Regras parcialmente cumpridas
Em vigor há quatro meses, regulamento dá novos direitos aos usuários de telecom, mas não é totalmente respeitado pelas operadoras de celular. Informação é a principal falha.
Há anos o setor de telecomunicações está entre os que mais levam o consumidor a reclamar aos Procons e também ao Idec. Em resposta à montanha de queixas, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) publicou, em março deste ano, o Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Comunicação (RGC) por meio da Resolução no 632/2014, com novas regras para os serviços de telefonia fixa e móvel, internet fixa e móvel e TV por assinatura. Até então, cada um deles seguia regulamentos separados.
A maioria das normas do novo regulamento já está valendo desde julho, outras só entrarão em vigor em 2015 e 2016. De forma geral, o Idec considera o RGC um avanço na proteção dos consumidores de telecomunicações. "Um regulamento comum para todos os serviços é uma inovação interessante”, considera Veridiana Alimonti, advogada do Idec e especialista em telecom.
Ok, a resolução foi aprovada. Mas o que interessa aos consumidores é que ela seja devidamente cumprida pelas empresas. Por isso, o Idec fez uma pesquisa para avaliar se algumas das principais regras já em vigor estão sendo respeitadas pelas cinco maiores operadoras de telefonia móvel – Claro, Nextel, Oi, Tim e Vivo. Os aspectos avaliados foram: se há informação adequada no site e durante a contratação do serviço na loja; retorno da ligação pelo atendente do Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) em caso de queda da chamada; envio do número do protocolo da chamada interrompida; e efetividade do cancelamento automático (sem falar com um atendente).
O Idec encontrou problemas em todos os itens avaliados, mas o direito à informação na contratação, previsto nos artigos 50 e 51, foi de longe o mais desrespeitado. Todas as operadoras descumpriram dispositivos que visam a garantir informação mais clara e adequada para o consumidor. "Mesmo após a aprovação do RGC, a qualidade da informação fornecida aos consumidores ainda deixa muito a desejar, tanto no site das empresas quanto nas lojas”, constata Alimonti, a responsável pela pesquisa.
A pesquisa, feita com o apoio da Fundação Ford entre agosto e outubro, teve como objetivo verificar se as cinco maiores operadoras de telefonia móvel do país — Claro, Nextel, Oi, Tim e Vivo — estão cumprindo algumas regras importantes previstas na Resolução nº 632/2014 da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
O levantamento envolveu visita ao site das operadoras e contratação de um plano na loja das operadoras ou por telefone para analisar se o direito à informação é respeitado; ligação para o SAC, a fim de verificar se o atendente retorna a ligação quando a linha cai e se envia o número de protocolo da chamada interrompida por SMS; e teste de cancelamento automático do plano contratado.
INFORMAÇÃO QUE É BOM, NADA
Os pesquisadores do Idec foram às lojas das operadoras – com exceção da Nextel, em que a contratação foi por telefone – para adquirir um Plano Controle (um misto de pré e pós-pago) e, assim, avaliar se os atendentes fornecem as informações obrigatórias e se entregam os documentos previstos no regulamento: sumário da oferta, regulamento da promoção (no caso desse tipo de oferta), contrato de prestação de serviço e termo de adesão.
Durante a contratação, nenhum atendente forneceu todas as informações exigidas. "Algumas só foram dadas após provocação do pesquisador, como custo da ligação para outras operadoras, velocidade do pacote de internet e condições de ligações em roaming. Esses dados precisam ser informados espontaneamente pelo vendedor, pois o consumidor comum nem sempre os questionará”, pontua Veridiana Alimonti.
Se o cliente não tivesse sido informado verbalmente pelo atendente, mas tivesse recebido os documentos com informações do plano contratado, menos mal. Mas nem isso. O único documento entregue nas lojas foi o termo de adesão, que não contém de forma completa as condições da prestação do serviço. A exceção foi a Tim, que entregou também um folheto explicativo, mas que igualmente não traz todas as informações exigidas.
Todos os termos de adesão contêm previsões abusivas. Grande parte deles, por exemplo, afirma que o consumidor conhece e concorda com todos os documentos associados ao plano (mas esses documentos não foram disponibilizados, lembra?).
Segundo Elisa Vieira Leonel, superintendente de relação com consumidores da Anatel, a agência acompanha e fiscaliza o cumprimento do regulamento. "No caso de descumprimento, vale a regra geral de sanções da agência: a análise dos casos considera diversos fatores, entre eles se as infrações foram pontuais ou generalizadas, quantos consumidores foram prejudicados e se a empresa agiu rapidamente para corrigi-las. As sanções podem variar de advertência a multa, dependendo da extensão e da gravidade da infração”, explica.
De acordo com o artigo 50 do novo regulamento, antes da contratação, devem ser claramente informadas ao consumidor todas as condições do serviço, em especial:
- Preços e tarifas, com e sem promoção
- Período promocional
- Datas e regras de reajuste
- Restrições à utilização do serviço
- Limites de franquia de dados e condições aplicáveis após a sua utilização
- Velocidades mínima e média de conexão
- Viabilidade de instalação imediata, ativação e utilização do serviço
- Incidência de fidelização, período e valor da multa em caso de rescisão antes do término do prazo.
DETALHAMENTO POUCO ATRATIVO
O RGC também estabelece que todos os planos comercializados pela operadora devem constar de uma lista disponibilizada em seu site e que é preciso ter um atalho para ela na página inicial. Essa lista deve apresentar o nome e o número do plano registrado na Anatel. A Nextel foi a única que cumpriu a exigência de indicar o link para o rol de planos por nome (sem indicação de número) na home page. Entre as outras operadoras, quando há, o link fica na página de oferta de cada serviço.
Além disso, o formato dessas listas não é muito atrativo. "Elas servem mais para quem já tem um plano e quer fazer uma consulta, mas podem assustar quem está pesquisando para adquirir um plano pela quantidade de opções e informações”, opina Alimonti.
Outro problema dessas listas, segundo a advogada do Idec, é que as operadoras misturam os planos "normais” com os promocionais, confundindo o consumidor, que pode adquirir uma promoção sem saber que as condições contratadas vão expirar. "Essa é uma prática reiterada das empresas, que omitem o caráter promocional dos planos comercializados”, alerta.
O regulamento obriga, ainda, que as operadoras apresentem em sua página na internet um descritivo ou sumário da oferta, que nada mais é do que um resumo das condições do plano. Todas as empresas apresentam esse descritivo, mas nenhum deles é completo, com todas as informações previstas. Além disso, na maior parte das vezes eles ficam escondidinhos. O sumário da Oi foi o que mais se aproximou do ideal. Mesmo assim, seu link não estava na página principal da oferta.
Uma liminar obtida pela Associação Brasileira de Televisão por Assinatura(ABTA) suspende a aplicação de alguns artigos do RGC para as prestadoras de TV paga associadas à entidade (a maioria do mercado). As principais regras que as operadoras de TV estão desobrigadas de cumprir são:
- direito de que qualquer pessoa, cliente ou não, possa aderir às promoções da operadora;
- reajuste na mesma data dos serviços incluídos em um combo;
- proibição à cobrança antecipada nos planos pós-pagos.
CANCELAMENTO AUTOMÁTICO, MAS ENROLADO
Só de pensar em cancelar um serviço por telefone dá aquela preguiça. Afinal, os atendentes do SAC fazem de tudo para o interlocutor desistir de seu propósito. Para acabar com esse problema, a Anatel incluiu no RGC a determinação de que a operadora ofereça a possibilidade de cancelamento do serviço sem falar com um atendente.
Na pesquisa, a rescisão automática do plano foi efetivada em todas as operadoras, mas não com facilidade. Ao ligar para a Claro, a primeira opção de cancelamento oferecida no menu é a de “cancelar com um atendente”. Depois, há um silêncio de cinco segundos e só então é dada a opção “cancelar sem contato com atendente”. “Essa demora induz o consumidor a escolher a primeira opção, porque ele não necessariamente sabe que a de cancelamento automático virá a seguir”, destaca a advogada do Idec.
Quem resiste ao silêncio e opta pelo cancelamento automático pode ficar em dúvida se esse é realmente o melhor caminho, já que a mensagem após essa opção tem tom razoavelmente ameaçador: “Prezado cliente, esta solicitação pode gerar multa para você. Além disso, pode haver informações importantes sobre o cancelamento que só podem ser fornecidas por um atendente”. “É como se a operadora dissesse ‘você tem certeza de que quer fazer isso?’ O tom da gravação deixa o consumidor inseguro sobre se deve fazer o cancelamento automático”, diz Alimonti.
O prior problema em relação ao cancelamento, porém, foi o fato de a Oi e a Vivo cobrarem o valor integral da mensalidade do plano cancelado, não o proporcional ao período utilizado, como deveria ser. Na Oi, pelo menos, o serviço foi mantido até o final do ciclo de faturamento. Já na Vivo, o consumidor paga o preço integral e o serviço é cortado no prazo do cancelamento automático (dois dias úteis após a solicitação).
Para complementar a pesquisa sobre a efetividade do regulamento, o Idec enviou para os assinantes de seu boletim um questionário online sobre as novas regras dos serviços de Telecom. A ideia era saber as experiências dos consumidores que já tinham deparado com algumas das condições recém-implementadas. No total, houve 790 respostas, divididas entre as diversas perguntas do questionário. Os resultados foram publicados no site do Idec. Confira aqui.
OPS, A LINHA CAIU
Outro aborrecimento comum com o SAC acontece quando se está falando com um atendente e a linha cai. Ao ligar novamente, é preciso contar toda a história de novo, já que nem sempre o número do protocolo é informado no início da ligação. O regulamento também tenta eliminar esse problema ao prever que, em caso de queda da chamada, a prestadora deve retornar imediatamente a ligação ao consumidor.
De acordo com a Anatel, “imediatamente” significa até cinco minutos. Contudo, três operadoras não retornaram a ligação interrompida: Claro, Nextel e Tim. As operadoras também devem enviar por SMS o protocolo da ligação que caiu. A única que não cumpriu esse quesito foi a Claro.
Matéria sobre as principais regras do novo regulamento, publicada na edição nº 190: http://goo.gl/sSgGY6
Respostas das operadoras
Claro: diz que tem trabalhado para atender o RGC dentro do prazo e salienta que as questões da pesquisa foram internalizadas nas áreas envolvidas.
Oi: afirma que está implementando as mudanças exigidas pelo regulamento e destaca que parte das novas regras demanda muitas alterações nos sistemas operacionais da companhia, por incluírem todos os produtos e serviços.
Tim: informa que as ofertas de telefonia fixa no site não se referem à promoção e que, para a banda larga fixa, todas as informações exigidas constam do site, mas não estão centralizadas em um único local. Sobre a não entrega de documentos na contratação, alega ter enviado comunicados às lojas orientando sobre essa exigência. Em relação ao não retorno da ligação, responde que identificou uma falha operacional nesse caso e que está se empenhando para mitigá-la.
Vivo: contesta vários pontos criticados pelo Idec sobre a ausência ou baixo destaque às informações exigidas pelo RGC. Conclui que cumpriu com as obrigações do artigo 50 da resolução, considerando que algumas informações não foram prestadas espontaneamente, mas sob provocação da pesquisadora. Em relação à cobrança do valor do plano após o cancelamento, responde que tal regra está prevista no contrato e é informada no site da operadora.
Nextel: destaca que os principais dados sobre o plano foram verbalizados pelo atendente durante a contratação e que a pequena parte de informações não fornecidas foi encaminhada por e-mail. Sobre o não retorno da ligação, diz que ainda não tem uma solução automática nas centrais de atendimento. Assim, o retorno é feito manualmente, o que pode acarretar em erros por parte dos atendentes.