Viaje com segurança
Para que a proteção de um seguro ou assistência viagem seja efetiva, é fundamental saber quais são as coberturas oferecidas e as condições para poder utilizá-las
Um acidente com dois balões na Capadócia, Turquia, envolvendo turistas brasileiros em maio deste ano levantou a discussão sobre a contratação de seguros viagem que cubram despesas com doenças ou acidentes, principalmente no exterior, cujos gastos nesses casos podem atingir cifras astronômicas.
Na ocasião, uma das brasileiras que sobreviveram ao acidente teve problemas para conseguir voltar ao Brasil, pois, devido à sua condição de saúde, não podia viajar num voo comum, e o seguro não cobria o gasto de um avião com Unidade de Terapia Intensiva (UTI). A apólice contratada pela brasileira previa cobertura de 30 mil euros (cerca de R$ 90 mil), valor mínimo exigido por vários países, inclusive os europeus. Mas o custo do avião com UTI era de 100 mil euros!
Mariléa Pereira, dona de uma agência de turismo em Araraquara (SP), notou que, após o acidente na Capadócia, seus clientes passaram a contratar seguros que cobrem mais do que o valor mínimo exigido para alguns destinos. "Infelizmente, foi preciso acontecer uma tragédia para os turistas começarem a se preocupar mais com o seguro viagem", diz.
A diretora comercial paulista e viajante contumaz Vivian da Cruz Silva, 29 anos, que o diga. Ela não fez seguro quando visitou San Andrés, na Colômbia, em 2012, e foi ferida durante um assalto. Apesar do receio, Vivian teve de buscar atendimento em um hospital público local, pois não pôde pagar uma consulta particular, já que seu dinheiro e cartões estavam na mochila roubada. "O meu seguro anual tinha expirado e não fiz um novo porque não era obrigatório para entrar no país. Me arrependi profundamente", lamenta.
Para quem vive com as malas prontas como Vivian, o seguro anual citado por ela pode ser um bom investimento. Nessa modalidade, o consumidor paga um valor fixo por determinada cobertura e pode usar o seguro várias vezes durante 12 meses, conforme estipulado em contrato.
Outro ponto importante para quem está interessado no serviço é saber que há "seguro" e "assistência viagem", que, embora muitas vezes sejam vendidos como a mesma coisa, têm as suas diferenças. A principal delas é que, no seguro, é possível procurar qualquer hospital (após entrar em contato com a seguradora e comunicar o problema), pagar pelo atendimento e, depois, pedir o reembolso. Já a assistência viagem trabalha com uma rede credenciada específica. Além disso, a assistência não é regulada pela Superintendência Nacional de Seguros Privados (Susep), órgão responsável por fiscalizar o setor de seguros. "Em geral, é só no contrato que se identifica qual é o tipo de serviço oferecido", informa o advogado do Idec Flavio Siqueira Junior.
1 - Faça a cotação de seguros e assistências oferecidos por diversas empresas.
2 - Verifique se a seguradora está autorizada pela Susep a atuar nesse mercado.
3 - Prefira os seguros oferecidos por empresas nacionais aos de companhias estrangeiras na internet, pois estas não estão sujeitas à legislação brasileira. Além disso, as informações da apólice não estarão em português.
4 - Informe ao corretor ou agente de viagem a sua condição de saúde e se pretende praticar esportes radicais. Assim, ele poderá lhe oferecer o seguro adequado.
5 - Se necessário, insista para que a empresa de cartão de crédito lhe envie a apólice.
6 - Leia a apólice, prestando atenção às coberturas oferecidas e aos itens excluídos. Se achar que a cobertura é básica demais, procure outras opções mais abrangentes.
7 - Certifique-se de que a seguradora oferece atendimento 24 horas, gratuito e em português.
8 - Guarde todos os comprovantes das despesas médicas. Eles serão necessários para pedir o reembolso à seguradora.
9 - Se optar por uma assistência viagem, verifique se há hospitais credenciados próximos ao local onde você estará hospedado.
10 - Durante a viagem, leve com você o voucher ou cartão do seguro ou assistência com o telefone da central de atendimento. Não despache esses documentos na mala.
ATENÇÃO ÀS COBERTURAS
Contratar um seguro viagem é um passo importante, mas não adianta receber o contrato, guardá-lo e só lembrar que ele existe quando precisar utilizá-lo. "Ler atentamente a apólice, que discrimina o que o seguro cobre e em que condições ele pode ser utilizado, é imprescindível", recomenda Siqueira.
As coberturas variam muito. Há seguros que cobrem do pagamento de despesas médico-hospitalares e traslado de corpo em caso de morte até diária em hotel quando há cancelamento de voo. No entanto, também há diversos procedimentos que costumam ficar de fora, como o tratamento de doenças epidêmicas e de doenças preexistentes – ou seja, das quais o consumidor já era portador antes de viajar, por exemplo. Veja no box "Dúvidas frequentes", nas páginas 26 e 27, o que costuma e o que não costuma ser coberto pelos seguros viagem.
A engenheira Gislene Pelissari Garcia, 43 anos, de Santo André (SP), levou um susto quando a seguradora negou o pagamento de uma cirurgia de emergência que ela precisou fazer durante uma viagem a Genebra, na Suíça, em 2010, em decorrência de uma infecção urinária e de cálculos no rim e no ureter. Felizmente, o impasse foi resolvido sem grandes transtornos. "Dois meses depois da cirurgia, meu namorado, que mora lá, recebeu a fatura do hospital no valor de 10 mil euros! A seguradora, a princípio, alegou que o meu caso era de doença preexistente [o que excluiria a cobertura]", conta Gislene. "Mas, como os médicos trataram apenas a infecção e não o cálculo renal, essa teoria caiu por terra. Enviei um e-mail para a empresa e, alguns dias depois, o pagamento foi feito", completa.
A leitura da apólice também é útil para checar se há previsões abusivas – infelizmente, muito comuns nos contratos. "São exemplos de cláusulas abusivas: permitir que a seguradora modifique a cobertura durante a vigência do contrato; exigir um prazo muito curto para comunicação do sinistro; e também não dar destaque à informação do que o seguro não cobre", lista o advogado do Idec. "Essas cláusulas são nulas, de acordo com o artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), e podem ser contestadas pelo segurado", orienta Siqueira.UNI DUNI TÊ, O ESCOLHIDO FOI VOCÊ
Essa brincadeira infantil definitivamente não se aplica à hora de contratar um seguro ou uma assistência viagem. Afinal, é a sua saúde que está em jogo. "Pesquisar a idoneidade da empresa é muito importante para a segurança do viajante, que pode consultar se há registros contra ela no Procon e buscar informações no site da Susep, além de pedir recomendação a amigos", sugere Siqueira. "A empresa deve ter representação no local de destino ou convênio com empresas locais para a prestação dos serviços propostos", complementa José Varanda, professor da Escola Nacional de Seguros (Funenseg).
Existem no mercado diversas modalidades de seguro e de assistência viagem. É importante avaliar qual delas é mais compatível com o seu perfil e com o tipo de viagem que pretende fazer. O advogado do Idec alerta para a importância de o consumidor informar o máximo de detalhes possíveis à agência de turismo ou ao corretor de seguros sobre sua condição de saúde e sobre o tipo de viagem que vai fazer para que lhe seja oferecido o seguro ou a assistência mais adequado.
Alternativas ao seguro
Quem tem seguro de vida ou plano de saúde pode checar se o contrato oferece cobertura na região que pretende visitar. Caso não haja, também é possível questionar a operadora ou seguradora sobre a ampliação da abrangência territorial do plano. Depois, é só comparar o preço com os dos seguros e das assistências viagem para saber o que vale mais a pena. Contudo, é bom lembrar que o seguro, em geral, cobre mais itens do que a assistência médico-hospitalar dos planos de saúde (traslado de corpo, por exemplo).
Outra alternativa é a assistência viagem oferecida gratuitamente por algumas administradoras de cartão de crédito aos clientes que o utilizam para pagar a passagem de avião. O benefício é dado apenas em algumas categorias de cartão (normalmente, os de abrangência internacional e com anuidade mais elevada). Mas muita gente nem sabe dessa possibilidade. Essa foi a resposta de 79% dos internautas que votaram na enquete feita pelo Idec em seu portal de 2 a 16 de outubro.
O problema desse benefício é que, muitas vezes, o consumidor não recebe informação adequada sobre o serviço. A empresária paulista Vanessa Chieregato Pereira, 40 anos, por exemplo, viajou para a Califórnia (Estados Unidos) em 2010 com sua mãe e optou pela assistência viagem do seu cartão, mas não recebeu a apólice. "As informações sobre a cobertura e sobre como utilizar a assistência foram passadas por telefone", lembra Vanessa. "Esse tipo de contratação pode ser problemático, porque o viajante não tem as informações precisas do serviço", critica Varanda, da Funenseg, que recomenda que o consumidor insista para receber a apólice e cheque todas as condições do seguro.
No caso da assistência oferecida pelo cartão de Vanessa, por exemplo, a apólice (que ela não recebeu, mas foi fornecida a esta reportagem pelo Serviço de Atendimento ao Consumidor da administradora) informa que não há cobertura para doenças preexistentes, complicações relacionadas à gestação, parto ou aborto (o que o torna desinteressante para gestantes, por exemplo), nem para acidentes resultantes da prática de esportes.Dúvidas frequentes
Quais são as coberturas mínimas de um seguro viagem?
De acordo com a Circular nº 302/2005 da Susep, o seguro viagem deve ter, no mínimo, coberturas básicas para morte acidental e invalidez permanente parcial ou total por acidente. Mas outras coberturas costumam ser adicionadas, como assistência médica, hospitalar e odontológica; despesas farmacêuticas; repatriação médica; passagem e hospedagem para acompanhante em caso de hospitalização prolongada; indenização em caso de extravio, roubo, furto ou danificação de bagagem; atraso de voo; assistência jurídica, entre outras.
Atenção: em alguns casos, o seguro viagem cobre o que já é protegido pelo CDC. Por exemplo, a indenização em caso de extravio ou de danos à bagagem, que é reponsabilidade da companhia aérea, de acordo com os artigos 6º, VI, e 14 do Código. A vantagem do seguro, nesse caso, é receber um valor para compras imediatamente (muito antes do prazo de reembolso pela empresa aérea).
Quais itens NÃO costumam ser cobertos?
Tratamento de doenças preexistentes; próteses; despesas hospitalares não incluídas no custo da diária; tratamento de doenças epidêmicas, pandêmicas ou endêmicas; sinistros decorrentes de fenômenos da natureza, como inundações, terremotos, furacões etc.; danos causados por imprudência, negligência, imperícia e irresponsabilidade ao dirigir um veículo; continuidade de tratamentos médicos e odontológicos após o término da viagem; e tratamentos psiquiátricos.
Qualquer pessoa pode contratar?
Em tese, sim. Mas algumas seguradoras limitam a contratação a pessoas com até 65 ou 70 anos de idade. Além disso, de acordo com a Circular nº 302/2005 da Susep, a cobertura para crianças com menos de 14 anos é limitada a risco de morte acidental e despesas com funeral.
Quanto custa, em média, o serviço?
O preço varia de acordo com o tipo de viagem (nacional ou internacional; de lazer ou trabalho etc.), sua duração, o meio de transporte, a idade do segurado e as coberturas incluídas. Um seguro para uma pessoa com menos de 70 anos que vá passar um mês nos Estados Unidos com cobertura de R$ 100 mil custa cerca de R$ 280. Como há inúmeras empresas que oferecem seguros e assistências, o ideal é cotar preços e condições em várias delas. Desconfie de ofertas com valor muito abaixo dos praticados.
Vale a pena fazer seguro para destinos nacionais?
Pode valer. Embora muitas pessoas tenham plano de saúde com cobertura nacional, em geral, os seguros e as assistências cobrem mais do que despesas médico-hospitalares.
Onde contratar um seguro ou assistência?
É possível contratar em agências de viagem, com corretores de seguros e até pela internet. De acordo com os especialistas consultados para esta reportagem, a melhor forma é por meio de um corretor de seguros, que pode explicar com mais detalhes as condições do serviço, além de orientar na escolha do plano mais adequado.
Atenção: as agências de turismo não podem exigir a aquisição do seguro ou de assistência viagem na compra de um pacote turístico ou de passagens. Essa prática, chamada de venda casada, é abusiva, de acordo com o artigo 39, I, do CDC.
Onde reclamar em caso de problemas com o serviço?
Primeiro, o consumidor deve procurar a agência ou o corretor que lhe vendeu o seguro. Caso não seja devidamente atendido, pode registrar reclamação no Procon e também na Susep (mas o órgão não fiscaliza as assistências viagem, apenas os seguros). Também é possível recorrer ao Juizado Especial Cível (JEC) para pedir indenização por danos materiais e morais decorrentes da má prestação de serviço.