Viciados em compras
A compulsão por adquirir bens materiais tem nome: oniomania. Saiba como identificar esse transtorno e onde procurar ajuda
O paulista Caio Henrique Caprioli, 25 anos, define-se em seu perfil do microblog Twitter como: "comprador compulsivo e amigo íntimo do SPC [Serviço de Proteção ao Crédito] e das operadoras de cartão de crédito". Certa vez, Caprioli se apaixonou por uma blusa de R$ 400. Sem dinheiro para adquirir o mais novo objeto de desejo, ele não teve dúvidas: recorreu a uma financeira e fez um empréstimo. Foi assim que adquiriu a sua primeira dívida, que ganhou vida própria e chegou a R$ 1 mil. Esse foi só o começo. Caprioli chegou a gastar R$ 12 mil no cartão de crédito.
Essa necessidade incontrolável de comprar, acompanhada de repercussões financeiras e emocionais negativas – como dívidas e conflitos familiares – tem um nome pouco conhecido: oniomania (no linguajar popular, compulsão por compras).
A oniomania começa, geralmente, com pequenos caprichos que podem virar dívidas impagáveis. O endividamento, aliás, é um dos principais "sintomas" da doença. Segundo o psiquiatra Aderbal Vieira, responsável pelo setor de tratamento do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o volume de compras, isoladamente, não é um critério de classificação na oniomania. "Se o Eike Batista adquire um iate por mês, isso não compromete o orçamento dele. E não temos como saber como seria o seu comportamento se ele não fosse uma das pessoas mais ricas do Brasil", exemplifica. "É quando se gasta mais do que se ganha, de forma incontrolável, que é preciso procurar ajuda", alerta o médico.
FUNDO EMOCIONAL
A representante de vendas Suzana Brizolla, 44 anos, perdeu a conta de quantas vezes estourou o limite do cartão de crédito ou foi ao banco pedir crédito pessoal. "Uma vez, comprei uma mesa de oito lugares que não cabia no meu apartamento", lembra. Para saldar as suas pendências financeiras, ela vendeu o carro, cujas parcelas raramente eram pagas em dia. "Só percebi que precisava de ajuda quando o banco cortou os meus créditos pessoais", ela conta. Suzana pediu ao filho para ajudá-la com o orçamento doméstico. Hoje, depois de ter sido medicada por um psiqiatra e de ter quebrado todos os cartões, ela está pagando as dívidas aos poucos e comprando apenas à vista.
A oniomania aparece, muitas vezes, como forma de aliviar grandes frustrações, depressão e estresse. É como se o prazer de comprar compensasse, pelo menos por algumas horas, todos os sentimentos ruins. Normalmente, os sintomas dos compradores compulsivos evoluem. A família costuma ser a primeira a demonstrar preocupação com os gastos desmedidos e desnecessários que geram dívidas em bancos e cartões de crédito. Depois, as compras desenfreadas passam a causar arrependimento, seguido de incômodo com as dívidas e sentimento de culpa.
Quando a vontade de possuir bens materiais torna-se incontrolável, é preciso procurar ajuda profissional qualificada. E, quanto antes isso for feito, melhor. Para Vieira, é importante que o paciente faça psicoterapia e, se necessário, tome algum medicamento que controle tais impulsos (claro, prescrito por um psiquiatra). A psicoterapia pode ajudar a entender a verdadeira causa do problema, mapear atitudes cotidianas e realizar mudanças fundamentais rumo à autodisciplina e ao controle das dívidas.
• Faz compras por impulso quando está triste, estressado, preocupado ou com raiva.
• Ao comprar, não pensa nas consequências.
• Compra itens de que não precisa ou iguais aos que já tem.
• Não utiliza boa parte dos itens adquiridos (muitos são guardados embalados, com a etiqueta ou dentro da sacola).
• Geralmente faz compras sozinho e esconde as novas aquisições dos familares, para evitar críticas.
• Mente sobre o preço dos artigos adquiridos.
• Depois da excitação no momento da compra, sente-se culpado e fracassado por não ter resistido ao impulso.
• Mesmo endividado, não consegue parar de comprar.
• Não consegue poupar para a realização de uma viagem, por exemplo, ou para a aquisição de um patrimônio (carro ou casa).
ONDE PROCURAR AJUDA
Os principais centros de apoio aos compradores compulsivos estão localizados em São Paulo. Os paulistas contam com o Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes (Proad – www.unifesp.br/dpsiq/novo/d/proad), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que foi criado em 1987 e é um dos centros mais conceituados de reabilitação da doença. Na Universidade de São Paulo (USP), o assunto é tratado no Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso (Pro-Amiti – http://amiti.com.br), do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da universidade.
Presente em mais estados está o grupo Devedores Anônimos, que, além de São Paulo, também tem unidades no Rio de Janeiro, no Paraná, em Minas Gerais e no Ceará. O grupo atua como uma irmandande de autoajuda – como eles mesmos se definem – e, nos moldes dos Alcoólicos Anônimos, busca disciplinar quem sofre de oniomania por meio de 12 passos. Os encontros são semanais e duram, em média, duas horas.
Algumas clínicas particulares para tratamento de dependentes também incluíram a ajuda para os compradores compulsivos em seus serviços.