueles que aguardavam o desfecho das disputas judiciais para ver a cor de seu dinheiro.
O Idec participou das negociações como elemento central para resguardar os interesses dos poupadores, considerando seu protagonismo na defesa de seus direitos ao longo desses quase 30 anos – sua primeira ação judicial sobre o tema foi proposta em 1990. Do mesmo lado da mesa, estava a Frente Brasileira pelos Poupadores (Febrapo), grupo que reúne representantes de entidades que também têm ações judiciais sobre planos econômicos. Do outro lado, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) e a Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif). E, como mediadora, a Advocacia-Geral da União (AGU), além do Banco Central, que supervisionou os trabalhos.
Chegar a um consenso não foi fácil. “As negociações duraram mais de um ano. As primeiras reuniões ocorreram em setembro de 2016. Procuramos a AGU, como um ente neutro, para mediar a conversa com os bancos. E fizemos isso porque, nos últimos anos, os direitos dos poupadores vinham sendo permanentemente atacados”, destaca Walter Moura, advogado do Idec em Brasília (DF) que participou diretamente das tratativas.
Na última década, o cenário tornou-se extremamente hostil aos poupadores, com seguidas decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) revendo a jurisprudência consolidada nos anos 90 e 2000. Entre elas, destaca-se a redução do prazo de prescrição de ações civis públicas (ACPs) de 20 para cinco anos, que “exterminou” cerca de 1 mil processos sobre planos econômicos, entre os quais todos os do Idec sobre o Plano Bresser. Dessa forma, embora o acordo seja válido para três planos econômicos, no caso das ações do Idec, apenas as do Plano Verão poderão ser contempladas, pois as do Bresser foram perdidas, e o Instituto não moveu ações sobre o Plano Collor II.
E O COLLOR I?
O acordo não inclui o Plano Collor I (1990), porque, diferentemente dos demais planos econômicos, há entendimento consolidado na Justiça de que os bancos não são responsáveis por ressarcir os poupadores lesados.
No mesmo ano em que esse enorme retrocesso veio à tona, 2010, milhares de processos foram paralisados pela Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 165) e assim se encontram até hoje, aguardando a conclusão do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). De lá para cá, novas ameaças continuaram a surgir no STJ, com recursos dos bancos para limitar a abrangência das ações que já haviam perdido e para reduzir o valor a ser pago – no que obtiveram êxito. Em 2015, a Corte retirou a aplicação de juros remuneratórios dos cálculos, diminuindo em cerca de 70% o valor das indenizações.
“Para quem vinha acompanhando de perto, o cenário tornava-se extremamente preocupante”, lembra Marilena Lazzarini, fundadora do Idec e presidente de seu Conselho Diretor. “Estávamos muito perto do ‘ganhar, mas não levar’. Se, de um lado, o direito do poupador foi amplamente reconhecido em todas as instâncias do Judiciário, depois de 2009 as decisões do STJ vieram paulatinamente reduzindo o espectro de potenciais beneficiários e, pior, vinham diminuindo drasticamente os valores devidos. Além disso, os processos estavam todos parados, aguardando decisões em recursos que tramitavam no Supremo. O acordo oferece uma saída para esse impasse”, ressalta.
A coordenadora executiva do Instituto, Elici Bueno, destaca também que, antes da negociação, houve muita resistência. “Lutamos contra todos os ataques nos tribunais e fora deles, com estudos jurídicos e econômicos, além de campanhas de mobilização. Mas percebemos que era preciso buscar uma alternativa para garantir o ressarcimento àqueles que esperavam há tantos anos e já estavam em idade avançada, ou mesmo aos herdeiros dos que morreram sem ver uma solução. A realização de um acordo era uma demanda de muitos associados”.
Nesse sentido, o dia 11 de dezembro marca o fim da agonia e da incerteza quanto aos resultados das ações judiciais para muitos poupadores, que, na maioria dos casos, poderão decidir se querem aderir ao acordo ou continuar brigando na Justiça. No entanto, para chegar ao fim da história de fato, com o pagamento das indenizações, ainda há algumas etapas que precisam ser cumpridas e procedimentos operacionais, realizados. Mas, agora, a espera tem prazo para acabar.
PRÓXIMOS PASSOS
O acordo sobre os planos econômicos foi o maior da história do Judiciário brasileiro, com a possibilidade de encerrar mais de um milhão de processos. Por ser inédito, a forma como as etapas seguintes à assinatura do documento deveriam ocorrer não foram totalmente definidas.
Por exemplo, para o acordo ter validade, é necessário que ele seja homologado pelo STF. Isso está posto nos termos do acordo, porém, não se sabia como nem quando o Supremo analisaria esse pedido. Uma semana após a assinatura, em 18 de dezembro, veio a notícia de que o ministro Dias Toffoli havia iniciado o processo de homologação para dois recursos extraordinários dos quais é relator, após receber parecer favorável da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Além de Toffoli, outros dois ministros têm processos relacionados aos planos econômicos sob sua relatoria: Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. Ambos também já pediram parecer à PGR sobre a homologação, mas o Judiciário entrou em recesso sem que esse processo fosse concluído em 2017. Os ministros retomam suas atividades em 2 de fevereiro. “A posição favorável de Toffoli é um bom sinal, que indica que o Supremo acolheu de forma positiva a proposta de acordo e estimula as partes envolvidas a continuarem os trabalhos operacionais para as próximas etapas”, ressalta Moura.
Esses trabalhos envolvem a criação de uma plataforma virtual unificada, por meio da qual todos os poupadores interessados farão sua habilitação para receber o pagamento, seguindo um cronograma que privilegia os mais idosos. “Esse sistema está sendo desenvolvido com o objetivo de oferecer um ambiente seguro e evitar fraudes. Estamos acompanhando de perto o processo”, aponta o advogado do Idec. Após o poupador manifestar seu interesse em aderir por meio dessa plataforma, os bancos terão prazo de 60 dias para conferir os dados e os documentos fornecidos pelos poupadores e validar sua participação.
Antes disso, contudo, também é necessária a adesão formal dos bancos ao acordo, o que pode ocorrer em até 90 dias da assinatura do documento – até meados de março, portanto. Os termos firmados preveem que as condições são aplicáveis a todas as instituições financeiras, mas como foi assinado apenas pelas entidades que as representam – a Febraban e a Consif –, é preciso que cada banco, individualmente, manifeste interesse em aderir. “Só após finalizar o prazo de adesão dos bancos é que será possível saber quais ações judiciais serão contempladas pelo acordo”, explica Moura.
CRONOGRAMA PARA HABILITAÇÃO
- A habilitação dos poupadores será liberada por lotes, de acordo com seu ano de nascimento, privilegiando os mais idosos.
- O primeiro dos 11 lotes será aberto para os nascidos até 1928, ou seja, os que já têm ou completam 90 anos em 2018.
- Ficarão para o final os herdeiros e inventariantes de poupador falecido (10º lote) e os que entraram com execução em 2016, independentemente da idade (11o lote).
ETAPAS A CUMPRIR
1. Homologação pelo STF
Para começar a valer, o acordo precisa ser homologado pelo STF. O processo já foi iniciado, com a homologação para dois recursos extraordinários pelo ministro Dias Toffoli. Porém, ainda é preciso que outros dois ministros, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, façam o mesmo. O Supremo entrou em recesso e volta às atividades em 2 de fevereiro.
2. Adesão formal dos bancos
Os bancos têm prazo de até 90 dias para manifestarem oficialmente interesse em aderir, a partir da data de assinatura do acordo. Só após finalizar o prazo de adesão dos bancos é que será possível saber quais ações judiciais serão contempladas pelo acordo.
3. Habilitação de poupadores
Após a homologação pelo STF, a habilitação dos poupadores deve começar em 90 dias. Os interessados terão de se habilitar em uma plataforma online unificada, conforme cronograma previsto nos termos do acordo, que privilegia os mais idosos.
4. Validação pelos bancos
Feita a habilitação, os bancos terão 60 dias para conferir os dados e documentos fornecidos pelos poupadores e validar sua participação.
TERMOS DO ACORDO
O acordo será válido para todos os poupadores ou seus herdeiros, desde que eles tenham entrado na Justiça com ação individual ou execução de ação civil pública até 31 de dezembro de 2016.
Outra condição é que as ações tenham sido propostas dentro dos prazos de prescrição fixados pela Justiça: até 20 anos da data de edição do plano econômico no caso de ação individual; e até cinco anos no caso de ACP. O prazo quinquenal para a ACP vale tanto para a propositura da ação (contado da edição do plano econômico) quanto para o início do processo de execução (contado da data da decisão que possibilitou a execução provisória ou definitiva).
O documento fixa critérios bem claros para o valor a ser pago, com a aplicação de fatores de multiplicação sobre o saldo das cadernetas na época dos planos econômicos, na moeda então vigente.
O pagamento será feito à vista e de forma integral para indenizações de até R$ 5 mil; acima deste montante, haverá descontos progressivos, e o pagamento poderá ser parcelado. O prazo para os bancos começarem a pagar é de 15 dias após a validação da homologação; as demais prestações devem ser pagas até o último dia de cada semestre, com correção monetária.
QUANTO VOU RECEBER?
Para o Plano Verão – único contemplado nas ações do Idec –, o fator de multiplicação fixado no acordo é 4,09818. Assim, para saber quanto vai receber, o poupador deve multiplicar o saldo que tinha na caderneta em janeiro de 1989 (em Cruzados Novos – NCz$) por esse fator.
SALDO DA CADERNETA (NCz$) x 4,09818
ASSOCIADO: ATENDIMENTO NA HORA CERTA
O Idec tem sido procurado por muitos associados interessados em participar do acordo. Porém, a adesão depende da conclusão de etapas e procedimentos operacionais previstos no documento (saiba mais na página 19). Enquanto isso não ocorre, não é preciso comparecer à sede da instituição.
Não se aflija. Nesse meio tempo, o Idec está planejando procedimentos para atender aos associados de forma individualizada e em grupos. Tão logo eles sejam definidos, as orientações e a agenda de atendimentos serão amplamente divulgadas.
ATUALIZE SEU CADASTRO!
Para organizar esses atendimentos, é fundamental que os dados cadastrais dos associados estejam em dia. Em dezembro, o Idec enviou e-mail solicitando atualização Se você participa de ações do Plano Verão e não atualizou seus dados, faça isso até 16 de fevereiro no site do Idec (www.idec.org.br/planos-economicos).