Doce demais
Taxas para barrar a obesidade
Os alimentos não saudáveis, entre os quais se destacam aqueles com grande quantidade de açúcar adicionado, estão diretamente associados à escalada da obesidade e do sobrepeso, no Brasil e no mundo. Segundo a OMS, 2,8 milhões de pessoas morrem a cada ano por causa do excesso de peso, que é um fator de risco para doenças cardíacas, derrames e diabetes. De acordo com dados da POF 2008-09, do IBGE, metade dos adultos brasileiros está acima do peso, assim como mais de 30% das crianças com idade entre 5 e 9 anos.
Para tentar diminuir o consumo de açúcar, alguns governos europeus têm criado taxas para produtos adoçados, como refrigerantes e outras bebidas. Na França, um imposto do gênero implicou em 5% de aumento no preço final desses produtos em 2011. Na Hungria e na Irlanda, as taxas estão sendo direcionadas para alimentos não saudáveis em geral; e no Reino Unido, estuda-se aumentar o preço dos refrigerantes em aproximadamente 20%.
Na América Latina algumas iniciativas parecidas também vêm ocorrendo. Em janeiro, entrou em vigor no México um tributo de oito centavos de dólar sobre o litro do refrigerante. O país é o maior consumidor de bebidas açucaradas do mundo, e nada menos do que 70% dos adultos locais têm sobrepeso ou estão obesos.
SAIBA MAIS
• Matéria Fruta de menos (edição nº 184): http://goo.gl/ymwVxY
• Artigo Açúcar nos alimentos processados: como e por que reduzir http://goo.gl/oHG8zQ
• Agite-se antes de beber: www.idec.org.br/agitese
Brasileiros consomem cerca de três vezes mais açúcar do que o recomendado; falta de informação sobre o ingrediente no rótulo de alimentos contribui para o excesso
No supermercado, as prateleiras dos achocolatados, dos "sucos" de caixinha e dos biscoitos recheados reúnem muitos produtos em que o açúcar figura entre os ingredientes em maior quantidade. Este carboidrato simples está presente até nos mais insuspeitos alimentos industrializados, como pão, macarrão e molho de tomate. Não por coincidência, o Brasil é o país com o segundo maior consumo per capita de açúcar, que aporta à nossa dieta 600 quilocalorias (Kcal) diárias. Perdemos apenas para os Estados Unidos, onde cada habitante ingere 658 Kcal por dia provenientes dessa fonte.
De acordo com a Pesquisa de Orçamentos Familiares, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (POF/IBGE, 2008/09), o chamado açúcar de adição – ou seja, que é adicionado aos alimentos – é a fonte de 15,7% das calorias ingeridas pelos brasileiros. O que vem mudando no decorrer dos anos é a diminuição no uso do açúcar de mesa, e o aumento da parcela de açúcar proveniente dos industrializados.
Enquanto o produto usado para adoçar o café ou a receita de bolo corresponde atualmente a 71,7% do açúcar ingerido, doces, balas e chocolates vêm em segundo lugar, com 11,6%, seguidos de perto pelo refrigerante, com 10,9%. Na POF realizada seis anos antes, os mesmos itens correspondiam a 76%, 9% e 9,5%, respectivamente.
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), o consumo de açúcar de adição não deveria passar de 10% das calorias ingeridas em um dia. Portanto, dentro de uma dieta de 2.000 Kcal diárias, o máximo seriam 200 kcal ou 50 gramas de açúcar refinado, correspondente a 12 colheres de chá. Consumimos três vezes mais do que isso.
A recomendação das 2.000 kcal, além disso, ainda precisa ser revista. "Para a maioria da população, incluindo crianças, mulheres e idosos, esse valor é muito alto", explica a nutricionista do Idec, Ana Paula Bortoletto. "Devemos considerar o gênero, a idade e o nível de atividade física da pessoa para estabelecer um índice mais adequado."
Além disso, o limite estabelecido pela OMS não é consensual. Há entidades que apregoam que o consumo de açúcar deveria ser mais baixo, e a própria OMS estuda reduzir o percentual para 5%. No Reino Unido, a organização Action on Sugar, que reúne especialistas para advogar em torno do tema, também defende que o máximo seja 5% das calorias diárias.
• Prefira, sempre que possível, alimentos não industrializados e preparados em casa, como cereais, leguminosas, legumes e frutas.
• Quando comprar produtos industrializados, não deixe de observar o rótulo. Se o açúcar aparece entre os primeiros itens da lista de ingredientes, isso quer dizer que está em maior quantidade no produto.
• Tente não adicionar açúcar ao café e, principalmente, aos sucos naturais. Caso tenha dificuldade, experimente uma redução gradual.
• Utilize açúcar mascavo, melado ou mel para adoçar alimentos e bebidas; eles são melhores do que o açúcar branco (refinado ou cristal), pois possuem mais nutrientes, além de serem um pouco menos calóricos.
SEM INFORMAÇÃO
Mas eis que surge a grande dúvida: como é que as pessoas podem saber quanto estão consumindo de açúcar? Os rótulos no Brasil simplesmente não oferecem essa informação. Até existem produtos que voluntariamente estampam quantos gramas de açúcar têm uma porção, mas são exceções. Em algumas de suas embalagens, a Coca-Cola informa que um copo de 200 ml da bebida contém 21 g de açúcar. A Pepsi revela que tem 22 g, e o Guaraná Antártica, 20 g. Isto é, todos têm em torno de 80 kcal só de açúcar, já que 1 g do ingrediente corresponde a 4 kcal.
Um segundo problema é que o país tampouco estabeleceu um valor diário que sirva como referência para o consumo de açúcares. Dessa maneira, mesmo nos rótulos que dizem quanto de açúcar há no produto, não se sabe ao certo o que o dado representa. "As informações no rótulo ainda não estão claras para o público", afirma a professora Rosângela Alves Pereira, do Instituto de Nutrição Josué de Castro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Dessa forma, a principal medida para se precaver do excesso é consumir o mínimo possível de alimentos processados. Em segundo lugar, ao adquirir produtos industrializados, checar a lista de ingredientes no rótulo. Quanto mais no início da relação o açúcar estiver, maior a quantidade – obrigatoriamente, os ingredientes são listados em ordem decrescente. Outra consideração fundamental é que há ingredientes com nomes diferentes que também são açúcar, por exemplo: açúcar invertido, frutose, xarope de glicose etc. Por isso, é importante observar se algum desses nomes também aparece na lista.
PROCESSO LENTO
Atualmente, o governo brasileiro está discutindo mudanças gerais na rotulagem de alimentos junto a outros países do Mercosul. Segundo o acordo comercial, qualquer norma de rotulagem deve ser harmonizada entre os países do bloco. Assim, a informação nutricional (o que inclui uma possível menção ao açúcar) só deve ser discutida quando terminar essa negociação, o que pode levar anos. "Por isso, o Idec sugeriu à Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] que ao menos comece a discutir o tema, para já ter uma posição estabelecida quando a conversa chegar ao Mercosul", diz a nutricionista do Instituto.
Em outra frente, o Ministério da Saúde quer propor aos fabricantes a redução de açúcar em seus produtos, a fim de diminuir os índices de doenças crônicas não transmissíveis, como a diabetes tipo 2. O próximo passo será a assinatura de um acordo entre as partes, parecido ao modelo adotado para a redução do sódio, ao qual as indústrias aderiram voluntariamente. "Mas é preciso que o ministério estabeleça reduções mais significativas para o açúcar, porque as metas para o sódio são insuficientes", afirma Bortoletto.
Além da redução do uso do ingrediente, o Idec defende a taxação dos alimentos com alto teor de açúcar e a regulamentação de sua publicidade. "Já temos evidências científicas suficientes para dizer que não regular é prejudicial à saúde", conclui a nutricionista do Instituto.