Celular: mantenha distância
Especialistas dão dicas para reduzir a exposição à radiofrequência emitida pelo aparelho, a fim de prevenir riscos para a saúde
Sob o olhar geral da sociedade, o uso disseminado do telefone celular é um sinal dos tempos, o emprego de uma tecnologia que facilita sua vida e que não parece oferecer riscos. Muitos estudos demonstram isso mesmo: que faltam provas para a relação entre celular e problemas de saúde, como enxaquecas, vertigem, tumores nas glândulas salivares ou câncer no cérebro. Aos olhos de um desconfiado, no entanto, a história deixa uma pulga atrás da orelha. Não levou décadas até que a indústria de cigarros parasse de negar que seu produto provocava sérios danos ao organismo?
Por enquanto, não há consenso sobre as implicações do uso do celular, que se popularizou há pouco mais de 20 anos e que nos últimos dez se intensificou brutalmente. Os estudos e números divergem entre si, e tampouco é fácil para o cidadão saber os interesses por trás de cada pesquisa ou qual foi a metodologia de cada uma. Ainda assim, no dia a dia, é possível adotar medidas preventivas no uso do telefone celular.
A principal delas, defendida por estudiosos, ONGs e ativistas, é: mantenha o celular longe do seu corpo. Veja essas e outras dicas a seguir:
1. Fale por meio do viva voz ou do fone de ouvido com microfone, e não toque no aparelho enquanto estiver falando
Segundo o professor Álvaro Augusto de Almeida Salles, do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e um dos maiores especialistas sobre o assunto no país, essa é uma forma de reduzir substancialmente nossa exposição à radiação eletromagnética, emitida pela antena do aparelho. "A distância é nossa amiga", diz. Para ele, o fone de ouvido é o "cinto de segurança" do celular. Até os fabricantes de alguns telefones recomendam mantê-los distantes, como no caso do manual de uma grande marca, que diz que o aparelho deve ficar "a pelo menos 15 mm do corpo" — "para certificar-se de que a exposição humana à energia de radiofrequência não excede às diretrizes".
2. Não guarde o aparelho no bolso ou próximo à cama, ao dormir
Quando ligado, ainda que não esteja em uso, o aparelho continua a emitir sinais para se conectar com as torres próximas. Isso significa que está havendo emissão de radiação e que é melhor mantê-lo distante. Se o celular faz as vezes de despertador na sua casa, você pode tanto deixá-lo longe da cama quanto apenas configurá-lo para o modo avião. No caso de alguns aparelhos, é possível desligá-lo e, na hora programada, o despertador será acionado automaticamente.
3. Limite a quantidade e a duração das chamadas
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), trata-se de mais uma maneira de diminuir a exposição à radiofrequência. "O tempo é nosso inimigo", complementa Salles, da UFRGS.
4. Em casa ou no trabalho, dê preferência ao telefone fixo
Diante de facilidades como os descontos para falar com celulares da mesma operadora, ou como o fato de muitas empresas fornecerem uma linha móvel para seus funcionários, muita gente não usa o telefone fixo faz tempo. Mas vale a pena resgatá-lo.
5. Prefira se comunicar por mensagens de texto
"Os celulares emitem menos radiação quando enviam mensagens do que quando fazem chamadas de voz", diz o Guia de Uso mais Seguro do Celular, da Environmental Working Group (EWG), uma importante organização americana que pesquisa e divulga questões relacionadas ao meio ambiente e à saúde das pessoas. Além disso, é mais uma maneira de evitar colocar o aparelho grudado na orelha para fazer uma ligação.
6. Faça ligações somente quando o sinal está forte
"Sinal fraco aumenta a potência do celular e, assim, a absorção de radiação", afirma a física Denize Francisca da Silva, doutoranda pela Fundação Oswaldo Cruz na Bahia (Fiocruz-BA). Segundo a OMS, as áreas dotadas de boa cobertura permitem que o aparelho se comunique com potência reduzida.
7. Limite o uso do aparelho por crianças ou adolescentes
O impacto do uso do celular no organismo dos mais jovens é maior pelas seguintes razões: seu cérebro é menor (então, proporcionalmente, a radiação do celular é maior, em relação ao cérebro adulto) e possui maior quantidade de um líquido salino, que leva a uma mais elevada concentração de energia eletromagnética. Além disso, a taxa de reprodução celular das crianças e dos adolescentes é bem mais acelerada do que a dos adultos. Isso contribui para que estejam mais vulneráveis aos efeitos da radiofrequência, já que muitos deles ocorrem justamente no momento da multiplicação das células. "Todas essas características somadas resultam em maior risco", explica Salles.
8. Escolha um aparelho com a menor taxa SAR possível
Embora não seja nenhuma garantia de segurança do aparelho, a taxa SAR (Taxa de Absorção Específica, na sigla em inglês) é uma das poucas informações fornecidas pelos manuais de alguns celulares. Refere-se à "quantidade de potência absorvida por unidade de massa" do organismo humano. No Brasil, assim como nos países europeus, o limite é de 2 W/kg (watts por quilograma). Quanto menor a taxa, melhor: mais baixo o aquecimento que o aparelho provocará ao ser usado.
A organização EWG, dos EUA, chegou a fazer uma lista com a taxa SAR de mil modelos de telefone celular. Porém, voltou atrás ao concluir que há muitas outras informações necessárias para se conhecer os riscos que cada aparelho representa. "Entre outros fatores, eles dependerão da frequência emitida pela antena e da distância que o usuário se encontra dela", explica Silva, da Fiocruz.
CONTEXTO
Mas, afinal, é preciso se preocupar com o uso do celular? "Todas as pesquisas que cobrem períodos de oito a dez anos fazem relação de causa e efeito entre o uso do celular e o desenvolvimento de tumores no cérebro", afirma o professor Álvaro Salles. "O glioma [um tipo de tumor cerebral] é o mais grave de todos, e geralmente é detectado em estágios avançados."
Há três anos, em maio de 2011, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reclassificou o uso do celular, de "não cancerígeno" para "possivelmente cancerígeno". A mudança baseou-se na conclusão de um grupo de 31 cientistas, de 14 países, que avaliou centenas de pesquisas. Um dos estudos analisados demonstrou um aumento de 40% no risco de desenvolvimento de gliomas, para usuários "pesados" de telefone móvel – 30 minutos por dia durante um período de dez anos.
Para alguns especialistas, a possibilidade já é motivo suficiente para a adoção do Princípio da Precaução – diante do qual a incerteza científica dá espaço à prevenção de riscos potencialmente graves ou irreversíveis.
• Poluição eletromagnética – saúde pública, meio ambiente, consumidor e cidadania: impactos das radiações das antenas e dos aparelhos celulares, da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo, http://goo.gl/OQ9vOb
• Guia de Uso mais Seguro do Celular, do Environmental Working Group (EWG), http://goo.gl/FHW0y (em inglês)