Por dentro do JEC
O famoso "juizado de pequenas causas" mudou de nome, mas seu papel continua o mesmo: resolver casos simples com mais rapidez e sem custo. Entenda como ele funciona
Embora o Juizado de Pequenas Causas tenha mudado de nome há bastante tempo para Juizado Especial Cível (JEC), muita gente ainda usa a nomenclatura antiga. Mas isso é o de menos: o que importa é o seu papel na defesa dos direitos dos cidadãos, que continua o mesmo. Instituído pela Lei Federal nº 9.099/1995, o JEC visa a resolver as causas menos complicadas com mais rapidez que a Justiça comum e sem custos, na maioria dos casos. "Os JECs são instrumentos importantes para a resolução de conflitos de consumo, pois, diante da resistência do fornecedor em respeitar os direitos do consumidor, é imprescindível um posicionamento do Poder Judiciário", afirma Mariana Alves Tornero, advogada do Idec.
Apesar de a celeridade estar entre os princípios do JEC, é difícil estimar o tempo que um processo demora para ser finalizado. "Cada tribunal do país possui suas peculiaridades, com diferente número de juízes, servidores e estrutura cartorária, por exemplo. No Distrito Federal a tramitação é rápida. Estimo que o tempo médio seja de seis a dez meses", explica a juíza Sandra Vasques Tonussi, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). Contudo, de acordo com a advogada do Idec, nem sempre o processo é tão rápido. "Em São Paulo, por exemplo, pode demorar cerca de dois anos", opina Tornero.
QUANDO IR AO JEC
Além de problemas de consumo, outros casos também podem ser levados ao tribunal. Os exemplos mais comuns são cobrança de dívida entre pessoas físicas, acidentes de trânsito e conflitos entre vizinhos. Dentre as situações que não são resolvidas pelo JEC estão acidentes de trabalho; casos de família, como divórcio, guarda de filhos etc.; herança, inventário, falência e concordata; assim como casos que dependem de perícia. Também não podem ser feitas reclamações contra o Município, o Estado e a União, pois existem juizados específicos para julgar essas causas (veja mais no quadro Outros juizados).
Podem entrar com ação no órgão pessoas maiores de 18 anos, microempresas, empresas de pequeno porte e organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip). O JEC aceita causas que envolvam até 40 salários mínimos (R$ 28.960, considerando o valor do salário mínimo nacional vigente em 2014). Se for de até 20 salários mínimos (R$ 14.480), não é necessário ter um advogado para ingressar com o processo.
Contudo, a assistência de advogado é obrigatória na fase de recurso (ou seja, se uma das partes recorrer da sentença), independentemente do valor da ação. Se um dos envolvidos no processo tiver advogado, o outro pode obter assistência judiciária por meio de um órgão instituído junto ao Juizado, como o núcleo de prática jurídica de alguma faculdade de Direito, por exemplo. "A assistência jurídica é facultativa para ações cíveis de até 20 salários mínimos, mas o juiz deve alertar as partes sobre a conveniência de patrocínio, não apenas quando a complexidade é relevante, mas quando perceber que a hipossuficiência do consumidor pode ser agravada pela ausência de advogado", afirma Tonussi, do TJDFT.
Quais casos podem ser levados ao JEC?
Conflitos de consumo, cobrança de dívidas, acidentes de trânsito, despejo de imóvel alugado, entre outros. A causa deve ter até 40 salários mínimos.
Posso ingressar com a ação sem advogado?
Sim, desde que a causa não ultrapasse 20 salários mínimos. No entanto, caso você ou o réu recorram da decisão, a assistência do profissional é obrigatória, independentemente do valor da ação.
Como faço para entrar com a ação?
Compareça pessoalmente ao fórum, munido de documentos pessoais (RG e CPF) e comprovante de residência, e das informações sobre o réu (CPF ou CNPJ e endereço). Você pode levar o pedido já redigido ou contar o caso, oralmente, a um funcionário. Se o JEC for informatizado, a petição também pode ser feita pela internet, desde que você ou seu advogado tenham assinatura eletrônica.
A apresentação de documentos que comprovem a reclamação (como contratos, recibos, e-mails e fotografias) não é obrigatória, mas é recomendável.
O JEC é gratuito?
Sim, em grande parte. O autor da ação só arca com as custas do processo se faltar à audiência de conciliação ou se entrar com recurso para tentar modificar a sentença.
Quanto tempo demora para o processo ser concluído?
A duração varia muito, a depender do número de funcionários do juizado, por exemplo, e também do caso em si (se haverá acordo na audiência de conciliação, se será interposto recurso etc.).
Em caso de recurso, para onde o processo é direcionado?
Para a Turma Recursal dos Juizados Especiais, onde é julgado por três juízes. Depois disso, ainda é possível recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou ao Supremo Tribunal Federal (STF), dependendo do caso.
COMO ENTRAR COM A AÇÃO
O pedido pode ser feito no fórum mais próximo. É possível levar a solicitação por escrito já pronta (os associados do Idec têm acesso a modelos de petição inicial, que podem ser adaptados conforme o caso) ou fazê-la oralmente (o autor relata a situação a um funcionário, que o ajuda a preencher o formulário). Nesse caso, o atendimento demora cerca de 40 minutos. Levar a petição pronta, portanto, é mais rápido.
O autor da ação deve apresentar seu documento de identidade, CPF ou CNPJ e comprovante de residência, assim como o nome completo, o endereço e o CPF ou CNPJ do réu. Documentos que comprovem a alegação, como notas fiscais, contratos, recibos, fotografias entre outros, também podem ser apresentados.
Nem todos os JECs são informatizados ainda, mas, nos que são, é possível ingressar com a ação pela internet, caso o autor tenha uma assinatura eletrônica. Na prática, essa alternativa é viável quando se conta com um advogado. Se não, o jeito é ir pessoalmente ao fórum e lá, se ele for informatizado, a petição será digitalizada e o processo pode ser acompanhado virtualmente.
Caso a ação seja contra a União ou contra autarquias, fundações e empresas públicas federais, ela deve ser proposta em um Juizado Especial Federal (JEF), que julga causas de até 60 salários mínimos. São exemplos de autarquias federais o Banco Central e o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) – no JEF de São Paulo, este órgão é o líder de demandas; e de empresas públicas, a Caixa Econômica Federal. Para ingressar com uma ação no JEF, o pedido pode ser feito pelo site da Justiça Federal (no caso dos Estados onde o sistema já está informatizado) ou pessoalmente no prédio desse órgão. A assistência de um advogado só é necessária em caso de recurso.
Já se o processo for contra órgãos do governo municipal, estadual ou do Distrito Federal, a ação deve ser proposta no Juizado Especial da Fazenda Pública (Jefaz), que também acolhe causas de até 60 salários mínimos. A cobrança de Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) ou uma ação relacionada a transporte público são exemplos de questões que podem ser levadas ao Jefaz.
FASES DO PROCESSO
No próprio dia em que entra com a ação, o autor é informado sobre a data da audiência de conciliação, na qual um servidor público (chamado de conciliador) auxiliará as partes do processo a chegar a um acordo. Se este for alcançado, autor e réu assinam um documento, que, após homologado pelo juiz, vale como sentença. Importante ressaltar que, se o autor da ação faltar à audiência de conciliação, o processo é encerrado e este tem de pagar as custas do processo. Já se o réu não comparecer, os fatos alegados no pedido de ação podem ser considerados verdadeiros (é a chamada revelia).
Caso não haja acordo, o processo segue para o juiz. Antes de decidir, ele pode realizar audiência de instrução e julgamento, na qual serão ouvidas, além das partes, as testemunhas.
Se o autor ou o réu discordarem da sentença, podem entrar com recurso em até 10 dias; este será julgado por três juízes da Turma Recursal dos Juizados Especiais. Nesse caso, a assistência de um advogado é obrigatória e quem entrou com o recurso precisa arcar com as custas processuais.
Terminada a possibilidade de recurso no JEC, é possível ainda recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), ou, caso envolva violação à Constituição, ao Supremo Tribunal Federal (STF).