Um lar para chamar de seu
Escolher uma casa de repouso requer muita atenção. Veja dicas de especialistas sobre o que observar para garantir o bem-estar do idoso
Foi com dor no coração que, há dois anos, a corretora de imóveis Sandra Sato*, de São Paulo (SP), levou sua mãe, de 96 anos, para um Instituição de Longa Permanência para Idosos (Ilpi) – nome oficial das residências destinadas a pessoas a partir de 60 anos de idade (são os antigos asilos, hoje chamados popularmente de casas de repouso). "Minha mãe morou comigo por 10 anos, mas nos dois últimos a situação se complicou: ela parou de andar, passou a usar fraldas e tinha dificuldades para dormir. Mesmo com a ajuda de uma cuidadora, não dávamos conta. Não teve outro jeito", desabafa Sato.
O administrador de empresas e associado do Idec Cláudio Viveiros, também de São Paulo, passou pelo mesmo dilema em 2012. Seu pai, então com 90 anos, sofria de Mal de Alzheimer há vários anos. Quando ele teve uma infecção no pé, porém, a situação se agravou. "Nem eu nem a minha mãe tínhamos condições de cuidar dele em casa, porque ele não nos deixava fazer os curativos. Depois de muita conversa, eu e meu irmão optamos por uma casa de repouso indicada por um amigo", diz Viveiros.
Essas duas histórias refletem a dificuldade que muitas famílias têm de decidir levar seus idosos a uma instituição de longa permanência. O sentimento de culpa e a sensação de abandono são bastante comuns. "Nós, latinos, ainda temos preconceito com as Ilpis, mas, se for para o bem do idoso e da família, é uma alternativa válida", opina Omar Jaluul, geriatra do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
Embora o mais comum seja a família decidir pela internação de pais e outros familiares, as instituições também abrigam muitos idosos autônomos, que optam por viver nesses locais por não querer dar trabalho aos parentes ou por buscar a companhia de outras pessoas da mesma faixa etária, por exemplo. Seja de quem for a decisão, escolher uma casa de repouso requer muita atenção. Veja, a seguir, dicas de especialistas para fazer uma boa escolha.COMO ESCOLHER
De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2012, há 24,85 milhões de pessoas com 60 anos ou mais no Brasil (12,6% da população). O aumento da população idosa, aliado ao fato de que hoje a maioria das mulheres – antes responsáveis pelos cuidados domésticos e dos familiares mais velhos – está no mercado de trabalho, tem feito surgir muitas novas Ilpis.
De acordo com a Promotoria de Justiça do Idoso do Ministério Público de São Paulo (MP-SP), existem 370 casas cadastradas no órgão de Vigilância Sanitária Municipal na capital, entre instituições públicas, filantrópicas e particulares. No Brasil, o número é de cerca de 5 mil, segundo dados da Associação das Casas de Repouso para Idosos do Estado de São Paulo (Acresp). No entanto, Claudia Beré, promotora de Justiça do Idoso do MP-SP, alerta que há um alto número de casas clandestinas.
Escolher uma casa de repouso exige tempo e dedicação. Antes de decidir, Sato visitou instituições durante dois meses. Viveiros foi a quatro em 45 dias. A corretora acabou optando pela mais próxima de sua residência, na Vila Mariana, a qual abriga muitos idosos lúcidos e também vários de origem japonesa, como a sua mãe. Beré considera a proximidade com a residência da família um critério importante, pois visitar o idoso frequentemente ajuda a manter os laços afetivos. "A família que leva um idoso a uma Ilpi transfere à entidade apenas o dever de cuidado, mas continua incumbida de dar a ele suporte emocional por meio de visitas, telefonemas e passeios", diz a promotora.
O geriatra Jaluul recomenda que a família procure referências do local na internet, com parentes de pessoas que moram lá e com os próprios idosos. Conversar com o médico responsável pela casa também é imprescindível. "É muito importante que haja sintonia entre o médico particular do idoso e o da instituição."
• A regularidade do cadastro no órgão de Vigilância Sanitária Municipal. Em São Paulo, a consulta pode ser feita no site da Coordenação de Vigilância em Saúde (Covisa): http://goo.gl/Z6tVOb
• O número de funcionários e o de idosos e a variedade da equipe de profissionais: a casa deve contar com enfermeiro, técnicos e auxiliares de enfermagem, cuidadores e nutricionista. O responsável técnico pela casa deve ter curso superior.
• O horário de visitação (desconfie se ele for restrito).
• As condições de higiene dos quartos, banheiros, cozinha e área comum.
• A realização de atividades culturais, terapêuticas e de lazer que estimulem a autonomia do idoso. "Não é aceitável que o único lazer seja a televisão. Bingo, jogos de tabuleiro e atividades físicas são algumas opções", sugere Beré, do MP-SP.
• O cardápio, que deve ser elaborado por um nutricionista. A alimentação deve ser variada e suficiente; não é normal que o idoso perca peso.
• A acessibilidade da casa: evite locais com escadas ou com muitos andares.
• A existência de barras de segurança, principalmente nos banheiros.
• O contrato de prestação de serviços, que deve ser claro e o mais informativo possível.
DIREITOS DOS IDOSOS
As instituições para a terceira idade devem seguir as regras previstas na Resolução nº 283/2005 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), assim como respeitar os direitos garantidos pelo Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003) – que prevê o direito à moradia digna, seja junto à família ou em instituição específica, por exemplo – e pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).
Uma condição básica que deve ser garantida aos idosos lúcidos que vivem numa casa de repouso é o direito de ir e vir. "As instituições não são prisões. Portanto, se ele for autônomo, pode sair, sozinho ou na companhia de familiares e amigos, bem como receber visitas e telefonemas de quem desejar, independentemente de autorização de qualquer familiar", explica Claudia Beré.
Assim como em qualquer prestação de serviço, a Ilpi precisa fornecer um contrato, que deve ser o mais informativo e claro possível. Ele deve indicar o tipo de acomodação; dar detalhes sobre as refeições (quantas são, se são preparadas no próprio local ou compradas fora etc.); e especificar os serviços que não estão incluídos na mensalidade, por exemplo.
Mas nem todas as instituições respeitam a lei na hora de formular o seu contrato. O resultado é uma quantidade enorme de cláusulas abusivas. Sato pagou uma 13ª mensalidade em dezembro, cobrança considerada abusiva. "Esse custo não pode ser passado ao consumidor. Uma cláusula que estabeleça tal cobrança é nula de acordo com o artigo 51 do CDC", orienta Mariana Alves Tornero, advogada do Idec.
A instituição onde o pai do associado Viveiros passou apenas 12 dias (ele teve uma pneumonia e faleceu no hospital) também cometeu abusos. "Quando fui buscar os pertences do meu pai, uma funcionária disse 'Nós não devolvemos o valor que o senhor já pagou'. Achei muito insensível", comenta. O CDC considera nula a cláusula que determine que os valores já pagos não sejam devolvidos caso o idoso desista de permanecer na casa ou faleça. "O pagamento deve ser proporcional ao tempo em que o serviço foi utilizado", observa Beré.
Qualquer irregularidade em uma Ilpi pode ser denunciada aos órgãos fiscalizadores – Vigilância Sanitária, Ministério Público e Conselho Nacional dos Direitos do Idoso – e também ao Procon. "Algumas pessoas não denunciam porque têm medo de retaliação, mas a denúncia pode ser anônima, por meio do Disque 100", informa a promotora.
Cuidados em casa
Os cuidadores de idosos são uma alternativa às casas de repouso. Mas, antes de contratar um profissional, também é preciso pesquisar bastante. "O cuidador deve ser paciente, tolerante, ter bom condicionamento físico e conhecimentos técnicos – saber dar banho, alimentar etc.", recomenda Lidia Nadir Giorge, presidente da Associação de Cuidadores de Idosos de São Paulo (Acirmesp). Ela destaca ainda a importância de solicitar ao profissional o certificado do curso e pedir referências sobre sua experiência anterior.
NA PONTA DO LÁPIS
A questão financeira é um fator importante na hora de escolher entre uma Ilpi e um cuidador. Enquanto a mensalidade em uma instituição para idosos privada custa, em média, R$ 3 mil por mês (mas pode chegar a R$ 8 mil), de acordo com o tipo de acomodação (individual ou compartilhada) e dos serviços oferecidos, o salário de um cuidador é de R$ 1.800, em média.
Contudo, é preciso colocar na conta os custos trabalhistas, adicionais noturnos e outros benefícios; os remédios utilizados pelo idoso; e as adaptações que podem ser necessárias na residência, como rampas para cadeiras de rodas, instalação de barras de apoio no banheiro e corrimão nas escadas, elevação do vaso sanitário etc.
SAIBA MAIS
• Cartilha do Idoso, da Defensoria Pública de São Paulo: http://goo.gl/Jx04bp